14 Mai 2025
Habemus Papam e muitos leigos se perguntam se podem encontrar no Papa Leão XIV a mesma sintonia de ideais que tinham com Francisco. Entre eles está a escritora Lidia Ravera. "Digamos que minha relação com Francisco estava ligada ao fato de ele ser um homem bastante excepcional. Não aconteceu com outros pontífices. Agora espero que esse Papa meio estadunidense faça algo sobre o genocídio na Palestina, mas algo forte, algo importante."
A reportagem é de Maria Corbi, publicada por La Stampa, 12-05-2025.
Todos estão brigando por ele. Leão XIV está sendo puxado pela manga pela direita e pela esquerda. Uma sociedade em abstinência de espiritualidade ou em abstinência de um líder político?
Dizer que a política está ausente é uma fórmula polida. Eu falaria de evaporação da esquerda, daí a necessidade de se apoiar em um homem que, objetivamente, apesar de ser o líder do mundo católico, com ideias precisas sobre aborto e controle de natalidade, com obediências a respeitar, se comportou em relação à tragédia do genocídio em Gaza e às guerras que nos cercam como um homem de esquerda.
O Papa, líder subliminar da esquerda.
Tenho dito muitas vezes, mesmo em ocasiões públicas, que tenho dois líderes políticos: o Papa e uma jovem, Francisco e Greta Thunberg. Ambos com uma sensibilidade para o ambientalismo e com um pacifismo sem reservas, com o qual me identifico completamente. Eu me sentia politicamente próxima de Bergoglio, na mesma proporção em que me sentia distante da esquerda que aprovou o rearmamento da Europa, e que não me indica nenhum caminho. A falta de um líder, de uma grande figura, faz com que nos voltemos para um homem que lidera a Igreja e que sobre questões sociais e sobre a guerra tem visão e ideais.
Além da paz, trabalho. Leão XIV inspira-se em Leão XIII, que escreveu a Rerum Novarum, o Papa anticapitalista, que se interessou pelos trabalhadores.
Nós o conheceremos. É claro que hoje o tema da estagnação da sociedade é evidente. Como você nasce, morre. Nos anos 1970, o ódio de classe foi de alguma forma um motor. Hoje, o ódio foi substituído pela inveja social. E, portanto, os motores estão desligados e a sociedade não evolui. Acho isso terrível e vi muitos órfãos da esquerda se apaixonarem pelo Papa, algo impensável que nunca havia acontecido antes, nem mesmo com Wojtyla. Não havia o desejo de confiar em uma coerência piedosa, porque a coerência é importante e a piedade é importante. Se você sentir a dor dos outros e se sentir ofendido por isso, você escolhe um lado, e antes a esquerda sentia essa dor. Caso contrário, você vai para o outro lado, o da indiferença, da inveja, da mesquinharia, dos cálculos dos jogos políticos.
Por essa razão, também houve uma grande reaproximação de leigos, como você, com a Igreja.
À igreja de Bergoglio. Há necessidade de visão, a política deve olhar para longe, para uma sociedade diferente, porque está muito claro para mim que o capitalismo venceu e isso transformou as relações humanas. Como essa sociedade neoliberal nos transformou? E eu não ouvi essa pergunta da esquerda, não ouvi esse esforço de falar de um mundo diferente, tão diferente e tão mais justo que me fizesse querer lutar para afirmá-lo. Houve muitos pequenos focos de resistência, movimentos juvenis, mas não houve um partido capaz de levar adiante tais instâncias. A esquerda ficou sem um líder e sem uma visão, falta um "Berlinguer", e então nos voltamos para Bergoglio e, quem sabe, para Prevost.
Primeiras impressões?
Se ele tivesse escolhido Francisco II como nome, eu teria me tranquilizado. Ele tinha a possibilidade de ser o número 2 de um Papa que teve a coragem de se chamar Francisco, um nome que significa coisas específicas. E já sinto falta dessa estranha interlocução que eu tinha com Bergoglio.
Por que estranha?
De vez em quando eu fantasiava em pedir-lhe uma audiência para lhe explicar o que é aborto.
Até que ponto as pessoas ainda se deixam condicionar pela religião e pela Igreja no nosso mundo ocidental?
As pessoas não se deixam mais condicionar pela religião, caso contrário, se comportariam muito melhor. Sempre guardei uma frase da religião, que me basta para tudo, e é ‘não faça aos outros o que você não gostaria que fizessem a você’. Portanto, se a pertença religiosa tivesse sido mais forte, o mundo seria melhor.
Você não é crente.
Infelizmente, não sou crente, e lamento. Quando eu tinha uns dez anos, perguntei à minha mãe: ‘Como posso acreditar em Deus?’. E ela me respondeu: ‘Você é muito nova, essas são questões maiores do que você, falaremos sobre isso novamente quando crescer’. Nunca mais falamos sobre isso. Uma grande decepção. Então, me virei sozinha e decidi que Deus provavelmente não existia. Mas me preparei para ter regras. Em 1968, passávamos dias inteiros nos questionando sobre o que era certo, o que podia ser feito, como se podia consertar uma sociedade errada. Pessoalmente, ainda não mudei. Continuo lutando em busca de regras compartilháveis, de um mundo no qual seja claro o que é bem e o que é mau.
As rebeliões de 1968 como uma fé?
A busca do justo em um mundo desequilibrado era, no fim das contas, também a busca de uma religião. Era ideologia. Hoje em dia, só se fala mal dela, mas a ideologia não é apenas um instrumento de opressão, é também uma visão de mundo na qual se reconhecer. Um conjunto de regras às quais se adequar. É uma batalha consigo mesmo para ser pessoas melhores. Mas atenção, porque tanto a religião quanto as ideologias são coisas sérias, enquanto hoje soam como palavras vazias. As pessoas vão à Basílica de São Pedro para tirar uma selfie e uma foto do Papa debruçado na sacada. Tudo se resume a isso. Enquanto crer em algo ajuda a viver.
O título do seu último livro é "Volevo essere un uomo” [Queria ser homem]. Realmente queria?
Alguns acham que é uma provocação, mas é uma confissão, ser homem teria sido mais fácil.
Você poderia enviá-lo ao Papa para iniciar aquela interlocução perdida com Bergoglio.
Boa ideia, vou avisar a editora.