01 Abril 2025
Os mercados prendem a respiração às vésperas da entrada em vigor de incertos tarifas generalizadas, no que o presidente chamou de “Dia da Libertação”.
A reportagem é Antònia Crespí Ferrer, publicada por El Diário, 31-03-2025.
Às vésperas da entrada em vigor das tarifas prometidas por Donald Trump, nas ruas de Washington é possível ver painéis pagos pelo Canadá com a frase: “As tarifas são impostos sobre a classe trabalhadora americana”. Apesar do forte impacto que se prevê no bolso dos americanos — algo que o próprio Trump chegou a reconhecer como uma pequena “turbulência” —, o republicano anunciou com grande alarde a entrada em vigor dos tributos nesta quarta-feira, 2 de abril, como o “Dia da Libertação”. Caso cumpra a promessa de impor tarifas contra a longa lista de países mencionados, a atual guerra comercial entrará em um novo estágio sem precedentes e com consequências inimagináveis.
O presidente americano transformou os índices das bolsas mundiais em uma montanha-russa em queda com sua guerra comercial errática e caótica. As chamadas tarifas recíprocas de Trump, que devem entrar em vigor a partir da meia-noite de terça-feira, são o clímax do plano do presidente para, supostamente, alcançar outros objetivos políticos, como fomentar a reindustrialização do país e torná-lo um destino atraente para fabricantes estrangeiros. Inspirado nas políticas protecionistas do final do século XIX do ex-presidente William McKinley, Trump defende desde a campanha eleitoral que as tarifas são a solução para todos os problemas que, segundo ele, afetam uma nação à beira do colapso econômico.
Em fevereiro, Trump assinou um memorando ordenando que sua equipe propusesse uma resposta a todas as tarifas sobre produtos americanos, incluindo impostos que sejam “injustos, discriminatórios ou extraterritoriais” — onde se incluiria o IVA europeu. Naquele momento, não foi definida uma cifra exata, mas cogita-se a possibilidade de aplicar tarifas de até 30% sobre a Europa, caso o presidente inclua o IVA em seus cálculos. No fim de fevereiro, Trump afirmou que imporia tarifas de 25% à União Europeia “de maneira geral”, após o bloco demonstrar disposição para reduzir os tributos sobre carros americanos e fazer outras concessões.
No domingo, a bordo do Air Force One, Trump garantiu que “se começará com todos os países”, embora tenha afirmado que as tarifas seriam mais generosas do que aquelas impostas pelos parceiros comerciais aos Estados Unidos. As constantes mudanças de opinião do presidente adicionam ainda mais volatilidade a um ambiente já instável. Na semana passada, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, afirmou à Fox Business que os países mais afetados serão os 15% das nações que mais contribuem para o déficit comercial dos Estados Unidos e que impõem as tarifas mais altas.
“Existe o que chamaríamos de ‘15 Sujos’ [15 Dirty]”, disse Bessent em referência a esse grupo de países, afirmando que eles impõem tarifas e outras barreiras comerciais injustas sobre produtos americanos. “É apenas 15% dos países, mas representa uma grande parte do nosso volume comercial.”
A Casa Branca não divulgou a lista dos países que compõem os “15 Sujos”. No entanto, segundo The Wall Street Journal, as nações e blocos com os maiores déficits comerciais com os Estados Unidos são China, União Europeia, México, Vietnã, Taiwan, Japão, Coreia do Sul, Canadá, Índia, Tailândia, Suíça, Malásia, Indonésia, Camboja e África do Sul.
Na entrevista, Bessent também sugeriu a possibilidade de que as tarifas do “Dia da Libertação” acabem sendo menores do que o inicialmente proposto, uma afirmação que está alinhada com as declarações de Trump. Ainda assim, na quinta-feira passada, o presidente dos EUA fez um anúncio bombástico à imprensa com apenas três horas de antecedência, no qual determinou tarifas de 25% sobre “todos” os carros não fabricados nos Estados Unidos a partir de 2 de abril.
Se há um padrão recorrente no caos tarifário de Trump, é o de recuar, mudar de critério ou conceder tréguas e exceções. México e Canadá conhecem bem essa dinâmica com suas tarifas de 25%, que já foram adiadas duas vezes: a primeira, horas antes de entrarem em vigor, e a segunda, logo após serem implementadas. No caso das chamadas tarifas recíprocas, quando perguntado na sexta-feira se pretendia aplicar alguma isenção para medicamentos essenciais, Trump respondeu: “Bem, vamos anunciar isso em breve. Mas precisamos trazer os produtos farmacêuticos e medicamentos de volta ao nosso país.”
Vale lembrar que, em fevereiro, Trump declarou em Mar-a-Lago que também imporia tarifas de 25% sobre as importações de semicondutores, microchips e produtos farmacêuticos antes de 2 de abril, mas ainda não as colocou em prática. Da mesma forma, no fim de semana, a bordo do Air Force One, Trump disse aos jornalistas que estava “aberto” a fazer acordos com os países para evitar ou reduzir as tarifas.
O Liberation Day também marca o fim da trégua para as tarifas de 25% sobre veículos importados do Canadá e do México, que Trump havia concedido às grandes montadoras americanas.
Em meio a esse cenário de incerteza, esta segunda-feira marcou o fim de um ciclo turbulento para os mercados americanos, com o S&P 500 a caminho de encerrar o trimestre com a maior perda desde o outono de 2022. Na abertura, o Nasdaq Composite liderava as quedas, enquanto o Dow Jones Industrial Average subia ligeiramente.
A incerteza gerada pelas tarifas do presidente dos EUA impulsionou o valor dos ativos de refúgio. No caso do ouro, estava a caminho de atingir outro recorde histórico de fechamento.