24 Fevereiro 2025
"Assim como Hitler e o nazismo não eram alheios à Europa que os gerou e que devastaram, Trump e Putin não são alheios a essa suposta 'globalização feliz'", escreve Edwy Plenel, jornalista francês, em artigo publicado por Nueva Sociedad, fevereiro de 2025.
O Padre Ubú voltou, na vida real, e não são boas notícias. Assim como o personagem criado há 130 anos por Alfred Jarry em Ubú Rei, essa farsa tão grotesca quanto visionária sobre o delírio do poder, não conhece limites para sua ganância. E, como na peça de teatro, qualquer realidade que obstaculize sua sede de conquista, dominação e posse, ela a joga "na armadilha", sua expressão favorita, fazendo-a desaparecer, engolida por seu estômago de ogro insaciável.
Em uma semana, diante dos nossos olhos, dois povos caíram na armadilha do Padre Ubú, que preside os Estados Unidos desde 20 de janeiro. Na armadilha, os palestinos! Na armadilha, os ucranianos!
No dia 4 de fevereiro, Donald Trump pediu a limpeza étnica da Faixa de Gaza, despojada de sua população palestina, que seria expulsa, sem possibilidade de retorno, para a Jordânia e o Egito. Uma semana depois, em 12 de fevereiro, ao término de uma interminável conversa telefônica de 90 minutos com Vladímir Putin, anunciou a iminente conclusão de um acordo russo-americano que poria fim à guerra de agressão de Moscou contra a Ucrânia, na qual nem os dirigentes ucranianos nem os governantes europeus participaram.
Essas duas datas, em que foram lançados no mesmo buraco negro os direitos dos povos palestino e ucraniano, marcam uma mudança de rumo no mundo para uma era radicalmente nova. Este momento de cristalização tem sido acompanhado, nos últimos dias, por uma violenta ofensiva ideológica do novo poder estadunidense contra a Europa, atacando explicitamente sua frágil coesão e fortalecendo a extrema direita nacionalista e xenófoba do continente.
Mais do que como realidade institucional, a Europa é aqui atacada como símbolo dos valores democráticos que reivindica, bem ou mal, e sem dúvidas de maneira imperfeita, desde que tomou consciência, após a Segunda Guerra Mundial, da catástrofe que seus delírios de dominação colonialista e imperialista causaram à humanidade, cujo motor inesgotável é o capitalismo.
Em Paris, na Cúpula para a Ação sobre Inteligência Artificial, o vice-presidente americano J.D. Vance se lançou em uma diatribe contra qualquer regulação da Terceira Revolução Industrial, a revolução digital, defendendo um direito absoluto dos monopólios capitalistas que se apoderaram dela. Em Bruxelas, durante uma reunião do Grupo de Contato para a defesa da Ucrânia, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Pete Hegseth, anunciou brutalmente que a aliança americano-europeia, cuja expressão estratégica é a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), já não era mais uma preocupação de Washington, pois os Estados Unidos têm outras prioridades: "a segurança de nossas próprias fronteiras".
Por fim, na Conferência de Segurança de Munique, Vance pronunciou um discurso programático que não teria sido rejeitado pelos ideólogos da Rússia de Putin, defensores dos valores tradicionais diante de um Ocidente supostamente decadente. "Há um novo xerife em Washington", afirmou, erguendo este aspirante a caubói de faroeste como líder de uma cruzada mundial contra a única ameaça que seria "a migração em massa", antes de terminar religiosamente com um "Que Deus os abençoe".
Em um discurso orwelliano, de acordo com a censura da linguagem promovida por Trump — discurso no qual se invocou a "liberdade de expressão" para combater os princípios humanistas e democráticos mais elementares, legitimando linguagens racistas e discriminatórias —, o vice-presidente dos Estados Unidos ergueu "a voz do povo", reduzida à mera votação, como um valor cardinal, se não o único, em detrimento de qualquer contrapoder: "Não há lugar para firewalls", resumiu.
Com Trump e com Putin, da democracia só resta a aparência eleitoral, manipulada ou falseada. O golpe de Estado em curso nos Estados Unidos reivindica um poder sem restrições do presidente sobre a administração, a sociedade, a justiça, os meios de comunicação, a oposição e as protestas.
A escolha da Arábia Saudita para selar, nesta semana, a aliança entre Washington e Moscou é em si mesma uma mensagem: um reino absolutista, enraizado no integrismo religioso, cujo feito de armas mais notável foi o assassinato, em 2018, do jornalista dissidente Jamal Khashoggi. Riad era, então, um bom lugar para selar o pacto oligárquico russo-americano, sob o alto patrocínio do monarca Mohamed bin Salman, um ano depois da morte na prisão do opositor russo Alexéi Navalny (em 16 de fevereiro de 2024) e três anos após a invasão da Ucrânia pelo imperialismo russo (em 24 de fevereiro de 2022).
Este momento em que, como um precipitado químico, a história acelera-se bruscamente, dando à luz ameaças definitivas que até então pareciam apenas potenciais, nos coloca diante de dois fatos que nos lançam um desafio vital.
O primeiro é que entramos em um período no qual as duas antigas potências rivais da Guerra Fria chegaram a um acordo para acabar radicalmente com o direito internacional. Para Trump e Putin, assim como para seus diversos aliados e avatares, de Benjamin Netanyahu a Viktor Orbán, nenhuma regra supranacional é legítima; só conta a relação de forças construída pelo confronto e, acima de tudo, nenhum direito humano fundamental é oposto às políticas que impõem ao seu povo ou àqueles que submetem. Só é justo o que eu acredito que é bom para o meu povo, poderia ser seu lema, um preceito que já foi reivindicado por Adolf Hitler.
Este lema foi recentemente reivindicado por Trump na rede X, publicando uma mensagem que estaria inspirada em Napoleão: "Quem salva seu país não viola nenhuma lei". Os especialistas americanos em extremas-direitas não deixaram de apontar que Elon Musk, o proprietário dessa rede social, que se comporta como um co-presidente não eleito, compartilhou imediatamente essa mensagem, acompanhada de 14 bandeiras americanas. Trata-se, na verdade, de uma referência às "14 palavras" do vocabulário codificado dos supremacistas brancos, ou seja, a frase: "Devemos garantir a existência do nosso povo e um futuro para os filhos brancos" (We must secure the existence of our people and a future for white children).
O destino da Ucrânia e da Palestina é a demonstração brutal, na cena diplomática, dessa ruptura com qualquer ideal de um mundo interconectado e uma humanidade comum. Trump pode se dar ao luxo desse golpe de força, tanto mais quanto a "dupla moral" da maioria dos dirigentes ocidentais frente aos conflitos na Ucrânia e Gaza já minou o direito internacional que deveria ter sido intangível em ambos os casos.
Apoiar a guerra de Netanyahu, seus crimes de guerra e contra a humanidade, era fazer o jogo de Putin, com seus próprios crimes de guerra e contra a humanidade. Os "campismos" opostos, um alinhado com o compromisso pró-israelense da presidência de Joe Biden e o outro indiferente à periculosidade do novo imperialismo russo, se deparam hoje com a realidade ignorada por suas respectivas cegueiras: Estados Unidos e Rússia falam a mesma língua, a da lei do mais forte, sem limites ou freios. Em outras palavras, a da catástrofe garantida de uma pretendida grandeza que, inevitavelmente, estabelece uma hierarquia de humanidades, civilizações, religiões, nações, etc.
Não é coincidência, claro, que Trump tenha decidido autoritariamente criminalizar a Corte Penal Internacional, transformando seus juízes em criminosos. Tanto Netanyahu quanto Putin, ambos alvos de ordens de prisão da CPI, não podem deixar de se alegrar com isso. A lista de rupturas da nova presidência dos Estados Unidos com toda a interdependência e multilateralismo nas relações internacionais é interminável: retirada da Organização Mundial da Saúde (OMS) e dos acordos de Paris sobre o clima, abolição das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) pela imposição de taxas alfandegárias em todas as áreas, retirada de vários órgãos das Nações Unidas (ONU), incluindo aqueles sobre direitos humanos e refugiados palestinos, congelamento de fundos da USAID para ajuda humanitária e desenvolvimento, etc.
A segunda evidência é ilustrada por outra das decisões apressadas tomadas por Trump: de uma só vez, com a assinatura de um simples decreto, ele suspendeu uma lei anticorrupção de 1977, a "Foreign Corrupt Practices Act", que proibia as empresas americanas de subornar não apenas nos Estados Unidos, mas principalmente no exterior. Para quem tivesse alguma dúvida, a nova presidência dos Estados Unidos personifica um capitalismo mafioso, assim como seu aliado russo: um capitalismo sem regulação, sem barreiras, sem limites, onde só reinam a ganância, o lucro, o enriquecimento...
Esse capitalismo mafioso, cujo advento foi previsto e documentado pelos italianos Roberto Scarpinato e Roberto Saviano, une o universo dos oligarcas russos e americanos. A gangue de São Petersburgo que se apoderou das riquezas russas após a chegada ao poder de Putin e os bilionários do Vale do Silício que compraram a Presidência dos Estados Unidos com Trump na Casa Branca compartilham o mesmo imaginário predatório.
Como todas as máfias, suas únicas regras são o dinheiro (a acumulação sem limites), a violência (os fins justificam todos os meios) e o segredo (nenhum direito de supervisão ou controle pela sociedade). Pode-se adicionar a religião como pretexto obscurantista, que justifica a perseguição das minorias, das diferenças e das dissidências. Assim como as gangues criminosas se dividem os bairros e os tráficos ilegais, estão dispostas a dividir o mundo conforme seus interesses, em uma fuga para frente extrativista e brutal, cujos objetivos e vítimas são a natureza e a humanidade. Desde as matérias-primas, petróleo e gás, até os dados pessoais, ou seja, nossas individualidades, esses oligarcas, tanto russos quanto americanos, têm em comum seu objetivo de enriquecer, acaparando, ou até roubando, riquezas que não lhes pertencem.
Portanto, resta enfrentar isso. "Nestes tempos difíceis, o desespero não é uma opção", repete uma e outra vez o senador Bernie Sanders, convertido na voz da resistência nos Estados Unidos frente ao silêncio abissal que revela o abatimento da esquerda americana. Ele diz isso com mais convicção, quanto mais, ao contrário dos compromissos dos democratas, esse espírito independente, fiel às revoltas que cimentaram seu compromisso, não deixou de dar o alarme sobre a catástrofe em andamento: a do próprio capitalismo, do qual a oligarquia é o descendente inevitável, em sua corrida por um domínio e uma depredação sem limites.
Assim como Hitler e o nazismo não eram alheios à Europa que os gerou e que devastaram, Trump e Putin não são alheios a essa suposta "globalização feliz" (segundo a fórmula do inefável Alain Minc) que, após a queda da União Soviética, foi o conto de fadas que disfarçou o desencadeamento, em todo o planeta, do reinado da mercadoria com total indiferença pelo bem comum. São suas derivações lógicas e inevitáveis enquanto não se questionar o próprio capitalismo; encarnações dessa barbárie na civilização, que traz consigo sua desmesura e que, novamente, retorna.
No coração do presente, o passado nunca se repete da mesma maneira, mas sua lembrança é sempre um alerta vigilante. Os acontecimentos dos últimos dias lembraram assim dois precedentes históricos cuja evocação não é um anacronismo, mas uma ressonância. Em primeiro lugar, os Acordos de Munique, que em 1938 significaram a covarde rendição das potências europeias, França e Grã-Bretanha, diante do imperialismo nacionalsocialista. Em segundo lugar, o pacto germano-soviético de 1939, assinado pelos regimes nazista e comunista às custas dos povos europeus, em particular da Polônia e dos países bálticos.
Certamente, só o futuro dirá o que a história recordará do discurso do vice-presidente Vance na Conferência de Munique e do pacto Trump-Putin, cujo preço está pagando a Ucrânia. Além disso, por mais surpreendente que seja neste momento, o acontecimento ainda está em curso, e apenas seu desenlace final nos dirá se a maioria republicana no Senado e na Câmara de Representantes o aprova, acelerando a mudança para o inédito e imprevisível. Da mesma forma, ainda não sabemos o que a consciência europeia tardia e incompleta inventará como resposta ao pacto dos oligarcas Trump e Putin.
Mas, desde já, sabemos que não há espaço para titubear, e isso é o que sugere a evocação da sequência 1938-1940, em que, por desgraça, tudo já estava decidido, à força de abdicações, renúncias e acomodações. O essencial está agora em jogo: simplesmente a igualdade de direitos que, desde sua proclamação 'rosseauniana' no século XVIII, é o princípio e o motor das emancipações.
Assim, todos temos um compromisso conosco mesmos, com nossos ideais, com nossos princípios, com o que nos une em nossa diversidade, com o que nos congrega em nossa pluralidade. Como aconteceu ontem com as pessoas de boa vontade que, transcendendo a si mesmas, seus preconceitos e seus sectarismos, se uniram para lutar contra a peste parda, pois trata-se, de fato, da mesma epidemia, sob novas formas e inéditas.