12 Julho 2024
Numa palavra, a mochila deste “sínodo” está meio cheia, com um bom estudo da tradição e da atualidade da Igreja, com nozes verdes para descascar (mesmo que sujem as mãos) e outras maduras para saborear e trilhar nosso caminho juntos. Por outro lado, a mochila me parece um tanto vazia de Evangelho, como a figueira estéril que Jesus encontrou e “condenou” ao entrar em Jerusalém. Esta vontade de escuta... da Igreja é essencial: ouvir os pobres, ouvir as mulheres... Mas só pode haver vontade de ouvir se houver capacidade de falar... Homens e mulheres são definidos no Igreja pela sua capacidade de falar. Não pode haver neles alguns que ouvem (ouvintes da palavra) e outros que falam.
Se todos não puderem falar e ouvir, não há palavra, não há Igreja. Tenho a impressão de que estamos diante de um texto de clérigos do sexo masculino que aproveitam a “onda sinodal” deste momento para insistir mais nas suas vantagens clericais. Houve numa certa Igreja uma obsessão por ouvir, por vigiar... igrejas onde a inquisição foi colocada acima da fraternidade. Quero na Igreja “ministros oficiais” a serviço da comunhão de todos, em liberdade, não da inquisição.
O artigo é de Xabier Pikaza, teólogo espanhol, especialista em teologia bíblica e História das Religiões, publicado por Religión Digital, 11-07-2024.
Como direi amanhã ou depois, comentando o Evangelho de Domingo, 14-07-2024 (Mc 6, 7-13), Jesus enviou os seus discípulos ao mundo dois a dois (homens e mulheres), sem bolsa nem dinheiro, sem mais “instrumento” de trabalho do que a própria vida, ao corpo, expulsando “demônios”, criando a humanidade. Mas o “instrumento de trabalho” do Sínodo da Sinodalidade, publicado semana passada, 09-07-2024, envia aos sínodos católicos “boas mochilas”, alguns dirão meio vazias, outros meio cheias. Limito-me a apresentar e qualificar (com alguma liberdade) alguns enunciados desse instrumento de trabalho.
O documento está bem organizado e escrito, de acordo com o estilo do Vaticano, embora com elementos que eu chamaria de “americanos”, típicos da imprensa atual. É composto por uma introdução, uma fundamentação teórica e três partes:
Parte I – Relacionamentos. Em Cristo e no Espírito: iniciação cristã. Para o Povo de Deus: carismas e ministérios. Com ministros ordenados: ao serviço da harmonia. Entre as Igrejas e no mundo: a realização da comunhão.
Parte II – Itinerários. Treinamento abrangente e compartilhado. Discernimento eclesial para a missão. A articulação dos processos de tomada de decisão. Transparência, responsabilização, avaliação.
Parte III – Lugares. Territórios para viajar juntos. Igrejas locais na Igreja Católica, uma e única. Os elos que constituem a unidade da Igreja. O serviço à unidade do Bispo de Roma…
Conclusão: Conclusão – A Igreja Sinodal no mundo
Numa palavra, a mochila deste “sínodo” está meio cheia, com um bom estudo da tradição e da atualidade da Igreja, com nozes verdes para descascar (mesmo que sujem as mãos) e outras maduras para saborear e trilhar nosso caminho juntos.
Por outro lado, a mochila parece-me um tanto vazia de Evangelho, como a figueira estéril que Jesus encontrou e “condenou” ao entrar em Jerusalém (Mc 11). Muitas coisas podem ser ditas sobre este instrumento de trabalho (Quis, quid, ubi, quibus auxiliis, cur, quomodo: quando, quem diz, o quê, onde, com que meios, porquê, como, quando...). Ou seja, imitando sua língua final em inglês: quem é quem: quem é quem em cada caso, em cada circunstância, com que conhecimentos, meios ou possibilidades possui.
Número 5. O que é sinodalidade?
A sinodalidade pode ser entendida como o caminho dos cristãos com Cristo e rumo ao Reino, juntamente com toda a humanidade; orientada para a missão, a sinodalidade envolve o encontro em assembleia nos vários níveis da vida eclesial, a escuta mútua, o diálogo, o discernimento comunitário, a criação de consensos como expressão do Cristo vivo tornando-se presente no Espírito e assumindo uma corresponsabilidade diferenciada (IdS 1h).
Este número parece-me bom, em linha com uma “sociologia” da ação comunicativa, como a de J. Habermas (ou uma espécie de parlamentarismo político moderno). Mas devemos insistir mais no fato de que a sinodalidade messiânica nasce da eleição dos pobres, dos excluídos, das vítimas e dos doentes... e no fato de que, para a defender e pôr em prática, aqueles que se consideravam defensores da Jesus foi condenado à morte pela sinodalidade do templo de Jerusalém e do império de Roma.
8.- A sinodalidade não implica de forma alguma a desvalorização da autoridade particular e da tarefa específica que o próprio Cristo confia aos pastores: os bispos com os presbíteros, seus colaboradores, e o Pontífice Romano como “princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade tanto dos Bispos como da multidão dos fiéis” (LG 23). Pelo contrário, oferece “o quadro interpretativo mais apropriado para a compreensão do próprio ministério hierárquico”.
A autoridade sinodal está assim ligada ao mistério hierárquico, mas sem especificar a forma ou o modo específico de o fazer, algo que está pendente na Igreja Romana desde o Concílio de Basileia, século XV d.C. A resposta oferecida pelo Instrumentum laboris, citando algumas palavras do Papa Francisco são “desiderativas”, são bem ditas, mas não resolvem a questão. Levará anos e anos para resolvê-lo.
10.- Unidade como harmonia nas diferenças.
10. O dinamismo da comunhão eclesial e, portanto, da vida sinodal da Igreja encontra o seu modelo e a sua realização na liturgia eucarística. Nele, a comunhão dos fiéis (communio fidelium) é ao mesmo tempo a comunhão das Igrejas (communio Ecclesiarum), que se manifesta na comunhão dos bispos (communio episcoporum), devido ao princípio antiquíssimo segundo o qual “a A Igreja está no bispo e o bispo está na Igreja” (São Cipriano, Carta 66.8).
Essas palavras também são ilusões, um pensamento desiderativo, que é valioso, mas que deve ser muito preciso. A Eucaristia não é apenas uma liturgia, mas a essência da Igreja, com o sentido sacerdotal de cada vocação cristã, com os seus elementos económicos, sociais e de comunhão mútua de todos os crentes (celebrantes). As coisas podem e devem ser ditas assim, mas só dizer assim não resolve as coisas, nos fazem acreditar que somos o que não somos.
14.- Neste sentido, a primeira mudança que deve ser feita é uma mudança de mentalidade: uma conversão a uma visão de relacionalidade, interdependência e reciprocidade entre mulheres e homens, que são irmãs e irmãos em Cristo, em vista do bem comum.
16.- Das contribuições das Conferências Episcopais emergem solicitações específicas que devem ser submetidas ao exame da segunda sessão, entre elas:
a) a promoção de espaços de diálogo na Igreja, para que as mulheres possam compartilhar experiências, carismas, competências, intuições espirituais, teológicas e pastorais para o bem de toda a Igreja;
b) uma participação mais ampla das mulheres nos processos de discernimento eclesial e em todas as etapas dos processos de tomada de decisão (elaboração e tomada de decisões);
c) maior reconhecimento e apoio firme à vida e aos carismas das mulheres consagradas e ao seu emprego em cargos de responsabilidade;
d) o acesso das mulheres a cargos de responsabilidade em seminários, institutos e faculdades de teologia;
e) aumento do número de mulheres que desempenham a função de juíza nos processos canônicos.
Não entendo muito bem por que se diz essa coisa especial sobre as mulheres... De acordo com o NT, tudo o que é dito sobre os seres humanos se aplica igualmente a homens e mulheres... Tenho a impressão de que o Instrumentum Laboris “envergonha-se” de uma espécie de discriminação “oficial” contra as mulheres… Neste sentido, o que se diz sobre “mulheres juízas” nos processos canónicos, dito desta forma, é lamentável. E é lamentável o que se diz sobre as “mulheres consagradas”. Ou a questão é levantada desde as raízes, a partir da igualdade essencial de todos os crentes batizados, ou não é levantada. Não se trata de mulheres “compartilhando”, colaborando, acessando… Ou são cristãs ou não, todo o resto é ar quente e desculpas.
20.- O modo sinodal de viver as relações é um testemunho social que responde à profunda necessidade humana de ser acolhido e de se sentir reconhecido numa comunidade concreta. Desafia o crescente isolamento das pessoas e o individualismo cultural, que até a Igreja tem frequentemente absorvido, e chama-nos ao cuidado mútuo, à interdependência e à corresponsabilidade pelo bem comum. Mas também representa um desafio a um comunitarismo social exagerado que sufoca as pessoas e não lhes permite serem sujeitos livres do seu próprio desenvolvimento.
A disponibilidade para ouvir todos, especialmente os pobres, que o modo de vida sinodal promove contrasta fortemente com um mundo em que a concentração de poder exclui os pobres, os marginalizados e as minorias. A conclusão do processo sinodal mostrou até que ponto a própria Igreja precisa crescer nesta dimensão, este é o objeto do trabalho do grupo de estudo n. 2.
Esta vontade de escuta... da Igreja é essencial: ouvir os pobres, ouvir as mulheres... Mas só pode haver vontade de ouvir se houver capacidade de falar... Homens e mulheres são definidos no Igreja pela sua capacidade de falar. Não pode haver neles alguns que ouvem (ouvintes da palavra) e outros que falam. Se todos não puderem falar e ouvir, não há palavra, não há Igreja.
25. Neste sentido, a assembleia eucarística manifesta e alimenta a vida sinodal missionária da Igreja. Na participação de todos os cristãos, na presença dos diversos ministérios e na presidência do bispo ou sacerdote, torna-se visível a comunidade cristã, na qual se realiza uma corresponsabilidade diferenciada de todos pela missão. A liturgia, como “cume para onde tende a atividade da Igreja e ao mesmo tempo fonte de onde brota toda a sua força” (SC 10), é ao mesmo tempo fonte da vida sinodal da Igreja e do protótipo de cada evento sinodal, fazendo aparecer o mistério da Trindade “como num espelho” (1Cor 13,12; cf. DV 7).
Tudo isto é muito bom, mas torna-se uma falsa “teoria”… porque no fundo se mantêm “diferentes ministérios”, com superioridade de facto de uns sobre outros, ao contrário do que Paulo quer e diz em 1 Cor 12-14. Os ministérios aqui referidos tendem a tornar-se um princípio de poder, não de comunhão.
29. Como expressão da liberdade do Espírito na concessão dos seus dons e em resposta às necessidades de cada comunidade, existe uma variedade de ministérios na Igreja que podem ser exercidos por qualquer pessoa batizada, homem ou mulher. São serviços não ocasionais, reconhecidos pela comunidade e por quem tem a responsabilidade de dirigi-la. Podem ser chamados de ministérios batismais, para indicar a sua raiz comum (batismo) e para distingui-los dos ministérios ordenados, enraizados no sacramento da ordem. Encontramos, por exemplo, homens e mulheres que exercem o ministério de coordenação de uma pequena comunidade eclesial, o ministério de condução de momentos de oração (em funerais ou outros), o ministério extraordinário de comunhão ou outros serviços, não necessariamente de natureza litúrgica.
Possivelmente a minha visão do texto esteja distorcida, e isso porque o li a partir da Bíblia, e não a partir de uma estrutura hierárquica da Igreja atual... Mas lendo passagens como esta tenho a impressão de que estamos diante de um texto por clérigos do sexo masculino que aproveitam a “onda sinodal” deste momento para insistir mais nas suas vantagens clericais.
29. O discernimento dos carismas e dos ministérios é uma ação propriamente eclesial: para reconhecê-los e promovê-los, o bispo é obrigado a ouvir a voz de todos os envolvidos: fiéis, comunidades, organismos de participação. Para isso, devem ser identificados procedimentos adequados aos diferentes contextos, procurando sempre chegar a um verdadeiro consenso sobre os critérios e resultados do discernimento. As conclusões do encontro “Párocos para o Sínodo” sublinham fortemente estas necessidades.
Este é um dos casos em que é necessário colocar sujeito nas frases. Quem discerne os carismas e ministérios? Por mais que eu tente colocar o texto corretamente, não consigo responder. É como se dissesse: é bom que existam certas iniciativas sinodais na Igreja, mas, no final, devem ser reguladas (discernidas, valorizadas) pela hierarquia. Todos se acalmem. Época em que as pessoas se deslocam de um lugar para outro com mais facilidade.
33. O caminho percorrido até agora levou ao reconhecimento de que uma Igreja sinodal é uma Igreja que escuta, capaz de acolher e acompanhar, de ser percebida como lar e família. Esta é uma necessidade que se exprime em todos os continentes e que afeta pessoas que, por diversas razões, estão ou se sentem excluídas ou à margem da comunidade eclesial, ou lutam para encontrar nela o pleno reconhecimento da sua dignidade e dos seus dons. Esta falta de acolhimento distancia-os, dificulta o seu caminho de fé e de encontro com o Senhor e priva a Igreja do seu contributo para a missão.
34. Parece, portanto, extremamente oportuno dar vida a um ministério de escuta e de acompanhamento reconhecido e possivelmente instituído, graças ao qual se possa viver concretamente este traço característico de uma Igreja sinodal. É necessária uma “porta aberta” para a comunidade, através da qual as pessoas possam entrar sem se sentirem ameaçadas ou julgadas.
Este é um dos textos que mais me dói... Uma Igreja que escuta me parece muito boa, mas se escuta não vive na fraternidade, na liberdade, na igualdade... (se a escuta estiver reservada a um tipo do clero, pode transformar-se numa inquisição sombria... com conotações ditatoriais). Houve numa certa Igreja uma obsessão por ouvir, por vigiar... igrejas onde a inquisição foi colocada acima da fraternidade. Quero na Igreja “ministros oficiais”, ao serviço da comunhão de todos, em liberdade, não da inquisição. O tema foi levantado com total rigor pelo historiador Von Campenhausen. Kirchliches Amt und geistliche Vollmacht in den ersten drei Jahrhunderten, Tübingen 1953.
43. Segundo o Concílio, em virtude da catolicidade da Igreja, “cada uma das partes colabora com os seus próprios dons com as outras partes e com toda a Igreja” (LG 13).
Não sei se entendo esta frase e muitas outras… Quem é o sujeito de “toda a Igreja?” Em certo sentido, podemos dizer que é o “Espírito Santo”. Não sei se podemos dizer que “toda a Igreja” é a Igreja de Roma, sendo o Papa o sujeito “representante” de toda a Igreja. Não sei como levantar a questão do conciliarismo-sinodalidade das igrejas no século XV... Nem as declarações do Vaticano II sobre o “poder supremo” e a “infalibilidade”. Acredito que não existem igrejas “acima ou fora de suas partes.
57. É necessária uma atenção especial para promover a participação das mulheres nos programas de formação, juntamente com seminaristas, sacerdotes, religiosos e leigos. Também de importância crucial é o seu acesso às funções de professor e formador nas faculdades e institutos teológicos e nos seminários. Sugere-se também oferecer aos bispos, sacerdotes e leigos formação sobre as tarefas que as mulheres já podem desempenhar na Igreja e promover uma avaliação do real uso que se faz destas oportunidades em todos os âmbitos da vida eclesial: paróquias, dioceses. associações leigas, movimentos eclesiais, novas comunidades, vida consagrada, instituições eclesiásticas, até mesmo a Cúria Romana.
Li e reli este número e não sei como compreendê-lo... Parece que destaca a participação das mulheres na formação dos seminaristas (futuros sacerdotes), mas sem que estas possam aceder aos “ministérios ordenados”. Não estou dizendo sim ou não, simplesmente não entendo.
58. Discernimento eclesial para a missão. Graças à orientação do Espírito, o Povo de Deus, como participante na função profética de Cristo (cf. LG 12), "procura discernir nos acontecimentos, nas exigências e nos desejos, nos quais participa juntamente com os seus contemporâneos, as sinais verdadeiros da presença ou dos planos de Deus" (GS 11). Esta tarefa eclesiástica de discernimento está enraizada no sensus fidei, animado pelo Espírito Santo, que pode ser descrito como aquele “cheiro” ou capacidade instintiva do Povo de Deus, sob a orientação dos pastores (cf. LG 12), para "encontrar novos caminhos que o Senhor abre à Igreja" (Francisco, Discurso por ocasião da comemoração do 50º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos, 17 de outubro de 2015).
Esse número ainda me parece bom, mas também não entendo. A Igreja tem uma tarefa essencial de discernimento…Mas não sei quem é o “sujeito” dessa tarefa… O Papa, o Papa com a Cúria vaticana…? O grupo de bispos… O discernimento, assim como a “escuta”, é uma função essencial da Igreja, como Paulo sabe e diz em 1 Cor 12-14. Mas, segundo Paulo, quem escuta-compreende é toda a Igreja (isto é, a comunidade local), que dialoga, que reza, que tira conclusões, que decide (como em Mt 18), mas fora disso faz não encontro uma Igreja universal “sujeita” que escuta, discerne, decide, exceto numa forma sinodal de comunicação de todas as igrejas, numa espécie de “concílio” (no qual está incluído, segundo o costume romano imemorial, o bispo de Roma com sua Igreja.
60. Precisamente porque exige que cada pessoa partilhe o seu ponto de vista na perspectiva da missão comum, um processo de discernimento articula concretamente comunhão, missão e participação. Em outras palavras, é uma forma de caminhar juntos. Por isso é essencial promover uma ampla participação nos processos de discernimento, tendo especial cuidado com o envolvimento daqueles que estão à margem da comunidade e da sociedade cristã.
A questão continua a ser a “anterior”: quem são os discernentes, que podem dizer “pareceu ao Espírito Santo e a nós… (Atos 15). Como entram neste discernimento os pobres, os doentes, as mulheres, as crianças, os presos em M25,31-46.
64. O discernimento realiza-se sempre “com os pés no chão”, isto é, num contexto concreto, cujas complexidades e peculiaridades devem ser conhecidas da melhor forma possível. Portanto, só pode beneficiar do contributo que decorre da análise das diferentes ciências humanas, sociais e administrativas relevantes para a matéria em questão.
Houve e existem na Igreja diferentes formas de discernimento... Na prática antiga (ratificada no Ocidente pela tradição de Santo Domingo de Guzmán), o sujeito da decisão e do discernimento é toda a comunidade... No "absolutista "Tradição (militar) de Inácio de Loyola, quem discerne sozinho é o superior (Geral da Ordem, Papa), de modo que não se pode dizer “pareceu ao Espírito Santo e a Nós. Este documento de trabalho não aborda esta questão fundamental e deixa-nos numa nebulosa…
68. Decisões. Para promover a sua aplicação (a aplicação da sinodalidade), parece oportuno refletir sobre a articulação dos processos de tomada de decisão. Isto geralmente inclui uma fase de elaboração ou instrução (tomada de decisão, segundo a terminologia inglesa também utilizada em outras línguas), “através de um trabalho comum de discernimento, consulta e cooperação” (CTI, n. 69), que informa e apoia a tomada de decisão posterior, que corresponde à autoridade competente (por exemplo, numa diocese ou eparquia, ao bispo). Não há competição nem contraste entre as duas fases, mas antes, através da sua articulação, contribuem para garantir que as decisões tomadas sejam tão coerentes quanto possível com a vontade de Deus: “A elaboração é uma competência sinodal, a decisão é uma competência ministerial” (ibid.).
Este parece-me, de certo modo, o número central deste instrumento de trabalho... Esta é uma questão que foi levantada na Igreja desde o início... e que foi destacada nos movimentos especializados de "ação católica" de uma século atrás, com processos melhor ou pior articulados de ver-julgar-agir dos grupos... Esses movimentos foram parcialmente sufocados por uma hierarquia eclesial, mas foram e continuam a caminhar numa boa direção. Destaque estas palavras: (tomada de decisão, discernimento, consulta e cooperação (CTI, n. 69). Se as mulheres não entrarem, isso não é válido, se não estiver em segundo plano o bem do povo). Esta é a questão subjacente, não a questão de um sacerdócio hierárquico acima dos “crentes” (uma questão que é totalmente marginal na Bíblia como um todo, e na Igreja).
69. Em muitos casos, a legislação em vigor já prescreve que, antes de tomar uma decisão, a autoridade é obrigada a realizar uma consulta. Esta consulta eclesial não pode deixar de realizar-se e vai muito além da escuta, pois compromete a autoridade a não proceder como se não tivesse ocorrido. A autoridade permanece livre do ponto de vista jurídico, pois o parecer consultivo não é vinculativo, mas, se concordar, não se afastará dele sem motivo imperioso (sine praevalenti ratione ; CIC, c. 127, § 2, 2°). Se assim o fizesse, isolar-se-ia do grupo de consultados, constituindo uma lesão ao vínculo que os une.
Também não entendo este número... Parece que no fim a decisão cabe a uma espécie de hierarquia, sem que a sinodalidade seja vinculativa.
70. Numa Igreja sinodal, a competência decisória do bispo, do Colégio dos Bispos e do Romano Pontífice é inalienável, uma vez que está enraizada na estrutura hierárquica da Igreja estabelecida por Cristo. Contudo, não é incondicional: uma orientação que surge no processo consultivo como resultado de um correto discernimento não pode ser ignorada, especialmente se for realizada pelos órgãos participativos da Igreja local. O objetivo do discernimento eclesial sinodal não é fazer com que os bispos obedeçam à voz do Povo, subordinando o primeiro ao segundo, nem oferecer aos bispos um expediente para tomarem decisões já tomadas aceitáveis, mas levar a uma decisão partilhada em obediência a o espírito Santo.
Estas palavras talvez sigam as linhas de uma excusatio (justificatio not petita accusatio manifesta). Pelo menos eles têm que ser muito matizados.
72. Processos sinodais sólidos de tomada de decisão exigem um nível adequado de transparência. Da mesma forma, vale destacar a delicadeza da tarefa e a especial responsabilidade de quem expressa sua opinião em consulta.
73. Uma Igreja sinodal necessita de uma cultura e de uma prática de transparência e de responsabilização, essenciais para promover a confiança mútua necessária para caminhar juntos e exercer a corresponsabilidade na missão comum. Na Igreja, o exercício da responsabilidade não responde principalmente às exigências de natureza social e organizacional. O seu fundamento encontra-se antes na natureza da Igreja como mistério de comunhão.
Essas afirmações devem ser desenvolvidas…
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“Parece-me que o ‘instrumentum laboris’ está um tanto vazio de evangelho”. Artigo de Xabier Pikaza - Instituto Humanitas Unisinos - IHU