27 Março 2024
"Para nós cristãos, o Messias veio, e esperamos o seu retorno. E podemos imaginar que as perguntas que nos serão feitas serão estas: você manteve a esperança? Você soube esperar por mim? Você perseverou até o fim? São perguntas que definem nossas responsabilidades como crentes, especialmente hoje, quando as esperanças humanas são dificilmente praticáveis", escreve Gianni Carozza em artigo publicado por Settimana News, 24-03-2024.
Gianni Carozza é biblista e presbítero da diocese de Chieti-Vasto. Após concluir o ensino médio clássico, frequentou a Pontifícia Universidade Gregoriana e licenciou-se em Sagrada Escritura pelo Pontifício Instituto Bíblico, de Roma. Atualmente, leciona grego bíblico e literatura joanina no Instituto Teológico Abruzzese-Molisano de Chieti e ciências bíblicas no Instituto Superior de Ciências Religiosas "G. Toniolo", de Pescara. Ele é ativo tanto na formação bíblica quanto como animador de retiros espirituais. Publicou: A Palavra é mais doce que o mel (Padova 2019) e O caminho que surpreende: o mistério de Jesus em Marcos (Padova 2020).
Uma consideração, antes de tudo, de ordem geral. Refere-se à nossa maneira de nos relacionarmos com a Palavra de Deus. Podemos dizer que a ouvimos com intensa e profunda participação e, pelo menos em algum momento, também com envolvimento emocional? Trata-se sempre de sermos surpreendidos, pegos de surpresa pela Palavra. Deveríamos nos aproximar de cada página do evangelho como se fosse a primeira vez. Contra o endurecimento causado pelo hábito, o único antídoto é a surpresa.
Lucas construiu o longo relato dos discípulos de Emaús (Lc 24,13-35) seguindo o esquema de uma ida e volta, que se transfigura em uma jornada interior e espiritual: da esperança perdida à esperança recuperada, da tristeza à alegria, da Cruz à ressurreição (e da ressurreição à cruz).
O problema que o relato coloca não é a presença ou ausência de Jesus ressuscitado (ele se aproxima dos dois discípulos e caminha com eles), mas como e onde reconhecê-lo. A condição essencial para reconhecer o Ressuscitado é a compreensão da Cruz, que por sua vez requer a inteligência das Escrituras. O gesto com o qual ele se faz reconhecer é a fração do pão.
Ao longo do caminho que os afasta de Jerusalém, os dois discípulos discutem sobre o que aconteceu. Por que discutem? Não estava tudo claro? Evidentemente, se estão discutindo, é porque percebem, ainda que confusamente, que algo ainda escapa à sua compreensão. O que? Os dois perderam a esperança, e ainda assim continuam pensando, falando e discutindo sobre a esperança perdida. Certamente tinham a impressão de que o Crucificado, embora tivesse frustrado sua esperança, escondia algo desconhecido.
Lucas usa três verbos para descrever em todas as suas nuances a conversa deles. O primeiro verbo (mileon, v. 15) tem um significado geral: 'discorrer', falar, conversar. O tempo é o imperfeito, então é uma discussão longa e repetida. E é um falar juntos, um com o outro, como Lucas especifica. O detalhe não é secundário. Não se entende o que aconteceu sozinho, cada um por si. Nem basta que um conte e o outro ouça. Cada um tem algo a dizer ao outro e algo a ouvir do outro. Somente quando há esse dizer e ouvir mútuos pode-se falar de uma conversa verdadeira.
A reciprocidade sugerida também pelo segundo verbo utilizado (suzeteon, v. 15): 'buscar juntos', investigar juntos. A conversa dos dois não é apenas uma discussão simples, um falar e ouvir, mas um esforço conjunto para entender, para avaliar, compartilhando suas observações e avaliações para progredir em direção a uma compreensão maior.
O terceiro verbo (antiballein, v. 17) — não mais do narrador que descreve mas de Jesus que interroga os dois — expressa o debate, o contraste entre diferentes pensamentos, a discussão acalorada. Até mesmo o conflito.
Mas a busca do homem — mesmo que conduzida corretamente — não consegue sozinha compreender tudo o que aconteceu. É necessário um "evento" revelador. A busca do homem não é suficiente, embora muito importante: é de fato normalmente o espaço que o homem pode oferecer, quase uma invocação, à intervenção reveladora. Em nosso relato, a intervenção (gheneto, v. 15) que se insere na busca dos dois discípulos, imprimindo-lhe uma reviravolta inesperada, é o Ressuscitado que se aproxima e se torna companheiro de viagem deles: "Enquanto conversavam e discutiam juntos, Jesus mesmo se aproximou e caminhava com eles" (v. 15).
A aparição do Ressuscitado é um evento repentino, sem premissas, totalmente gratuito. Os eventos de Deus são indedutíveis, simplesmente acontecem. Os dois não o reconhecem. Não porque Ele assumiu uma aparência desconhecida para aparecer incógnito, mas porque "seus olhos não tinham força para reconhecê-lo". Não cabe a Jesus mudar a aparência, mas sim aos discípulos mudar o olhar. É uma incapacidade profunda, que afeta a mente e o coração, uma verdadeira impossibilidade como sugere o verbo usado por Lucas. É necessário um novo modo de olhar para o que já foi visto antes. O Ressuscitado permanece necessariamente estranho se não entrarmos — através da compreensão das Escrituras — na verdade do Crucificado.
Inserindo-se na jornada dos dois discípulos, Jesus assume o controle da situação. Mas não para mudar a direção da viagem, mas para mudar seu significado: não mais uma simples jornada para Emaús, mas um encontro com Ele. A jornada de afastamento torna-se a jornada de encontro. E isso é possível não porque os discípulos (os homens?) estão caminhando em direção ao Senhor, mas porque o Senhor se insere na jornada dos homens.
O desconhecido se aproxima sem muitas cerimônias e se intromete na discussão dos dois discípulos. A iniciativa está toda do lado dele: ele os seguiu por um trecho do caminho, os ouviu discutir animadamente, decide participar de sua discussão. Ele se introduz com uma pergunta que vai direto ao cerne de seu problema: sobre quais assuntos vocês estão debatendo? Ele não pergunta para onde estão indo ou de onde vêm. Ele pergunta sobre o que estão falando. Interessa a ele o assunto de sua discussão. Sua curiosidade para os dois discípulos em seu caminho e em sua discussão: "Eles pararam imediatamente", diz o verbo. "Com rostos sérios", especifica Lucas, que assim os retrata em sua tristeza. Por que estão tristes? A razão eles mesmos dirão logo depois: "Nós esperávamos".
A pergunta do estranho causa surpresa em um dos dois, chamado Cleofas. Você é o único tão estrangeiro em Jerusalém a ponto de não saber o que aconteceu nestes dias? Mas ao desconhecido não interessa o que aconteceu e como em Jerusalém estão falando sobre isso. Interessa a ele como eles estão contando. "Quais coisas?", ele pergunta. Ouvir como eles contam as coisas é importante: aprendemos não apenas o que aconteceu, mas como eles viram e interpretaram.
Ambos contam (o verbo está no plural) as "coisas sobre Jesus": não apenas os últimos eventos, mas toda a sua história, que se desdobrou em três momentos: o ministério público, a condenação à morte, o silêncio do túmulo vazio. O relato é preciso. O erro dos dois discípulos não está em terem esquecido algo, mas em pensar nos três momentos separadamente em vez de unidos em uma linha coerente, como formando um único evento.
Primeiro uma história, que mostrou Jesus como um poderoso profeta pela eficácia de seu ensinamento e a força de seus milagres. Uma manifestação pública que despertou o favor de todo o povo e a aprovação de Deus. Mas depois — e aqui a história de Jesus parece se quebrar e se contradizer — a condenação à morte e a crucificação.
A morte de Jesus não é devida ao povo nem ao castigo de Deus. Apenas as autoridades judaicas o condenaram à morte. Jesus foi condenado inocente, e portanto sua morte na Cruz não muda o julgamento positivo que os dois têm sobre Jesus. A verdade de seus milagres e de suas palavras não é obscurecida. Mesmo após a Cruz, os dois estão convencidos de que Jesus foi um "poderoso profeta". No entanto, a Cruz causou uma decepção amarga: "Nós esperávamos que ele fosse o libertador de Israel". A missão de Jesus foi interrompida sem que Ele pudesse libertar Israel. Se a Cruz não negou que Jesus fosse profeta, ela negou que Ele fosse o Messias. O Crucificado marca o colapso da esperança messiânica. Os dois não entendem a continuidade entre o profeta poderoso e o Messias crucificado. A maneira de olhar para a Cruz deve mudar radicalmente: não a negação da esperança, mas seu fundamento. É essa a reviravolta para a qual o Ressuscitado levará os dois discípulos explicando as Escrituras: o Crucificado não é a derrota da esperança messiânica, mas a revelação de uma esperança diferente; não é a negação da libertação, mas uma maneira diferente de entendê-la.
Vivemos em um mundo que, enquanto tenta de todas as maneiras exorcizar o pensamento da morte, é profundamente atraído por ela. A esperança (Péguy dizia: "Minha pequena Esperança é aquela que nos dá bom dia todas as manhãs") encontramos cada vez mais dificilmente em nosso caminho.
"Nós esperávamos": quanto desânimo há neste verbo conjugado no passado! Faz-nos pensar em quantas coisas também nós esperamos, legitimamente esperamos, sem encontrar depois uma confirmação positiva às nossas expectativas.
Parece que a história continua avançando, zombando daqueles que persistem em esperar. Quem não esperou, por exemplo, por um tipo de política mais transparente e mais atenta ao bem comum? Quem não esperou por uma sociedade menos violenta, por um comportamento civil menos corrupto ou por uma convivência mais pacífica? E quanto à igreja, quem não esperou, depois dos anos do concílio, por uma primavera da igreja, alegremente aberta a todos os fermentos evangélicos que nascem do coração dos fiéis?
A tentação nos momentos de cansaço, na queda das esperanças, é também para nós, como para os dois discípulos, a de voltar para nossas casas, de nos fecharmos em nossos pequenos problemas, de não olharmos nos olhos dos outros.
"Nós esperávamos". "E agora está ficando tarde": como é moralmente sugestiva esta palavra! Entramos em uma condição crepuscular, quando a luz diminui e os contornos das coisas se confundem.
Temos a impressão de que a escuridão prevaleceu e apagou a luz. Em certos momentos, como os nossos, quando encontramos opiniões opostas sobre o que é lícito e o que não é lícito, sobre o que é moral e o que é imoral, sobre o que realmente salva o homem e o que o arruína, temos a impressão de não saber mais julgar. De ter perdido o critério de julgamento. De estarmos continuamente expostos à palavra mais astuta, mais promissora ou menos inquietante. Quem está certo? Gostaríamos de entender mais.
Sofremos por não conseguirmos entender mais. E talvez culpemos o Senhor por nossa confusão. Onde está o Senhor, o Ressuscitado? Acreditamos que ainda é Ele quem conduz a história?
Talvez estejamos na situação dos dois discípulos que disseram: "Na verdade, algumas mulheres vieram nos dizer que ele está vivo". Quem sabe, talvez ele esteja vivo, mas é uma hipótese remota, um boato pouco crível. E não percebemos que o Senhor está tão vivo que está percorrendo o mesmo caminho que nós.
Assim aconteceu com os dois discípulos. O que o Senhor fez para libertá-los de seus medos? Ele realizou gestos muito simples, elementares, humanos. O Senhor encontra os homens, mas não os convoca para o palácio ou para a igreja. Ele os encontra ao longo do caminho que estão percorrendo. O Senhor vem nos procurar em nossos caminhos e nós não devemos procurar o Senhor em outro lugar, abandonando o caminho humano.
Em outras palavras, não devemos acreditar que encontrar o Senhor requer se isolar, se separar dos outros, erguer bandeiras como sinais de reconhecimento. O caminho que Deus nos indica é o caminho da vida, ao longo do qual somos chamados a viver as esperanças, angústias, dores e sonhos dos outros. E é bonito observar também o modo como Jesus se aproxima das pessoas: um estilo de discrição, extrema respeitabilidade, cordialidade e abertura na conversa. É o diálogo que salva.
Há um belo aforismo que encontrei citado em uma página de um escritor francês, Michel Tournier: "O acaso é Deus passando incógnito". Para mim, essa afirmação interpreta muito bem o sentido do relato que encontramos no evangelho.
O acaso é representado pelo encontro dos dois discípulos com uma personagem misteriosa. Em certo ponto, eles entendem que, sob as aparências de um viajante comum, está a presença do ressuscitado. Como eles entendem isso? Pelo fato de se sentirem alcançados por uma palavra capaz de acender seus corações e pelos gestos da mais tocante convivência. Em outras palavras, pela experiência de Deus, que é verdade e amor.
Também acontece conosco de encontrarmos pessoas e situações por acaso. E pode ser que desses encontros reste em nossos corações uma emoção especial, por termos ouvido uma palavra que nos abriu uma verdade profunda ou por termos desfrutado do gesto inesperado de uma grande amizade. Significa que o acaso estava habitado pela presença misteriosa de Cristo peregrino em nossos caminhos. Manter os olhos fixos nele, como fizeram Cleofas e seu companheiro, nos permite conjugar o verbo esperar não apenas no passado, mas estar alegremente cheios de esperança. Por isso continuaremos a esperar e a fazer esperar.
Depois de vermos o fundamento da esperança, agora nos perguntamos: como vivê-la, testemunhá-la, torná-la crível? Uma indicação vem do apóstolo Paulo: "Justificados, pois, pela fé, tenhamos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; por meio dele, obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes e nos gloriamos na esperança da glória de Deus" (Rm 5,1-2).
A esperança não é apenas um simples consolo. É antes de tudo um orgulho. Nós nos orgulhamos pela consciência do que já recebemos e pela promessa do que receberemos. E não é um orgulho ilusório porque está ligado à experiência: "E a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado".
Mas esse orgulho não significa que a esperança deva ser pregada, proclamada, gritada diante dos outros. Estamos nos movendo dentro de uma cultura que exige verificações imediatas. Não aceita mensagens de palavras, mas mensagens de vida. Portanto, a esperança deve se traduzir na vivência, deve se inserir nas vinte e quatro horas de nossos dias, no trabalho diário, nos relacionamentos com os outros.
É inútil falarmos sobre uma esperança eterna se não formos capazes de encontrar e indicar a esperança imediata. Porque então essa esperança eterna é alienação. A vida eterna começa aqui. Se não começar aqui, não tem mais sentido. A esperança cristã deve se tornar, portanto, um estilo de vida, um selo, uma nota original e inconfundível de nossa existência diária.
Tentemos fixar algumas imagens da esperança. Esperar significa adquirir uma condição de leveza, soltura, liberdade diante das coisas e eventos da vida, mesmo diante da morte. Se estivermos constantemente ansiosos, se nos preocuparmos até a angústia em cercar nossa vida de proteções e garantias, que esperança podemos demonstrar?
Não se trata de inconsciência e irresponsabilidade, mas de aceitar e viver o que o apóstolo Paulo nos lembra na carta aos Romanos: "Se vivemos, vivemos para o Senhor. Se morremos, morremos para o Senhor. Portanto, quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor" (14,8). Nosso futuro está nas mãos de Deus. Por isso, apesar de tudo, nos sentimos livres.
Alguém falou do cristão como o malabarista que avança sem medo sobre a corda esticada lá em cima porque, mesmo que caia, terá abaixo uma rede de salvação para recebê-lo. Prefiro, no entanto, outra imagem (a anterior dá uma ideia reducionista da salvação, quase como se fosse um simples resgate). Somos como o pássaro que, quando o galho começa a tremer, continua a cantar porque sabe que tem asas.
Outro sinal da esperança é a capacidade de dar, de doar sem esperar nada em troca, de doar plenamente, de perdoar. Significa estar aberto ao futuro, confiar no futuro de Deus.
O profeta da esperança é também aquele que não escolhe ficar com os vencedores deste mundo, mas prefere os pobres, os sofredores, os errantes, aqueles que não têm lugar neste mundo. Quem escolhe ficar com os pobres demonstra acreditar verdadeiramente que são eles a utopia de Deus neste mundo, porque "a pedra rejeitada pelos construtores tornou-se a pedra angular".
A esperança também se revela através da fidelidade, da paciência. Paciência não no sentido passivo. Paciência como perseverança, como coragem, como vontade de enfrentar as resistências, as dificuldades, as opacidades do presente.
A esperança nunca se alimenta da evidência. Ela é anterior às verificações. É um "absoluto". Em um mundo que não conhece mais os longos tempos da esperança, a esperança cristã é um sinal surpreendente e inquietante.
Numa história do Talmude, conta-se que um dia um rabino, querendo se preparar bem para o juízo final, imaginou quais perguntas o Juiz do mundo poderia fazer a um judeu: você observou os mandamentos? Comportou-se corretamente nos negócios? Buscou a sabedoria? Mas, no final, pensou que a pergunta decisiva poderia ser outra: você esperou pelo meu Messias?
Para nós cristãos, o Messias veio, e esperamos o seu retorno. E podemos imaginar que as perguntas que nos serão feitas serão estas: você manteve a esperança? Você soube esperar por mim? Você perseverou até o fim? São perguntas que definem nossas responsabilidades como crentes, especialmente hoje, quando as esperanças humanas são dificilmente praticáveis.
A maior caridade que podemos fazer ao nosso mundo é ter nos lábios, no coração e, sobretudo, na transparência de toda a nossa vida, o clamor encontrado no Apocalipse: "Amém, vem, Senhor Jesus" (20,20).
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O Crucifixo, revelação de uma esperança diferente. Artigo de Gianni Carozza - Instituto Humanitas Unisinos - IHU