01 Março 2023
A amargura, a um ano do início da guerra na Ucrânia, caracteriza o pensamento corrente no Vaticano e nas comunidades cristãs do país agredido, onde, porém, parece se perfilar um fatigante início de reconciliação entre as igrejas ortodoxas até agora tenazmente adversárias.
A reportagem é de Luigi Sandri, publicada em L’Adige, 27-02-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O papa havia intervindo no dia 24. “Hoje”, disse Francisco, “completa-se um ano dessa guerra. Olhemos para a Ucrânia, rezemos pela Ucrânia e abramos o nosso coração para a dor. Não nos envergonhemos de sofrer e de chorar, porque uma guerra é a destruição, uma guerra nos diminui sempre. Que Deus nos faça entender isso”. E, nesse domingo, no Ângelus, reafirmou: “Não esqueçamos a tragédia da guerra na Ucrânia, já se fez um ano de guerra”.
Ao lançar essas palavras, Francisco continua fazendo com que se saiba que a Santa Sé está sempre disposta a oferecer sua disponibilidade para uma mediação que ponha fim nesse conflito.
No entanto, se nos fronts político e militar não parece haver, neste momento, nenhum motivo que leve a esperar pelo menos em uma trégua, algo novo está aparecendo no front religioso. Até meados de 2018, a grande maioria da população ucraniana pertencia à Ortodoxia, subdividida, porém, entre a Igreja Ortodoxa Ucraniana (IOU), ligada ao Patriarcado de Moscou; e depois ao Patriarcado de Kiev e a uma minúscula igreja autocéfala.
Havia também, no país, uma minoria protestante; a Igreja Greco-Católica, ligada a Roma; uma significativa comunidade judaica (o presidente Zelensky é judeu); e um certo número de ateus declarados. Mas, em dezembro daquele ano, o patriarca de Constantinopla, Bartolomeu, favoreceu a celebração, em Kiev, de um “concílio da reunificação” das várias igrejas ortodoxas que, depois, pediram a ele a autocefalia (“independência canônica”) para a igreja recém-nascida.
No entanto, a IOU – a mais forte em número de bispos, paróquias e fiéis – recusou-se a entrar nela; e o Patriarcado de Moscou, liderado por Kirill, definiu a obra de Bartolomeu como “cismática” e rompeu a comunhão eucarística com ele. Mas, no dia 24 de fevereiro de 2022, quando começou a invasão russa da Ucrânia, o metropolita de Kiev e primado da IOU, Onufry, qualificou a decisão do presidente russo, Vladimir Putin, como um “ato inadmissível diante de Deus e diante dos homens”.
Nas semanas seguintes, muitos de seus bispos e popy (padres) deixaram de citar na liturgia a referência a Kirill: uma escolha por si só cismática em relação ao patriarca. É nesse contexto anômalo que, há algumas semanas, os expoentes das igrejas “moscovitas” e da autocéfala iniciaram conversações para chegar – esperançosamente – à reconciliação, sob a proteção de Constantinopla.
Uma escolha que o Patriarcado de Moscou considera “infeliz e cismática”: se for implementada, de fato, privaria a igreja russa de cerca de 30 milhões de fiéis, quase um terço de seus seguidores.
Pelo contrário, para Kiev, seria uma inesperada consequência positiva da tremenda “operação militar especial” lançada pelo Kremlin contra a Ucrânia.
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Ortodoxia, provas de conciliação - Instituto Humanitas Unisinos - IHU