Censo Escolar de Educação Básica 2024: os desafios em favor de uma educação de qualidade. Entrevista especial com Gabriel Grabowski

Enquanto a rede privada apresenta uma retórica de mais qualidade na educação, resultados são muito semelhantes à rede pública, mas este discurso galvaniza a “saída” neoliberal como alternativa aos índices da educação nacional

Foto: Agência Brasil

18 Julho 2025

No Brasil, há 47 milhões de matrículas na rede de educação básica. O número supera a população de dezenas de países. A soma de todos os recursos – da União, Estados e Municípios – para a educação no Brasil não chega a 6% do PIB. O discurso da rede privada de que oferece ensino de mais qualidade em comparação à rede pública não se sustenta nos indicadores. Frente a tudo isso a sociedade brasileira se furta a tomar a pauta educacional na profundidade que merece. Os dados da abertura e da entrevista que se segue são do Censo Escolar da Educação Básica de 2024.

“Na educação básica, a rede pública (municipal, estadual e federal) atende a 79,8% das matrículas. Portanto, necessitamos que esta oferta pública tenha financiamento estatal ampliado e regular (sem contingenciamentos e cortes), com professores bem formados e carreiras decentes, com escolas bem estruturadas e equipadas de laboratórios, bibliotecas e espaços culturais e de entretenimento”, aponta Gabriel Grabowski, em entrevista por e-mail ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU. “Os dados revelam que a participação da escola privada é de aproximadamente 20% no Ensino Fundamental e 13,2% no ensino médio, tendo avaliações de desempenho relativamente próximas”, complementa.

No ensino superior, as únicas universidades brasileiras que figuram na lista das melhores universidades globais são as públicas, o que contradiz o senso comum de que qualidade no ensino está associada ao pagamento por ele. “No Brasil busca-se criar uma ideia de que o privado é sempre melhor, porém, isto não condiz com a realidade. Basta observar quais são as melhores universidades, melhores hospitais, melhores serviços e, inclusive, melhores empresas”, explica.

Na contramão de práticas que qualificam o ensino e a formação de estudantes – boa infraestrutura e professores bem remunerados – estados e municípios apostam em privatização como alternativa. “Cresce no Brasil uma proposta de ampliação da participação do setor privado na educação pública e, consequentemente, uma deterioração do serviço público de qualidade. A estratégia de governos estaduais e de algumas capitais de tornar obrigatórias as plataformas educacionais nas redes estaduais e municipais é a evidência mais recente”, descreve.

A questão não é só de ordem econômica – de onde retirar os investimentos para o setor -, mas sobretudo política. “A sociedade brasileira poucas vezes assumiu a defesa e a agenda da educação pública como direito de todos. O cenário político e a polarização produzida a partir de 2015 fragilizou os movimentos sociais, sindicais, entidades educacionais e, inclusive, os partidos da esquerda e centro esquerda”, critica.

Por fim, sair da curva de um projeto anticivilizatório que se instaurou no Brasil nos últimos vários anos é um processo lento e difícil. “Instaurou-se na última década um ambiente conservador, negacionista, antipopular e antissocial que jogou na defensiva os lutadores sociais. Desde o golpe de 2016, perpassando os governos Temer (2016-2019) e Bolsonaro (2019-2022) estamos vivenciando um retrocesso em toda agenda social, ambiental, científica e educacional”, afirma o entrevistado.

Gabriel Grabowski (Foto: Feevale)

Gabriel Grabowski é graduado em Filosofia Plena pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Dom Bosco (1985), mestre (2004) e doutor (2010) em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor pesquisador da Universidade Feevale, atua no Programa de Pós Graduação em Qualidade Ambiental (PGQA) e Mestrado em Psicologia. Presidente do Conselho de Desenvolvimento Regional do Vale do Rio dos Sinos (Consinos) e membro da Diretoria da AESUFOPE. 

Confira a entrevista.  

IHU – Como se caracteriza, atualmente e historicamente, a escola e a formação escolar brasileira?

Gabriel Grabowski – Há diversas formas de caracterizá-la e nossa literatura é farta ao abordá-la. Eu penso que a escola e a formação escolar brasileira continuam sendo um dos maiores desafios de nossa nação. Em pleno século XXI, no ano de 2025, ainda não conseguimos universalizar a educação básica como direito de todas as crianças, adolescentes, jovens e adultos. Neste século tivemos dois Planos Nacionais de Educação (2001-2011 e 2014-2024) com a maioria das metas descumpridas pela União, Estados e Municípios.

Temos uma legislação educacional relativamente avançada, mas não cumprida, onde a implementação das políticas públicas, especialmente a do financiamento da educação, é um dos maiores impedimentos de para uma formação escolar de qualidade. Não podemos deixar de registrar que continuamos como um dos países mais desiguais do mundo, onde a riqueza de poucos e a pobreza de 2/3 da população se cruzam cotidianamente.

Concordo com Anísio Teixeira que a educação de qualidade no Brasil contínua sendo um privilégio de poucos, pois a escola pública onde a maioria dos pobres, pretos e periféricos estudam é precarizada e inviabilizada a oferta de formação com qualidade social.

IHU – O que os dados do Censo Escolar da Educação Básica de 2024 revelam sobre a situação da formação de crianças e adolescentes no Brasil?

Gabriel Grabowski – O Censo revela que foram contabilizadas 47,1 milhões de matrículas na Educação Básica - EB em 179,3 mil escolas. Só este dado demonstra que os estudantes da EB são mais que a população da maioria dos países, portanto, com potencialidades imensas para formarmos uma nação melhor do que hoje temos.

Segundo o Censo, quase a metade dos alunos matriculados na EB são atendidos pelos municípios brasileiros (49,1%), enquanto a rede privada tem uma participação de 20,2%. Na educação básica, a rede pública (municipal, estadual e federal) atende a 79,8% das matrículas. Portanto, necessitamos que esta oferta pública tenha financiamento estatal ampliado e regular (sem contingenciamentos e cortes), com professores bem formados e carreiras decentes, com escolas bem estruturadas e equipadas de laboratórios, bibliotecas e espaços culturais e de entretenimento.

O censo de 2024 revela que a rede pública estadual tem uma participação de 83,1% no total de matrículas do Ensino Médio - EM, e a rede federal possui 3,1% desse total. Enquanto a rede privada possui cerca de 1 milhão de alunos e tem uma participação de 13,2% na matrícula de ensino médio.

Segundo dados da PNAD Contínua do 1º trimestre de 2024, o Brasil tem aproximadamente 48 milhões de jovens com idade entre 15 e 29 anos, mas o total de matrículas do ensino médio em 2024 foi de apenas 7,8 milhões, estagnação que se estende a quase duas décadas.

IHU – Por que a polarização entre a escola pública e a privada é um tema sensível para compreendermos nossos dilemas educacionais?

Gabriel Grabowski – Os dados revelam que a participação da escola privada é de aproximadamente 20% no Ensino Fundamental e 13,2% no ensino médio, tendo avaliações de desempenho relativamente próximas. Penso que tal polarização é falsa, promovida mais como estratégia de captação de alunos do que, de fato, em desempenho. Os Institutos Federais – IFs, a Escola Técnica Liberato (Novo Hamburgo) [estadual] e centenas de escolas de ensino médio possuem excelente qualidade.

No Brasil busca-se criar uma ideia de que o privado é sempre melhor, porém, isto não condiz com a realidade. Basta observar quais são as melhores Universidades, melhores hospitais, melhores serviços e, inclusive, melhores empresas.

Se os recursos públicos fossem mais bem investidos na escola pública não estaríamos polarizando este tema. Hoje os subsídios públicos a setores privados (agronegócio, indústrias, sistema financeiro etc.) equivalem a vários anos do orçamento do MEC. Parte deste valor seria suficiente para que nossa educação pública fosse qualidade como em muitos países, inclusive como os da OCDE.

IHU – O que a redução de 216 mil matrículas em 2024, comparando com o ano de 2023, significa não somente em termos quantitativos, mas também qualitativos como sintoma da educação básica?

Gabriel Grabowski – Significa em primeiro lugar que nem todas as crianças, adolescentes e jovens estão matriculados na Educação Básica - EB como deveria, segundo a PEC 095/2009 que definiu 2016 como prazo para universalização desse direito. Em segundo lugar, impactos da pandemia, da crise climática em algumas regiões, negacionismos, críticas às escolas e redução demográfica contribuem para esta redução. O Estado, as Famílias e a Sociedade, conforme artigo art. 206 da CF, deveríamos assumir de direito e de fato a presença de todos na escola.

IHU – E o Ensino Médio, qual foi a avaliação no Censo Escolar?

Gabriel Grabowski – Continua sendo a etapa mais crítica da EB. Entre 2002 e 2004 chegamos a ter 9.169.357 matrículas. Em 2024, foram registradas 7,8 milhões de matrículas, total ainda inferior à matrícula observada em 2022 no contexto da pandemia. Cabe lembrar que, segundo dados da PNAD Contínua do 1º trimestre de 2024, o Brasil tem aproximadamente 48 milhões de jovens com idade entre 15 e 29 anos.

No estado do Rio Grande do Sul, além do descumprimento das Metas estabelecidas no Plano Estadual de Educação (PEE 2015-2025), estamos retrocedendo nas matrículas no Ensino Médio, na Educação Profissional e, também, na Educação de Jovens e Adultos - EJA.

O Censo Escolar de 2024 registrou uma redução de 44,3 mil alunos matriculados na educação básica no RS; na educação profissional tivemos uma redução de 4% nas matrículas enquanto no Brasil as matrículas cresceram de 6,7%; na EJA tivemos uma redução de quase 8 mil matrículas na rede estadual. Desde 2019, a queda já chega a 46.827 matrículas, o que representa uma retração de 65,3% no número de estudantes atendidos e, o RS, é o segundo pior estado na oferta de Educação Integral do Brasil.

Múltiplas são as causas para este cenário, entre as quais destacamos: descontinuidade de políticas públicas nas trocas de governos; reformas educacionais e curriculares frequentes e escolas sem infraestrutura (laboratórios, biblioteca, internet, espaços esportivos e culturais). Além da precarização da carreira docente, o excesso professores temporários e a falta de escuta ativa das juventudes.

IHU – No Rio Grande do Sul, quais são os principais gargalos relacionados à Educação Básica? Como o cenário se transformou nos últimos dez anos?

Gabriel Grabowski – Em parte, já comentei na questão anterior. Porém, temos no RS uma redução de matrículas na rede Estadual (mantida pela SEDUC-RS) muito preocupante, tanto no ensino médio, no técnico, como na EJA. Só não é pior o cenário porque a Rede Federal (IFs) está em crescimento e expansão, como ocorre, também, na rede privada.

Mas há outras dimensões, como reprovação e abandono escolar elevado, distorção idade-série, especialmente nos anos finais (8º e 9º ano do Ensino Fundamental) e 1º ano do Ensino Médio.

Penso que não temos uma Política Estadual para Educação Básica construída com a sociedade, comunidade educacional, entes e sistemas de ensino que ofertam a EB no território gaúcho. Cada município faz a sua política em cada ciclo de governo, o Plano Estadual de Educação e os Planos Municipais de Educação não são implementados nem monitorados. Ou seja, a cooperação política, pedagógica, técnica e financeira entre os sistemas é inexistente e invisível.

Da mesma forma, a comunidade escolar – professores, funcionários técnico-administrativos, estudantes e famílias – não são ouvidos nem engajados no processo político pedagógico da construção das aprendizagens e decisões educacionais. Ouve-se mais consultores, OCDE, institutos e fundações do que universidades, pesquisadores e professores que estudam, pesquisam e atuam nas escolas.

Mas cabe destacar que existem muitas dezenas de Municípios no RS e no Brasil, bem como vários Estados, desenvolvendo boas práticas educativas e políticas públicas de qualidade. O Brasil, dada nossa potencialidade e diversidade possui um potencial que é promissor, desde que a elite permita maiores investimentos e superação das desigualdades econômicas, sociais, raciais e de classe.

Cresce no Brasil uma proposta de ampliação da participação do setor privado na educação pública e, consequentemente, uma deterioração do serviço público de qualidade. A estratégia de governos estaduais e de algumas capitais de tornar obrigatórias as plataformas educacionais nas redes estaduais e municipais é a evidência mais recente.

IHU – De 2019 para cá houve uma redução de mais de 17% no número de estudantes gaúchos matriculados no Ensino Médio. O que explica a redução? Que iniciativas do governo estadual estão sendo tomadas diante desta situação?

Gabriel Grabowski – São múltiplas as causas da redução das matrículas no RS. É o primeiro Estado que virou a página do bônus demográfico, ou seja, queda na natalidade e aumento de adultos e idosos. Porém, ainda temos milhões de crianças e jovens na EB com o ensino médio por concluir, ou seja, não é falta de estudantes.

Vou destacar mais duas causas: o RS é um dos estados que reprova estudantes no final dos anos do ensino fundamental (8º e 9º ano) e no ensino médio, especialmente no 1º ano, gerando atrasos idade-série de atrasando estes jovens na conclusão da Educação Básica. Outra consequência é o abandono escolar destes estudantes: também o RS é um dos estados de maior abando.

Este jovem-adolescente precisa contribuir com a geração de renda para família e antecipar o ingresso no mercado de trabalho, mesmo de forma precária. Estudar e trabalhar ao mesmo tempo é muito exaustivo e desmotivador, principalmente para os jovens pobres, de periferia, negros e pardos.

Outra causa para a redução e desvalorização da escolaridade é a precarização das escolas públicas estaduais e da carreira docente, fruto de políticas de governos em detrimento de políticas de Estado. Cada novo governo estadual descontinua a política educacional da gestão anterior e implementa outra. Isto é recorrente, no mínimo há seis gestões, ou seja, 24 anos. Há pesquisas e estudos que comprovam o impacto da descontinuidade das políticas de ensino médio no RS.

IHU – Qual a importância da Educação Integral para a melhora dos índices de frequência e da qualidade de aprendizagem?

Gabriel Grabowski – Educação Integral, Formação Integral e Escola de Tempo Integral são concepções distintas, mas que precisam ser articuladas/integradas por um Projeto Político-Pedagógico Institucional pelas Instituições de Ensino, considerando a realidade de cada país e região.

Em uma análise da situação educacional brasileira é fundamental estabelecermos um ponto de partida em comum sobre a educação escolar antes de defendermos projetos e programas, tal qual referia o educador brasileiro Anísio Teixeira:

“Tratando-se de uma instituição que corporifica ideias e aspirações sociais, é imprescindível certa precisão em caracterizar tais conceitos e ideias, a fim de evitar inúteis e estéreis confusões, tão comuns em nossas controvérsias, nas quais diferenças de pontos de partida e diferenças de entendimentos impedem qualquer consenso sobre o problema da educação” (Teixeira, 1956, p. 4).

Tal precisão é ainda mais relevante num país como o Brasil que se caracteriza como um dos países mais desiguais do mundo, mesmo em pleno século XXI. É um país rico, com poucos bilionários e muitos pobres.

O caminho para a implementação de uma política educacional brasileira de alta qualidade é complexo. Entre as limitações, destaca-se a célebre frase tantas vezes proferida por Darcy Ribeiro: “A crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto”. Todavia, é preciso seguir em frente. A legislação brasileira tem sido uma importante base para a educação em tempo integral.

Para um estudante em tempo integral, a intersetorialidade na política e na ação objetiva, enquanto aposta, permite que a educação se expanda em tempo e espaço, e que educar assuma também o sentido de cuidar. Promover o cuidado integral como uma prática indissociável do ato de ensinar torna-se um desafio para o sistema educativo, para as escolas, para as gestões, para os professores e, igualmente, para as universidades na sua tarefa de formação do professor. Nessa perspectiva, o cuidado necessita ser definido como um trabalho cotidiano na produção de bens e serviços necessários à sustentação e à reprodução da vida humana, das sociedades e da economia, cuja finalidade é a justiça social e a garantia do bem-estar de todas as pessoas.

IHU – Qual a correlação entre a baixa nos índices de educação em nível nacional e a última grande reforma do ensino com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Novo Ensino Médio (NEM)?

Gabriel Grabowski – Acredito que ela contribuiu com uma condição da educação que já era ruim. Primeiro porque foi imposta pelo MEC, em um momento de crise política, econômica e social (alto desemprego e redução da massa salarial e renda da população). Foi pouco discutida com a sociedade e com a comunidade educacional e científica. Para piorar o contexto, foi implementada durante a pandemia e com a reforma do Novo Ensino Médio – NEM.

Foi um equívoco político, pedagógico, metodológico e no momento errado. Teve uma amplitude que exigia melhores condições das escolas e dos professores em um contexto de crise, ou seja, um cenário desfavorável para uma reforma educacional de forte natureza e interesse empresarial.

Os sistemas de ensino e as redes de ensino somente implementaram por imposição dos governos estaduais. Lembro que no período 2019-2022 o MEC não coordenou, não orientou e não deu apoio técnico-financeiro aos entes da federação brasileira que são os ofertantes da educação básica. Tal desorganização e imposição comprometeu o ideário da própria BNCC e das demais reformas, algumas, inclusive, necessárias.

IHU – Neste contexto, como mobilizar a sociedade para uma luta política efetiva em favor da valorização da carreira, melhores salários, melhor infraestrutura escolar (bibliotecas, laboratórios e espaços de convivência e aprendizagem)?

Gabriel Grabowski – A sociedade brasileira poucas vezes assumiu a defesa e a agenda da educação pública como direito de todos. O cenário político e a polarização produzida a partir de 2015 fragilizou os movimentos sociais, sindicais, entidades educacionais e, inclusive, os partidos da esquerda e centro esquerda.

O movimento sindical e as organizações dos professores foram fragilizados pela reforma sindical, dificultando e reduzindo a arrecadação financeira destas entidades.

Instaurou-se na última década um ambiente conservador, negacionista, antipopular e antissocial que jogou na defensiva os lutadores sociais. Desde o golpe de 2016, perpassando os governos Temer (2016-2019) e Bolsonaro (2019-2022) estamos vivenciando um retrocesso em toda agenda social, ambiental, científica e educacional.

É urgente que a sociedade reaja e todos os movimentos e organizações sociais e educacionais reajam. A falta de educação com qualidade, professores valorizados e estudantes com condições de aprender é mais uma das estratégias para manter dois terços da sociedade na pobreza e sem esperança de superarmos nossa desigualdade histórica e institucional.

IHU – Outro entrave importante é a garantia da aplicação do orçamento constitucional, mas que se vê, ano após ano, ameaçado por interesses partidários obscuros do Congresso. De que forma podemos atravessar esta encruzilhada?

Gabriel Grabowski – As fontes de Financiamento são essenciais a toda política pública, especialmente em um país com grande complexidade geográfica, política, social e econômica como o Brasil. A Educação, como toda política social, precisa de dinheiro suficiente e sem contingenciamentos. A estrutura da formação e da produção de conhecimento são operadas sistemática e continuamente por professores, pesquisadores, estudantes e profissionais da educação, em milhares de escolas espalhadas por todo o Brasil.

No século XX, o investimento em educação atravessou as décadas de 1930 até 1960 com percentuais sempre abaixo de 2% do PIB. Nesse período, as nações mais desenvolvidas já haviam resolvido questões de base da educação, como a redução do analfabetismo entre suas populações. No Brasil, apenas com a Constituição de 1967, emendada em 1969, é que se tornou obrigatório, para os municípios, investir um mínimo de 20% de suas receitas tributárias em educação. Posteriormente, em 1983, a Emenda Calmon ampliaria o investimento no setor educacional com a determinação de que a União também vinculasse 13% da receita, e estados, Distrito Federal e municípios investissem, pelo menos, 25% da renda com tributos no financiamento da educação básica. Com isso, o investimento nacional em educação alcançaria aproximadamente 3% do PIB em 1985.

Atualmente, o Brasil investe aproximadamente 5,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação, segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE. Esse percentual é acima da média de 4,4% dos países que compõem a organização. Porém, mesmo dedicando uma parcela considerada elevada do PIB com educação, a melhoria dos índices de escolaridade e formação profissional é um trabalho de longo prazo, mais ainda no Brasil que negligenciou o acesso ao ensino por séculos, que demanda investimentos elevados por muitas décadas. E, infelizmente, o Brasil acordou tarde para a educação.

Desde 2014 produziu-se e instalou-se no Brasil uma discussão pela redução dos investimentos, aliás, foi uma das causas para o afastamento da presidente Dilma reeleita em 2014. A maior evidência é que a partir desta data o Brasil não ampliou o financiamento como previa o PNE 2014-2024 (Meta 20: ampliar o investimento para 10% do PIB).

O que ocorreu foi justamente o contrário: reduziu-se o investimento e estagnou-se a expansão da educação básica e do ensino superior no Brasil. A maior evidencia é o descumprimento de 85% das Metas dos Planos de Educação, tanto a nível nacional, como estadual e, em boa parte, também no âmbito municipal.

IHU – Deseja acrescentar algo?

Gabriel Grabowski – Parabenizar o IHU pela persistência nas abordagens de temas tão relevantes para a conscientização da sociedade, pela defesa dos direitos humanos e pela liberdade de aprender e ensinar. Obrigado.

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