12 Dezembro 2025
Dez anos após a promulgação da Lei do Feminicídio, o Brasil registra um cenário alarmante: as mortes de mulheres motivadas por gênero cresceram 176%.
O artigo é de Reginete Bispo, deputada federal (PT-RS), publicado por Sul21, 11-12-2025.
Eis o artigo.
Dez anos após a promulgação da Lei do Feminicídio, o Brasil registra um cenário alarmante: as mortes de mulheres motivadas por gênero cresceram 176%. Nesse período, a maioria das vítimas eram mulheres negras: 68% dos casos. Diante desses números, torna-se impossível discutir direitos humanos e proteção às mulheres sem reconhecer que a combinação entre machismo e racismo cria um terreno fértil para a desumanização dessas vidas.
O feminicídio é, hoje, a expressão extrema da desigualdade de gênero. Porém, quando observado a partir do recorte racial, revela uma ferida ainda mais profunda: mulheres negras continuam sendo as maiores vítimas e, simultaneamente, as menos protegidas.
No Rio Grande do Sul, a situação é ainda mais grave. Somente neste ano, mais de 70 mulheres foram assassinadas, dez delas durante o feriado de Páscoa, representando um aumento de quase 40% em relação a 2024. Esses números expõem a falta de prioridade do Governo do Estado com a vida de mulheres e meninas. A reativação da Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, desmantelada em 2014 e reinstalada apenas neste ano, não é suficiente para garantir políticas efetivas. O orçamento destinado para a Secretaria é apenas 0,02% do total do Estado, cerca de R$ 18 milhões, valor incapaz de enfrentar a dimensão do problema.
Essa desproteção não é acidental: é estrutural. Poucas Delegacias Especializadas (apenas 22), políticas de proteção não chegam às periferias e servidores continuam sem formação adequada em perspectiva de gênero e antirracismo. O Estado que deveria assegurar dignidade e igualdade falha com aquelas que mais dependem dele.
É preciso afirmar, com toda certeza, que o feminicídio não é uma tragédia inevitável. É consequência de escolhas políticas. Enfrentar essa realidade exige mais do que reinstalar uma Secretaria: exige vontade política e orçamento. Exige reconhecer que violência doméstica não é um problema privado, mas uma questão pública e urgente. Exige políticas descentralizadas, acolhimento qualificado, campanhas permanentes e investimentos reais tanto em proteção quanto na autonomia econômica de mulheres negras. E exige, sobretudo, que a sociedade reconheça os fatores estruturais que moldam essas desigualdades e se comprometa com ações efetivas para transformá-las.
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