09 Setembro 2025
"Gaza lembra o Vietnã, e Israel vencerá no campo de batalha, mas será condenado por uma opinião pública que sempre lhe foi favorável no passado. Perderá a guerra apesar de sua superioridade militar, e sua derrota lançará as bases para uma tragédia ainda maior. Mas isso pertence ao futuro".
O artigo é de Giovanni De Luna, publicado por La Stampa, 08-09-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Giovanni De Luna é historiador italiano, professor emérito da Universidade de Turim.
Eis o artigo.
Vamos à guerra para matar e para sermos mortos. Em Gaza, como em todas as guerras, o mandamento religioso "não matarás" e o mandamento laico que define essa prática como crime são invertidos: quanto mais inimigos você mata, mais seu prestígio aumenta; quanto mais você viola esses mandamentos, mais respeito e consideração você ganha por seus atos. Certamente, em Gaza está sendo travada uma típica guerra assimétrica: de um lado, um Estado-nação poderoso, aguerrido, que escolheu sobreviver fortalecendo seu aparato militar, que fanatizou seus soldados elogiando sua impiedosa eficiência e está ensinando ao mundo o que significa combater por um propósito que não tem apenas um valor geopolítico; de outro, uma Palestina que não é um Estado-nação (e talvez deseje sê-lo) e, sobretudo, um povo inteiro, esfarrapado, faminto, que também lutou na esperança de sobreviver, combatendo com pedras, nas Intifadas passadas, contra tanques, usando até mesmo para suas empreitadas mais nefastas (como a de 7 de outubro) armas improvisadas, asas-deltas e motocicletas, parte de um cotidiano impregnado de pobreza, recorrendo frequentemente ao desespero dos homens-bomba que transformavam seus corpos em um instrumento de morte contra o inimigo e contra si mesmos.
Certamente, o horror de Gaza encontra paralelos em outros conflitos armados e pode ser incluído em uma das muitas definições que cientistas políticos e estrategistas militares usaram para conceituar o "Mal" da guerra. A guerra assimétrica é uma delas. Desse ponto de vista, não há nada de novo. Os massacres de civis são uma constante nas guerras do século XX e pós-XX às quais já estamos acostumados. A única mudança em relação ao passado parece ser a ausência de qualquer perspectiva de paz; no passado, ambos os lados, que se desafiavam em um conflito bélico, tinham claro que o resultado final seria uma "mesa" em torno da qual vencedores e vencidos se sentariam para negociar algum tipo de tratado. Quanto maior o conflito, maior a parcela do mundo envolvida e mais amplas seriam as bases do sistema político internacional que desses tratados teria nascido. Foi assim em 1815, após o Congresso de Viena e a devastação das Guerras Napoleônicas na Europa; foi assim em 1946, após a tragédia da Segunda Guerra Mundial e o nascimento da ONU.
Agora, não é mais assim, e a guerra se tornou uma realidade endêmica com a qual temos que conviver, com focos de guerras irrompendo em todos os continentes, sem solução de continuidade, sem nenhuma perspectiva de paz no horizonte. E, além disso, há a outra novidade que diz respeito às guerras da contemporaneidade. Refere-se à guerra do Vietnã.
Cinquenta anos atrás, a derrota dos Estados Unidos nas selvas do Sudeste Asiático não foi sancionada no terreno do confronto militar. Naquela época, os Estados Unidos eram a potência mais forte e dominavam o planeta do alto de uma superioridade esmagadora de seus exércitos e sua disponibilidade de armas atômicas. A URSS era o único outro Estado que podia opor-se a ela em igualdade de condições, mas que, no final, provou ser nada mais do que um blefe de propaganda. Mas, mesmo assim, os EUA perderam aquela guerra porque subestimaram um fator: as emoções de um mundo globalizado que reagia diante dos "eventos globais" (Dayan e Katz) com base em um esquema muito antigo, mas adaptado à modernidade tecnológica da guerra: ficava-se do lado de Davi contra Golias, assim como ficava-se do lado dos pequenos vietcongues, com seus pijamas pretos, contra os grandes e corpulentos fuzileiros navais que ostentavam seus uniformes e seus armamentos.
Esses eram os primórdios de um paradigma vitimário que persistiria até hoje, até os massacres e as deportações de Gaza, segundo o qual a vítima é quem sofre mais, ou pelo menos grita mais alto seu sofrimento, e é preciso estar emocionalmente do seu lado. Na época, o mundo se posicionou do lado dos vietcongues e venceu. Antes que os governos e a política, quem se mobilizou foram as consciências de homens e mulheres que souberam se unir, criando um movimento global que, no fim, esmagou até mesmo a superioridade militar dos EUA.
Foi a descoberta da importância de "cavar no próprio quintal", foi a mensagem que vinha das guerrilhas sul-americanas (criar "um, dois, três Vietnãs") e não era necessário ir lutar ao lado do Vietcongues: como os operários em Mirafiori gritavam: "Agnelli, a Indochina está na tua oficina". Mais de 100 fotógrafos e cinegrafistas morreram naquela guerra; um número que testemunha a ânsia de documentar de perto e sem restrições o que acontecia no campo. Mais importante do que o uso do gás ou dos desfolhantes foi a indignação despertada por fotos como a do general sul-vietnamita executando um vietcongue e da menininha correndo nua, deixando para trás sua aldeia incendiada pelo napalm: foi a comoção daquelas imagens que decidiu quem havia vencido e quem havia perdido naquela guerra.
Sim, é verdade: do massacre dos fotojornalistas às inocências violadas, Gaza lembra o Vietnã, e Israel vencerá no campo de batalha, mas será condenado por uma opinião pública que sempre lhe foi favorável no passado. Perderá a guerra apesar de sua superioridade militar, e sua derrota lançará as bases para uma tragédia ainda maior. Mas isso pertence ao futuro.
O presente, no entanto, nos diz que é justamente com gestos simbólicos (Muhammad Ali (Cassius Clay), que foi destituído do título mundial dos pesos pesados após se recusar a lutar no Vietnã (que se pode fazer a diferença em Gaza, colocando-se do lado das vítimas e deixando aos governos e aos Estados) especialmente aqueles europeus — os silêncios, os oportunismos, a preocupação pelos interesses geopolíticos e melindres diplomáticos
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