25 Março 2025
“O Papa está dando ao mundo uma lição, discreta, mas muito forte, sobre o que é liderança, autoridade verdadeira, aquela que infelizmente está faltando em nosso tempo...”. O cardeal Michael Czerny, 78 anos, canadense de origem tcheca - seus pais se mudaram de Brno para Montreal quando ele tinha dois anos de idade - é o prefeito do dicastério para o Serviço de Desenvolvimento Humano Integral, o “ministério” do Vaticano que ajuda a Igreja a cuidar dos últimos: migrantes, necessitados, doentes, excluídos, presos, desempregados e vítimas de guerras, desastres naturais, escravidão e tortura.
A entrevista é de Gian Guido Vecchi, publicada por Corriere della Sera, 24-03-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Jesuíta como Francisco, ele colocou em seu brasão episcopal um barco cheio de pessoas, como as que naufragaram no Mediterrâneo.
E o que diz essa lição, Eminência?
Que a verdadeira liderança não é ter muito poder e fazer muitas coisas, mas possuir uma força espiritual e humana ampla e profunda, a serviço do bem comum. Francisco foi capaz de demonstrá-la mesmo e sobretudo nos momentos mais difíceis, mesmo nestas semanas de hospitalização no Gemelli. Ele é como uma estrela brilhante no céu escuro que temos: a verdadeira força é a força moral, plenamente humana. Essa é uma palavra muito verdadeira, mas difícil de ser compreendida pelos poderosos da Terra. Por isso, vemos esses shows de poder que são destrutivos, exatamente o oposto da força espiritual, a autoridade que constrói.
O que pensou quando viu o Papa na sacada novamente?
O que mais me impressionou foi o fato de que nada mudou. É claro que ele ainda está um pouco fraco, mas ainda é ele. Com suas palavras, seus gestos, todas as dimensões de sua presença e de sua graça. A parada em Santa Maria Maior diz tudo.
Por quê?
Porque nessa basílica ele sempre foi, depois de cada viagem, para agradecer a Nossa Senhora antes de voltar para casa. Isso significa que, afinal, não foi algo diferente. Francisco fez uma viagem em meio à doença, voltou são e salvo e agradeceu a Nossa Senhora por tê-lo acompanhado.
Ele não se poupa. No início de seu pontificado, falando a seus coirmãos, Francisco explicou que os jesuítas são “descentralizados” porque “ter diante o ‘Cristo sempre maior’, o ‘Deus semper maior’, nos leva continuamente para fora de nós mesmos, a ‘sair de nosso próprio amor, vontade e interesse’”.
Isso é verdade?
É justamente isso. Temos uma palavra que resume tudo isso, que é magis, 'mais'. Significa fazer e dar mais, sempre mais, até o fim. Isso é o que Francisco também demonstrou no hospital, lutando todos os dias, e continuará a fazer durante sua convalescença. Nosso Papa não muda.
Nas Constituições, no entanto, Inácio de Loyola recomenda obedecer aos médicos... Francisco será capaz de ouvi-los quando eles lhe dizem para se cuidar?
Não será fácil, mas ele conseguirá. Digamos que sempre haverá uma dialética entre as duas coisas....
Os médicos explicaram que ele quase morreu duas vezes. No entanto, ele não perdeu o bom humor. Como se explica essa serenidade?
Esse é o segredo. É inevitável ter medo, sentir-se em perigo, ser fraco: somos seres humanos. A questão é não ser controlados pelo medo, pela fraqueza, pela doença. Todos nós na vida enfrentamos limitações e não podemos superar todas elas. O que podemos fazer, no entanto, é lutar interiormente para não sermos controlados por elas. Essa é uma parte muito importante da espiritualidade de Inácio: somos condicionados por nossos medos e fraquezas, mas não somos controlados.
Ele não teve medo de mostrar sua fragilidade...
Há uma expressão clássica de São Paulo: em minha fraqueza, ele diz, sou forte. É outra maneira de falar do sentido de liderança. Não é uma questão de energia, riqueza ou poder. Em vez disso, é a capacidade de ser forte mesmo na fraqueza e, assim, cheio da graça de Deus.
As discussões e especulações sobre a renúncia voltarão. O que pensa?
Isso continuará até o fim, mas de forma responsável.