18 Março 2025
A agricultura gaúcha tenta se reerguer após os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas que atingem o estado desde setembro de 2023. Se as tempestades históricas de maio de 2024 causaram danos que só serão recuperadas em décadas, a falta de chuvas e as ondas de calor que castigaram o sul do país em janeiro e fevereiro já comprometem a safra gaúcha de grãos deste ano. No fim, a dor é no bolso de toda a população brasileira, uma vez que os preços dos alimentos continuam pressionados por causa da crise climática.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 17-03-2025.
Segundo um estudo do professor de agronomia Gustavo Brunetto, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), a Serra Gaúcha perdeu mais de 85% do estoque de carbono no solo de pomares da região por causa das enchentes de maio passado, informam Agência Brasil, Um só planeta e O Sul. A reposição desse nutriente pode demorar de 14 a 40 anos, mostra a pesquisa.
As cidades da Serra Gaúcha ficaram entre as mais afetadas pela tragédia climática de maio do ano passado. Brunetto explicou que as inundações vão dificultar o trabalho do produtor rural da região. Primeiro pela perda de solo, especialmente da camada superficial. “Por isso tivemos perda de nutrientes que normalmente estão no solo e que são fontes para as plantas, para que elas consigam crescer, produzir e ter um produto de qualidade”, detalhou.
Além disso, parte da matéria orgânica e dos nutrientes foram para partes baixas do relevo e também em águas superficiais. “Isso poderá contaminar a água. Esse dano ocorreu em virtude do excesso de precipitação. Tivemos perda de solo em áreas não cultivadas e também em áreas cultivadas”.
Na cidade de Bento Gonçalves, por exemplo, ainda houve a diminuição dos teores de fósforo. “Se as áreas degradadas pelo excesso de chuva forem incorporadas novamente à agricultura, o produtor vai ter que comprar mais fertilizante. Com isso ele vai ter um aumento do seu custo”, disse.
Mas não são só as chuvas que causam dor de cabeça aos produtores gaúchos. O Brasil deve ter uma safra recorde de grãos neste ano, mas os números já começam a ser revistos para baixo por problemas climáticos no Rio Grande do Sul, relatam Globo Rural, Correio do Povo e Agrolink.
“A safra brasileira continua com grande potencial. No Rio Grande do Sul, houve um ajuste significativo, com perdas expressivas estimadas em cerca de 34%, devido à estiagem e ao calor excessivo, especialmente em fevereiro”, explicou o analista e consultor da Safras & Mercado, Rafael Silveira.
A EMATER/RS-ASCAR divulgou na 5ª feira (13/3) que mesmo com chuvas registradas nos últimos 10 dias, regiões gaúchas como o Nordeste e o Planalto Médio seguiam com estresse hídrico e térmico. O Informativo Conjuntural da EMATER indicou que a colheita do grão seguia em ritmo lento, por volta dos 5% da área semeada, superior a 6,7 milhões de hectares no estado – menor que a expectativa inicial, de 8 milhões de hectares.
A pecuária ocupa 64% das terras destinadas a atividades agrárias, uma área em torno de 2,8 milhões de km2, quase duas vezes o tamanho do estado do Amazonas. No entanto, a atividade gerou em 2023 apenas 17% do valor bruto do setor, o que comprova a baixa produtividade do segmento. É o que mostra um estudo liderado por Paulo Barreto, pesquisador sênior do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON), ao qual a DW teve acesso. “A ineficiência é ainda uma marca da pecuária brasileira. Se fosse preciso fazer só uma coisa para aumentar a produtividade seria combater o desmatamento. As outras aconteceriam por consequência. Os incentivos para adotar tecnologia para melhorar pasto, sozinhos, não funcionam", comenta Barreto com base nos dados da pesquisa.