19 Dezembro 2024
Artigo do cardeal italiano Gianfranco Ravasi, em artigo publicado em Il Sole 24 Ore, 15-12-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Tenha como regra na vida nunca se arrepender e nunca olhar para trás. Ter arrependimentos é um terrível desperdício de energias, você nada pode construir sobre essas bases, só serve para chafurdar neles.
“A mulher de Ló olhou para trás e se tornou uma estátua de sal”. Essa é uma imagem bíblica poderosa, extraída do capítulo 19 do livro de Gênesis: enquanto uma chuva de enxofre e fogo cai sobre Sodoma e Gomorra, sinal do julgamento divino, essa mulher se demora para lançar um último olhar para a sua casa, já envolta por faíscas e chamas. Ainda hoje, os turistas que passam pela costa litorânea ocidental do Mar Morto se deparam com uma elevação isolada, que a lenda identificou como a esposa de Ló transformada em uma estátua de sal.
Acima, recortamos um parágrafo de uma carta de Katherine Mansfield, escritora inglesa, nascida na Nova Zelândia em 1888, viajante (faleceria na França em 1923), requintada autora de contos que costumam apresentar figuras femininas delicadas. Suas palavras atingem um defeito de muitos: viver sempre com a cabeça voltada para o passado, nostálgicos e melancólicos, sempre prontos a detestar as necessidades do presente e, no final, inertes em sua sutil autocomplacência na qual “chafurdam”. É claro que a “busca pelo tempo perdido” pode criar obras-primas, como aconteceu com Proust, mas também pode ser apenas um estéril e desconsolado arrependimento. É uma paixão que se agarra ao coração e impede que se descubra que em cada amanhecer que desponta sempre há uma nova luz.