02 Julho 2024
Um tribunal civil belga condenou o arcebispo emérito e o atual arcebispo da arquidiocese de Malinas-Bruxelas a pagar uma indemnização de 1.500 euros a uma mulher leiga, depois de ambos lhe terem negado a possibilidade de se inscrever num programa de formação para o diaconato.
A reportagem é de Clara Raimundo, publicada por 7Margens, 28-06-2024.
Veer Dusauchoit, de 62 anos, residente em Herent, na província belga de Brabante Flamengo, é um membro ativo na sua paróquia – a qual se encontra atualmente sem pároco – e integra a equipe de leigos que organiza celebrações da Palavra, funerais e outras atividades paroquiais, uma situação cada vez mais comum na Igreja Católica na Bélgica, devido ao declínio do clero.
A leiga tentou inscrever-se na formação de diáconos pela primeira vez em junho de 2023, altura em que o ex-arcebispo Josef De Kesel recusou o seu pedido, justificando a decisão com o fato de ela ser mulher e de as mulheres não poderem ser ordenadas como diáconos dentro da Igreja Católica. Dusauchoit fez o pedido novamente em outubro, após a ordenação do novo arcebispo, Luc Terlinden, mas obteve a mesma resposta, relata o jornal belga De Morgen.
Embora “tanto o arcebispo De Kesel como Terlinden afirmem publicamente ser a favor da admissão de mulheres à formação de diáconos e ao ministério de diáconos… na sua resposta ao meu pedido não encontramos nada desta atitude voluntária”, lamenta Dusauchoit, citada pelo jornal católico The Pillar.
Dusauchoit recorda ainda que, na década de 1970, as esposas dos candidatos a diácono eram obrigadas a participar na formação para diáconos juntamente com os seus maridos, mesmo quando não tinham a intenção de serem, elas próprias, ordenadas. “O fato de elas não poderem ser ordenadas como diáconos não era, de forma alguma, obstáculo para fazerem essa formação”, acrescenta.
Isto mesmo terá explicado Veer Dusauchoit quando se dirigiu ao tribunal de Mechelen e exigiu a anulação da recusa de inscrição na formação, alegando que a atitude dos bispos se baseou na lei eclesial e que esta é contrária à constituição, a qual consagra a igualdade entre homens e mulheres.
O tribunal reconheceu que houve uma atitude discriminatória da parte dos prelados católicos e condenou-os a pagar à mulher 1.500 euros de indenização. “O tribunal considera que os arcebispos cometeram um erro ao avaliar a candidatura”, diz Luc De Cleir, assessor de imprensa do tribunal em Mechelen, citado pelo De Morgen. “Trata-se apenas da admissão a um curso de formação, não da questão da nomeação efetiva como diácono”.
Contudo, o tribunal não pode anular a recusa do arcebispo ou decidir no seu lugar quem será admitido à formação de diáconos, salvaguarda De Cleir. E acrescenta: “O tribunal não tem jurisdição sobre isso. Isso seria contrário à liberdade religiosa. Os arcebispos devem poder decidir por si próprios quem é o candidato adequado para a formação”.
Na sequência da decisão, os advogados de Dusauchoit destacaram: “Pela primeira vez na história, bispos belgas são condenados por um tribunal por discriminação de gênero”. E, referindo-se à sessão do Sínodo agendada para o mês de outubro, acrescentaram: “A Sra. Dusauchoit está satisfeita com o fato de o tribunal ter concluído que ocorreu discriminação. Ela espera que esta decisão possa ajudar a garantir que as mulheres serão autorizadas a frequentar a formação de diáconos no futuro. Esta questão está na agenda do Sínodo dos Bispos neste outono”.
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Tribunal condena prelados belgas por negarem admissão de mulher leiga a formação para o diaconato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU