13 Março 2024
"Uma Igreja dentro da qual se trava uma guerra pelos ritos da missa com uma epifania de maldade e violência, com uma nebulosa neotridentina que ataca de modo indecente o Papa nas redes sociais, e uma Igreja que parece incapaz de manifestar a diferença cristã e anunciar a boa nova da vitória de Cristo sobre a morte. Isso leva muitos a abandoná-la porque não encontram mais nela nem o fermento do Reino de Deus nem o sal da sabedoria", escreve o monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por Repubblica, 11-03-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Sou um monge idoso que desconfia das pesquisas, dos percentuais de fracasso e de sucesso, mas continuo atento a comparar os dados provenientes das investigações com as minhas experiências diretas, que vivo com atenção e nos quais, consequentemente, fico pensando. Nesta época, em que voltou com truculência a barbárie, especialmente na política e na vida da sociedade, sou tomado pela tristeza causada pela inadequação da Igreja, ou melhor dos cristãos, de sua capacidade de reagir.
E devo constatar que a crise também passa pela Igreja e se manifesta como uma diminuição: uma Igreja cada vez mais reduzida a diáspora e a pequenas comunidades que devem decidir se querem ser significativas num mundo de indiferença, se tornam realidades desgastadas até desaparecerem, ou ainda permanecem como meras manifestações tradicionais, folclóricas, chamadas por alguns de “religião popular”.
Um dos objetivos da recente pesquisa conduzida pelo Demos, que Ilvo Diamanti relatou nestas colunas no sábado, 9 de março, era focalizar as paixões dos italianos. Dos dados coletados verifica-se que em relação a 2016, portanto em oito anos, ocorreram algumas mudanças significativas, entre as quais se regista uma forte queda no interesse pelo fenômeno religioso: de 72 para 60 pontos em 100. Deve se destacar que a realidade religiosa é a única “paixão dos italianos” a perder valor, enquanto continuam subindo o time de futebol e até o partido político. A aceleração do fenômeno nas últimas duas décadas não pode deixar de suscitar uma certa ansiedade nos crentes e suscitar perguntas que exigem uma resposta dos bispos, dos sacerdotes e também do povo chamado “povo de Deus”.
De qualquer forma, continua a ser verdade que a Igreja não tem mais uma capacidade de atrair. Somente o Papa Francisco tem uma voz, mas os próprios bispos parecem áfonos e nenhum deles, pelo menos na Itália, adquiriu nas últimas duas décadas a autoridade de cardeais como Pellegrino, Martini, Ursi, Siri, Pappalardo: uma única voz e as outras apagadas, ou pelo menos não ouvidas.
O Papa com o seu carisma e a sua profecia alcança muitos, mas para a pertença eclesial é necessária uma palavra na Igreja local. Se não voltarmos a uma comunidade local onde se escuta a Palavra e nos tornamos um só corpo na Eucaristia, o desgaste continuará. Uma Igreja com uma “missa desbotada”, diz o conceituado sociólogo católico Diotallevi, uma “missa que acabou” e uma comunidade que o é apenas no nome, mas que não conhece a sua essência, que é a fraternidade, não pode atravessar a atual mudança de época.
Uma Igreja dentro da qual se trava uma guerra pelos ritos da missa com uma epifania de maldade e violência, com uma nebulosa neotridentina que ataca de modo indecente o Papa nas redes sociais, e uma Igreja que parece incapaz de manifestar a diferença cristã e anunciar a boa nova da vitória de Cristo sobre a morte. Isso leva muitos a abandoná-la porque não encontram mais nela nem o fermento do Reino de Deus nem o sal da sabedoria.
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A missa acabou. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU