05 Outubro 2023
Às vésperas de um Sínodo que promete ser explosivo, o Papa desferiu um golpe à frente conservadora que contém três mensagens. Francisco deixou claro, preto no branco, que a sua decisão de readmitir as pessoas divorciadas e recasadas à Eucaristia é uma doutrina que não admite desobediência.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 04-10-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Bergoglio tinha tomado essa decisão em 2016, mas muitos bispos nunca a implementaram.
Na época também houve um sínodo com discussões muito acaloradas e no final o Papa escreveu uma exortação apostólica, Amoris laetitia, que continha uma virada. Tanto para João Paulo II como para Bento XVI, quando dois fiéis se casam após a um divórcio, só podem comungar se viverem “como irmão e irmã”. Em suma, nada de sexo, porque o casamento anterior, que fracassou humanamente, diante de Deus ainda é válido. Francisco escreveu que a continência continua a ser o ideal, sim, mas “em determinados casos”, e depois de um “adequado discernimento” com um padre espiritual, os novos cônjuges podem retornar à comunhão, que “não é um prêmio para os perfeitos, mas um remédio generoso e um alimento para os fracos". Uma decisão que incendiou os conservadores, que viram nisso um atalho para o relativismo.
Quatro cardeais tradicionalistas questionaram duramente o Papa com uma lista de dúvidas (em latim, obviamente, dubia) às quais Francisco nunca respondeu. Agora Bergoglio mudou de estratégia e aproveitou as novas dubia, enviadas a Roma por outro cardeal, o arcebispo emérito de Praga Dominik Duka, para que lhe respondesse o novo prefeito da Doutrina da Fé, o teólogo argentino Victor Manuel Fernández. Que, num documento assinado nos últimos dias por Francisco, esclareceu, de uma vez por todas, que a Amoris laetitia é “um documento do magistério pontifício ordinário, ao qual todos são chamados a prestar o obséquio da inteligência e da vontade”. Dessa forma o Papa obteve um triplo resultado: mostrou que não se esquiva dos cardeais duvidosos, esclareceu que quando decide não exprime opiniões pessoais e selou o método do Sínodo: aquele do passado e aquele que inicia hoje na Praça de São Pedro.
Uma assembleia que já começa superaquecida. À pouca distância da colunata de Bernini, ontem, no teatro Ghione, os cardeais Raymond Burke e Robert Sarah protagonizaram uma nova rebelião contra o Papa. Burke, estadunidense, estava entre os "duvidosos" do passado, e nas últimas semanas voltou a expressar dúvidas sobre o Sínodo, “uma caixa de Pandora”. No encontro de ontem, intitulado “A Babel Sinodal”, ele não atacou diretamente Francisco, mas sim o Cardeal Fernández. Rejeitou a acusação de “heresia” e de “cisma”, denunciou “os graves erros que vêm de dentro da própria Igreja”, aqueceu a audiência de 160 apoiadores quando trovejou: “As portas do inferno não prevalecerão contra o Igreja".
Tons inflamados. Diferentes daqueles de Francisco, que nos últimos dias respondeu aos duvidosos cardeais com uma pitada de humor: “Com essas perguntas vocês manifestam a sua necessidade de participar, de expressar livremente a sua opinião e de colaborar, pedindo uma forma de ‘sinodalidade’ no 'exercício do meu ministério’”. Para os conservadores uma afronta, para Bergoglio um elogio.
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O Papa aos conservadores: “Deve ser dada a comunhão aos divorciados recasados” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU