28 Agosto 2023
A presidente da Hungria, Katalin Novak, chegou diretamente de Kiev, onde, dois dias atrás, encontrou Zelensky, rezou em frente ao memorial das vítimas de Bucha e também experimentou a necessidade de se refugiar rapidamente em um abrigo antiaéreo depois que os alarmes soaram para os iminentes bombardeios. Ela estava em Roma ontem na sexta-feira pela manhã (25), por algumas horas, para dois compromissos, o primeiro com o Papa Francisco, com quem construiu um relacionamento próximo ao longo desses anos, e o outro com "a " (nós continuaremos amigas mesmo quando formos avós) (a entrevistada se refere à Primeira Ministra italiana, Giorgia Meloni - nota do IHU).
No centro dessa triangulação diplomática está a guerra na Ucrânia com seus últimos desenvolvimentos. A morte de Prigozhin, o peso da China na nova ordem mundial, o papel da Europa e, naturalmente, a próxima missão do Cardeal Zuppi em Pequim. Il Messaggero entrevistou Novak antes de seu retorno ao país natal.
A entrevista é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 26-08-2023.
Presidente, você vê espaço para a paz?
Em Kiev, tive uma conversa longa e direta com Zelensky e acredito que seja hora de discutir como estruturar a paz. Estou totalmente de acordo com o Papa Francisco, embora não esteja em posição de fazer um anúncio público sobre a existência de um plano de paz concreto. Continuo convencida de que agora estamos mais próximos de avançar com um projeto; tínhamos discutido isso com o Pontífice durante sua última viagem a Budapeste, quatro meses atrás, mas não posso dizer mais do que isso.
Com a morte de Prigozhin, você acha que o governo de Putin será mais forte ou mais fraco, e talvez possa acelerar o cessar-fogo?
Muitos tendem a ver a situação na Rússia de forma mais simples do que ela realmente é, e talvez seja uma projeção relacionada à esperança, como quando se projeta algo que se deseja. Por isso, não considero a morte de Prigozhin como um enfraquecimento do Presidente Putin. Atualmente, não penso que devamos mudar nossa visão sobre a firme condenação à agressão russa na Ucrânia."
O que você acha que acontecerá na Rússia daqui para frente?
Infelizmente, temo que Moscou esteja interessada em uma guerra prolongada. No entanto, devemos procurar os sinais que nos indiquem que a Rússia está pronta para negociações de paz."
E esses sinais existem?
Como eu disse, estamos procurando por eles."
Com a morte do fundador do grupo Wagner, é possível que haja um aumento nos fluxos migratórios direcionados à Europa?
Até agora, prestamos pouca atenção aos conflitos na África, pois estávamos concentrados nos conflitos no coração da Europa. Os conflitos africanos destacaram o papel de vários elementos estrangeiros, como o Wagner. Portanto, acredito que esse fenômeno não vai acabar de uma hora para outra. A migração da África já aumentou e se olharmos para os dados migratórios, temos respostas claras. Na Itália, há um crescimento bastante intenso. Estou ao lado de Giorgia no sentido de que precisamos trabalhar juntos para conter essa desestabilização na África. O Papa Francisco também tem essa percepção muito clara, e estamos de acordo.
O Papa Francisco está buscando a todo custo um espaço diplomático para facilitar um clima entre as partes, a fim de permitir o cessar-fogo e a retomada das negociações. Ele enviou o Cardeal Zuppi a Kiev, Moscou e Washington e agora está aguardando para viajar a Pequim. Isso poderia funcionar?
Deve funcionar! Deve! Sou uma pessoa de fé e confio na força que o Papa recebe de Deus para agir pelo bem comum. Ele quer se comunicar com todos, e tenho certeza deste caminho, e realmente espero que chegue logo o momento em que ele desempenhará um papel-chave nas negociações de paz. Continuo confiante de que haverá uma mudança em breve. Já é importante que Zuppi tenha conversado com figuras-chave e agora fará o mesmo na China. Um sinal substancial. Conversamos sobre isso juntas, mas não posso dizer mais.
Francesco na Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, fez um apelo à Europa para que tenha "a coragem de acender luzes de esperança e apagar focos", e também disse que faltam "rotas corajosas de paz". Ele estava se referindo a alguém em particular?
Ele estava falando de forma geral sobre a necessidade de coragem para a paz, muita coragem, e que, no momento, são poucos aqueles que concretamente seguiram esse caminho, sem o qual pouco se pode fazer. Portanto, seria necessário um passo para deter o estrondo das armas. A paz justa só pode ser delineada na mesa de negociações. Neste momento, é natural que a Ucrânia se defenda, pois precisa proteger sua pátria, e é importante que ela seja ajudada por todos nós. Neste momento, é necessário ser prudente e condenar todos os ataques que sofre.
O Cardeal Zuppi está tentando repatriar os vinte mil crianças ucranianas deportadas pelos russos. Em que ponto você acha que está essa possibilidade?
Na Ucrânia, também lidei com esse aspecto. Sou mãe de três filhos e posso apenas imaginar o que essas crianças estão passando. Elas perderam a infância e também podem perder o futuro. Para encontrar uma solução para as crianças deportadas, precisamos dos russos, de um mediador e da vontade política da Rússia. Zuppi está trabalhando nisso."
Com o Papa, vocês também discutiram as mudanças climáticas?
Ele me disse que está trabalhando na redação de uma nova encíclica, que é uma revisão da 'Laudato Si' e será publicada em 4 de outubro. A primeira encíclica foi promulgada em 2015, e desde então muitas coisas mudaram um pouco. Ele me disse que havia a necessidade de atualizá-la. Além das questões já abordadas, haverá outras, novas, mas não entramos muito em detalhes.
Você conhece bem Giorgia Meloni, a amizade de vocês vai além da política, como vocês se conheceram?
Aconteceu há muitos anos, ela era líder de um partido que tinha apenas 4% de apoio, eu era Secretária de Estado de um país menos importante do que a Itália, e nos encontramos. Eu sei que seremos amigas mesmo quando formos avós.
Ambas conseguiram construir um bom relacionamento pessoal com o Pontífice: como isso se traduz na construção da paz nessa triangulação diplomática?
Nós conversamos várias vezes com o Pontífice sobre liderança feminina, e eu acredito que as mulheres podem oferecer uma contribuição imensa em situações de conflito, porque captam oportunidades antes. É uma questão de empatia inata e talvez também porque, por natureza, têm um instinto materno. Ao trazer filhos ao mundo e dar vida, elas não buscam conflitos, mas sim resolvê-los. Talvez isso determine nossas ações.
Como você avalia o trabalho da sua amiga Giorgia?
Ela herdou uma situação difícil. Em minha opinião, ela está fazendo um bom trabalho, é sábia, sincera, ama o seu povo. Ela toma decisões com espírito de serviço. Não contradiz o que faz e o que diz, e estou confiante de que a Itália terá estabilidade com ela.
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“Putin agora se sente mais forte e se concentra numa guerra longa”. Entrevista com Katalin Novak, presidente da Hungria - Instituto Humanitas Unisinos - IHU