29 Mai 2023
Um filme recente, Close, (2022), dirigido por Lukas Dhont, reascende um tema que sempre provoca alguma tensão e gera visões preconceituosas: a amizade masculina, mas sobretudo por suas manifestações de afeto. A história se situa nas características de um relacionamento entre dois meninos pré-adolescentes. Qual é o limite permitido dessas expressões afetivas?
A reportagem é de Eduardo Maróstica, publicada por Página/12, 26-05-2023. A tradução é do Cepat.
O preconceito sobre esses vínculos tem conotações sexistas, pois há uma espécie de tipificação entre o que é uma manifestação afetiva de um homem para com outro dentro dos significados de uma amizade ou de outra coisa. E essa “outra coisa” está relacionada com a sua orientação sexual que, embora já não tenha as punições morais de trinta anos atrás, persiste como a fuligem em suspensão depois de um incêndio.
Qual é esse limite? Ainda encontro pessoas que ficam chocadas ao verem um homem chorando, como se o choro masculino tivesse uma sensibilidade extra. Como que se um homem quebrasse por causa de suas lágrimas é porque “sua angústia é demais”. Como se uma represa transbordasse devido ao acúmulo de água. E muitas vezes esses choros reafirmam intermináveis ciclos de violência, “porque ele me pediu chorando”.
Também não estou dizendo que os homens têm lágrimas de crocodilo, mas que há algo que se acentua no choro de um homem e que se especula entre as hipóteses de gênero que se tecem quando se trata de reconhecer um homem sensibilizado. Algo de sua masculinidade está em jogo nessa ação.
Como quando se diz a uma criança para que “não seja marica” quando choraminga porque algo dói, ou como neste caso de dois meninos, que têm demonstrações de carinho um pelo outro. Talvez esse comportamento seja “tolerado” durante a infância, mas durante a puberdade e a adolescência os mandatos machistas que foram mantidos em estado latente serão ativados, para que os dois “se distanciem”, tanto afetiva como fisicamente.
O preconceito de gênero, chamado sexismo, classifica constrangendo quase de modo silogístico as formas de se relacionar. Por exemplo, entre duas pessoas que demonstram carinho: espera-se delas que demonstrem esse tipo de manifestação de afeto? E refinando o foco na pergunta: quais seriam os pares onde essas manifestações são mais aceitas? Homem-mulher? Mulher-mulher? Homem-homem?
O que implica uma amizade excessivamente expressiva entre dois homens que faz com que se ativem os mecanismos sociais de disciplinamento? E esse disciplinamento, que é sempre uma ordem social, opera sob a teoria de um estereótipo heteronormativo. Então, quais são os comportamentos aceitáveis para essa norma cultural? É a evidência de uma possível homossexualidade que ativa os alarmes sexistas?
Essas expectativas comportamentais pensadas a partir da ordem binária, geram visualizações e zonas escuras onde certos gestos amorosos passam despercebidos, ao passo que outros não. E no caso do par homem-homem, podemos reconhecer que a amorosidade é vista com uma desconfiança marcada pela heteronormatividade, reconhecendo como uma extravagância qualquer demonstração de afeto entre homens a partir de certa idade, apontando com o dedo, mas também introjetando esses mandatos de maneira autodisciplinadora, como no caso de um dos protagonistas, e tomar distância tanto física como sentimental, mutilando sua capacidade de expressar sua afetividade.
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O afeto entre homens sob a lupa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU