“O Estado sozinho não é suficiente”. Entrevista com Stephano Zamagni

Foto: Agência Senado/Edilson Rodrigues

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18 Março 2020

Zamagni: vamos impedir que tudo desmorone nos ombros dos que estão na linha de frente, o terceiro setor deve ser envolvido. Está em crise mito da invulnerabilidade. Agora devem ser protegidas as relações sociais, depois se pensará em reconstruir.

Não mantenham o terceiro setor à margem da emergência. Utilizem a experiência de milhares de voluntários ativos em hospitais e no campo da saúde, valorizem com todas as precauções necessárias, o conhecimento de muitas pessoas que, a partir do mundo das associações envolvidas no serviço aos doentes, estão dispostas a ajudar. "Está em jogo um patrimônio de relações, que é fundamento da coesão nacional", explica o economista Stefano Zamagni, voz histórica da economia civil e do non profit.

“Depois de cumprir as ordens dadas pelas autoridades, agora é necessário envolver os órgãos intermediários. Dirijo-me diretamente ao governo: o Estado não pode fazer tudo sozinho, as regiões vacilam sob o peso do contágio. Vamos impedir que tudo desmorone nos ombros dos que estão na linha de frente”, explica o professor, que desde 27 de março de 2019 é presidente da Pontifícia Academia de Ciências Sociais, nomeado pelo Papa Francisco.

A entrevista é editada por Diego Motta, publicada por Avvenire, 17-03-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

Enquanto isso, os apelos e mobilizações pela solidariedade estão se multiplicando nos últimos dias. Isso não é suficiente?

A fotografia da enfermeira que adormeceu entre uma internação e outra é emblemática da situação. Os apelos são bons, mas eu não gostaria que subestimássemos as implicações de natureza social e espiritual que teremos que enfrentar quando tudo isso acabar. As notáveis energias da sociedade civil são conhecidas por todos e podem contar com séculos de história, basta pensar que as primeiras Casas de Misericórdia nasceram na Toscana em 1200. Por esse motivo, em uma fase histórica como essa, o Terceiro setor não pode ser considerado irrelevante ou, pior, ser tratado de acordo com uma lógica de sujeição. Especialmente porque está em jogo justamente o tecido social do país.

A que você está se referindo?

Existe uma rede de relações, que se baseiam na confiança e proximidade entre organizações e pessoas, que é posta à dura prova. Quantas pessoas vivem na solidão e em sofrimento esses momentos, completamente isoladas de todos? O problema não é tanto a proximidade física, que pode ser substituída por telefone, Skype, aulas a distância, como estamos vendo. O problema é já agora, e será ainda mais no futuro, o de restabelecer redes que assegurem relações. Também será tarefa da comunidade cristã levantar a cabeça e restaurar a confiança. Com a explosão da pandemia de coronavírus, entrou em crise o mito da invulnerabilidade e do sem limites que nutrimos por vinte anos. Fomos surpreendidos e agora temos que recorrer aos bens relacionais e que dispomos em abundância.

O que deveria ter sido feito?

A Itália possui o terceiro setor mais avançado e desenvolvido da Europa. Fiquei surpreso ao ver como foi excluído das mesas em que tudo é decidido. Fundações como Vidas, Ant, Avo, que lidam especificamente com a saúde, têm conhecimento e podem dar uma contribuição, eu esperava que elas fossem envolvidas. De maneira mais geral, quem poderia operar melhor de quem trabalha em contato com as fragilidades para ajudar as pessoas a entender o que está acontecendo e o que fazer, atuando também em frentes esquecidas, como as prisões e os sem teto?

Resta o fato que nosso sistema nacional de saúde está sob forte estresse e muitos alarmes foram desconsiderados. Por quê?

Nosso sistema de saúde é bom, com um calcanhar de Aquiles: a terapia intensiva. Já em 2017, o Centro Europeu de Controle de Doenças havia elaborado um relatório no qual se dizia que a Itália era o país em piores condições, com poucos leitos, pessoal mal equipado e várias outras deficiências. Acrescente os cortes aplicados por trinta anos ao setor e o fato de que aqui não vale a regra da economia de escala: o quadro está completo. Para sair disso, seria necessário fazer contribuir para os custos da saúde todos os setores, do bioquímico ao farmacêutico, que obtêm grandes lucros graças à área sanitária. Terminada a epidemia, todos deveriam contribuir para a reconstrução do sistema de maneira sábia e com uma distribuição, dessa vez justa, dos encargos necessários.

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