17 Março 2022
O dia 15 de março de 2011 marca o início da guerra na Síria. Um conflito que já causou meio milhão de mortes. "Não deixem morrer a esperança", continua a repetir o núncio em Damasco, cardeal Mario Zenari, que denuncia violências, pobreza e abandona.
Casas destruídas, falta de alimentos, água e medicamentos, violência, saques, pessoas em fuga. Na Síria, após 11 anos, o conflito não terminou, mas sobre esta guerra fala-se muito pouco, como também de muitas outras. Este país, onde muitas cidades continuam sendo cúmulos de escombros, chora meio milhão de mortes e vê mais de 11 milhões e meio de pessoas deslocadas dentro e fora do país. Hoje, no aniversário do início do conflito, tem início em Damasco a conferência "Igreja, Casa da Caridade - Sinodalidade e Coordenação", organizada pela Congregação para as Igrejas Orientais. No centro dos trabalhos estão a escuta, o diálogo, o futuro das comunidades cristãs, mas também as necessidades urgentes desta atormentada nação. "Não deixem a esperança morrer" é a invocação contínua do núncio em Damasco, cardeal Mario Zenari, enquanto o país está "fora do radar da mídia" e entrando numa espécie de "esquecimento".
A entrevista é de Massimiliano Menichetti, publicada por Vatican News, 15-03-2022.
Eminência, há 11 anos se combate na Síria. O que este dramático aniversário significa para o senhor?
É um aniversário triste, primeiro porque a guerra ainda não terminou e também porque há alguns anos a Síria parece ter desaparecido do radar da mídia. Tomou lugar a crise libanesa, depois a covid-19, e agora a guerra na Ucrânia.
Os mortos desta guerra são cerca de meio milhão, os refugiados que fugiram cerca de 5,5 milhões, mais outros 6 milhões de pessoas deslocadas internamente. O senhor continua repetindo enfaticamente: "Não deixem a esperança morrer". O que é necessário para evitar que isso aconteça?
Infelizmente, a esperança foi embora do coração de tantas pessoas e, em particular, do coração dos jovens, que não veem futuro em seu país e procuram emigrar. E uma nação sem jovens, e sem jovens qualificados, é uma nação sem futuro. Algumas famílias, depois de terem pago grandes somas de dinheiro, ainda estão presas em Belarus, esperando para cruzar a fronteira polonesa. A catástrofe síria ainda é o desastre humanitário mais grave causado pelo homem desde o final da Segunda Guerra Mundial. Ainda não há sinais de reconstrução ou de recuperação econômica. Além disso, as sanções estão pesando muito sobre tudo isso. O processo de paz, como previsto na Resolução 2254 da ONU, está paralisado. Somente a pobreza avança a passos largos. As pessoas estão agora falando sobre a guerra econômica.
Mais de 60% da população é afetada pela insegurança alimentar. Como ajudar?
Há escassez de pão e agora, com a guerra na Ucrânia, também de farinha, bem como outras necessidades básicas. De 15 a 17 de março, se realiza em Damasco uma conferência convocada pela Igreja Católica com o tema: "A Igreja, Lar da Caridade: Sinodalidade e coordenação". Os participantes são cerca de 250, entre sírios e pessoas de fora da Síria, representantes de instituições católicas e agências humanitárias. O cardeal Leonardo Sandri, prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais, alguns membros dos Dicastérios Romanos e Roaco também estarão presentes. Serão feitos planos para compartilhar fraternalmente os 5 pães e 2 peixes.
Neste contexto, a fuga dos cristãos continua...
Nesses anos de guerra, mais da metade, e talvez dois terços, dos cristãos deixaram a Síria. Nesses conflitos, os grupos minoritários são o elo mais fraco da corrente. Esta é uma ferida irreparável para estas Igrejas Orientais sui iuris, mas é também um sério dano para a própria sociedade síria. Os cristãos, presentes no Oriente Médio há dois mil anos, deram uma contribuição significativa para o desenvolvimento de seu país, especialmente nos campos da educação e da saúde, com escolas e hospitais muito eficientes e respeitados. A presença de cristãos poderia ser comparada, para a própria sociedade síria, a uma janela aberta para o mundo. Os cristãos têm, geralmente, uma mente aberta e tolerante. Com cada família cristã que emigra, a janela se fecha gradualmente.
Segundo o senhor é preciso mais coragem em nível da diplomacia, da política internacional?
O enviado especial da ONU para a Síria, Geir Pedersen, retorna continuamente sobre a necessidade de um maior envolvimento da diplomacia internacional. Infelizmente, o perdurar do conflito, a pandemia de covid-19 e outros conflitos, em particular a guerra na Ucrânia, dirigiram a atenção da comunidade internacional para outros lugares.
Quanto é importante que os meios de comunicação do mundo continuem a manter o foco sobre a Síria?
Até alguns anos atrás, eu costumava receber telefonemas de várias partes do mundo para entrevistas e informações sobre o conflito sírio. Agora o telefone não toca mais. Esta é outra grande desgraça que aconteceu com a Síria. O de cair no esquecimento. Este esquecimento machuca muito as pessoas.
Alguns sírios, contratados pelos russos, teriam partido para lutar na Ucrânia. Está se explorando a pobreza do país, que está passando por uma guerra, para combater outra guerra...
Eu também li essas notícias. Algo semelhante aconteceu na Líbia há alguns anos: mercenários sírios se viram lutando em lados opostos. Esta é mais uma doença causada pela guerra, que é uma fábrica que produz todo tipo de males: vítimas, destruição de bairros e vilarejos, refugiados, danos ao tecido social, desintegração familiar, violência, pobreza, falta de trabalho, drogas e muitos outros males. Muitos jovens se encontram sem emprego, aprenderam a manusear armas e se alistaram por algumas centenas de dólares.
Como é vista na Síria a guerra na Ucrânia?
As pessoas geralmente não se atrevem a falar. Uno-me à admoestação repetida e forte do Papa Francisco para silenciar as armas e deter o massacre. Parece-me que a atormentada Síria também compreende bem, por experiência, este apelo urgente. Se posso usar a parábola evangélica do pobre Lázaro e do rico opulento, certamente a Síria, mutatis mutandis, quer advertir severamente os outros para não caírem no mesmo lugar de tormento em que ela mesma caiu (Lc 16,27-28). É triste ver repetidas na Ucrânia as mesmas imagens angustiantes de dor vistas na Síria: bairros destruídos, mortes, milhões de refugiados, o uso de armas não convencionais como bombas de fragmentação, o bombardeio de hospitais e escolas. Ver exatamente a mesma descida ao inferno que se viu na Síria.
Estamos no caminho quaresmal, um tempo de oração e jejum. Como os senhores vivem este período?
Pode-se dizer que as pessoas, qualquer que seja a denominação religiosa a que pertençam, têm vivido uma Quaresma ininterrupta e um jejum há 11 anos. É importante, acima de tudo, permanecer próximo e ser solidário.
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“Após 11 anos de guerra na Síria, caímos no esquecimento”. Entrevista com o cardeal Mario Zenari, núncio em Damasco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU