02 Julho 2021
Falando na Basílica de São Pedro ao final do dia de oração e reflexão pela paz no Líbano com líderes das igrejas e comunidades cristãs deste país, o Papa Francisco procurou encorajar o povo libanês dizendo-lhes que “na noite da crise, todos nós precisamos permanecer unidos”.
A reportagem é de Gerard O'Connell, publicada por America, 01-07-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Ele disse-lhes que desejava visitar seus países e pediu-lhes para “não serem desencorajados, não perderem o coração, encontrar nas raízes de sua história de esperança um novo florescer”. Como líderes cristãos, ele disse, “queremos afirmar com toda nossa força que o Líbano é e deve permanecer um projeto de paz”.
Ele prometeu que ele e outros líderes cristãos rezariam constantemente pela paz no Líbano e Oriente Médio e disse: “O Líbano não pode ser deixado como presa para o curso dos eventos ou aqueles que perseguem seus próprios interesses inescrupulosos. É um pequeno, mas grande país, e mais que isso, é uma mensagem universal de paz e fraternidade raiando desde o Oriente Médio”.
Mapa do Oriente Médio, com destaque ao Líbano. Fonte: Wikimedia
Direcionando-se aos líderes políticos do país, que falham em formar um governo há 10 meses, Francisco disse: “é essencial aqueles no poder escolherem finalmente e decisivamente trabalhar para a verdadeira paz e não para seus próprios interesses.
Que acabem os poucos que lucram com o sofrimento de muitos! Chega de permitir que meias-verdades continuem a frustrar as aspirações das pessoas!”.
Ele apelou a esses mesmos líderes para “encontrar soluções urgentes e duradouras para a atual crise econômica, social e política, cientes de que não pode haver paz sem justiça”.
Ele também pediu que as mulheres libanesas fossem incluídas nos processos de tomada de decisão no país.
A crise no Líbano foi agravada pelos interesses políticos e financeiros e pela interferência de países da região e de fora dela, incluindo Arábia Saudita, Irã, Síria, Turquia e Israel. O papa pediu a esses atores que “parem de usar o Líbano e o Oriente Médio para interesses e lucros externos”. As suas palavras foram ouvidas pelos embaixadores de muitos dos 181 países que mantêm relações diplomáticas com a Santa Sé e que estiveram presentes na basílica enquanto falava.
“É essencial que aqueles que estão no poder escolham definitiva e decididamente trabalhar pela paz verdadeira e não pelos seus próprios interesses”.
Francisco afirmou que “o povo libanês deve ter a oportunidade de ser os arquitetos de um futuro melhor em sua terra, sem interferências indevidas”. Ele apelou à comunidade internacional para ajudar o Líbano neste caminho, criando “condições para que o país não entre em colapso, mas embarque em um caminho de recuperação”, o que seria “para o benefício de todos”.
Muitos esperavam que o papa convocasse uma conferência internacional para ajudar o país neste caminho, como o Patriarca Maronita vinha pressionando. Há inquietação entre outros líderes cristãos em relação a essa proposta, e Francisco optou por não pressioná-la.
Francisco procurou animar os cinco milhões de habitantes desta terra, onde os muçulmanos são maioria, mas os cristãos representam um terço da população, dizendo-lhes que os cristãos do Líbano “asseguram aos nossos irmãos muçulmanos e de outras religiões, de nossa abertura e disponibilidade para trabalhar juntos na construção da fraternidade e na promoção da paz”.
Ele pediu “perdão” pelos erros que os cristãos cometeram ao longo dos anos “ao não dar um testemunho consistente do Evangelho” e por perder oportunidades de promover “a fraternidade, a reconciliação e a plena unidade”. Olhando para o futuro, ele disse: “Nós, cristãos, somos chamados a ser semeadores de paz e construtores de fraternidade, não acalentando rancores e lamentações do passado, mas olhando com esperança para o futuro”.
“Nós, cristãos, somos chamados a ser semeadores de paz e construtores de fraternidade, não acalentando rancores e lamentações do passado, mas olhando com esperança para o futuro”.
Ele declarou que o Líbano é chamado “a ser uma terra de tolerância e pluralismo, um oásis de fraternidade onde diferentes religiões e confissões se encontram, onde diferentes comunidades convivem, colocando o bem comum acima de seus interesses individuais”.
O Papa Francisco abriu este dia de oração e reflexão no Vaticano em 1º de julho junto com os nove líderes das igrejas e comunidades cristãs do Líbano, buscando oferecer esperança e paz a um país que corre o risco de afundar na pobreza e no caos.
Ele esperava promover a unidade entre as comunidades cristãs divididas desta terra para trabalharem juntas pelo bem comum, disse uma fonte do Vaticano aos Estados Unidos na véspera deste evento histórico.
Francisco e autoridades do Vaticano acreditam que a unidade entre os cristãos pode dar uma contribuição importante para a formação de um governo que é urgentemente necessário para enfrentar as dramáticas crises econômicas, sociais e políticas que colocaram esta nação de joelhos.
O papa declarou que o Líbano é chamado “a ser uma terra de tolerância e pluralismo, um oásis de fraternidade onde diferentes religiões e confissões se encontram”.
Dom Michel Aoun, de Jbeil-Byblos, dos Maronitas, compartilha dessa visão. Ele disse a AsiaNews que vê os encontros de hoje como uma contribuição essencial para superação de muitas crises que afligem o Líbano.
Agora, disse, “não há intenção de unidade, nem pressão positiva para a formação de um governo, nem para líderes partidários para encontrar uma solução em vez de apenas procurar seus próprios interesses, sejam eles sunitas, xiitas ou mesmo cristãos”.
Para o bispo maronita o problema é a “falta de senso de unidade”.
“Ao final da guerra civil que ocorreu entre 1975 e 1990 não houve uma real reconciliação entre as pessoas, uma conscientização e admissão de erros, dos erros cometidos, os quais possibilitariam o país de ser uma mensagem como João Paulo II o chamou”, afirmou.
Dom Aoun disse aos líderes cristãos “verdadeira esperança que a diplomacia vaticana possa ajudar o Líbano e exercer o direito de pressão para o nascimento de um novo governo, o qual seria o primeiro sinal positivo para o país e uma condição necessária para a chegada da ajuda internacional”.
O último relatório do Banco Mundial sobre a Economia Libanesa, publicado em 21 de junho, destacou aspectos-chave da crise dramática. O relatório diz que “as crises econômicas e financeiras são estão nos 10 maiores, ou até 3 maiores, episódios globais de crise desde meados do século XIX”.
“Face aos desafios colossais, contínua inação política e ausência de uma autoridade executiva plenamente funcionando ameaçam as condições socioeconômicas já terríveis e uma paz social frágil, sem um ponto de virada claro no horizonte”, diz o relatório.
Várias fontes relatam que mais de 50% dos libaneses vivem na pobreza e mais de 40% estão desempregados. Há uma séria falta de eletricidade, gás, gasolina e falta de dinheiro devido aos controles bancários e bens essenciais. Os salários estão congelados há 18 meses, mas os preços aumentaram dez vezes. Todos os libaneses, muçulmanos, cristãos ou drusos estão sofrendo com esta situação desastrosa e potencialmente explosiva.
Além de tudo isso, há cerca de dois milhões de refugiados no país, principalmente do conflito na Síria, mas também muitos palestinos de um período anterior. Muitos milhares de profissionais, incluindo médicos, engenheiros, professores, bem como jovens, emigraram, um êxodo contínuo, que inclui muitos cristãos. Isso teve um tremendo impacto negativo em hospitais e escolas e deixou muitas comunidades com uma maioria de idosos e crianças pequenas, disse o bispo maronita Samir Mazloum à agência de notícias AFP.
Francisco começou o dia saudando os líderes cristãos libaneses um-a-um na Casa Santa Marta do Vaticano, onde ele reside, e onde os visitantes estão sendo hospedados para esta cúpula. Nove patriarcas representando as comunidades católica, ortodoxa e cristã evangélica do Líbano participaram.
Após as saudações, Francisco e os líderes cristãos caminharam juntos de Santa Marta até a Basílica de São Pedro, onde o papa entoou o Pai Nosso em árabe – “Abana alathie”. Eles oraram em silêncio por vários minutos em frente ao altar da confissão na basílica vazia, antes de descerem para rezar no túmulo de São Pedro sob o altar principal, onde cada um acendeu uma vela pela paz.
Da basílica, eles foram à Sala Clementina do Vaticano para três sessões de trabalho a portas fechadas para compartilhar sua leitura da realidade atual no Líbano. O objetivo é obter uma imagem clara da situação no país e chegar, na medida do possível, a uma posição comum sobre o que é desejável e possível neste momento da história do país.
O Papa Francisco concluiu o dia com um serviço ecumênico de oração na basílica, que incluiu leituras e orações em árabe, siríaco, caldeu e armênio, e hinos.
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Papa Francisco: líderes políticos libaneses deveriam trabalhar para a paz – não para seus próprios interesses - Instituto Humanitas Unisinos - IHU