Jubileu, mais de mil pessoas LGBTQ+ batem à "Porta Santa" da Igreja

Foto: Pavel Danilyuk | Pexels

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08 Setembro 2025

Em doze anos de pontificado, o estilo de Francisco deixou espaço para novos gestos e palavras, que, no entanto, não encontraram eco na doutrina católica, que permaneceu praticamente inalterada. A Fiducia supplicans, a declaração do Dicastério para a Doutrina da Fé publicada em 2023 para regulamentar as bênçãos para as uniões entre pessoas do mesmo sexo, tem sido um terreno de embate com os bispos da África, para os quais a ideologia LGBTQ+ é puramente ocidental.

O artigo é de Marco Grieco, jornalista, publicado por Domani, 06-09-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo. 

A peregrinação é parte dos eventos menores do Ano Jubilar. No entanto, a peregrinação de La Tenda di Gionata, que acontece no sábado, 6 de setembro, é inédita: pela primeira vez, um grupo de pessoas LGBTQ+ passará pela Porta Santa de São Pedro.

O sol que despontará no sábado, 6 de setembro, sobre a Basílica de São Pedro anuncia um novo amanhecer para a comunidade LGBTQ+ porque, em um clima de expectativa e incerteza, acontecerá a primeira peregrinação de pessoas queer da história da Igreja, com procissão e cruzamento da Porta Santa, conforme a programação do Jubileu. Listada entre as peregrinações menores no calendário oficial do Ano Santo e, por isso, criticada pelos jornais mais conservadores, para os fiéis da comunidade arco-íris esse evento não tem nada de secundário. Os números de participantes comprovam isso: aproximadamente 1.500 peregrinos de todo o mundo, incluindo a Austrália.

Um evento continental, portanto, impensável durante o longo pontificado de João Paulo II, que criticou em várias oportunidades a comunidade arco-íris durante a Parada Mundial do Orgulho Gay, culpada por escolher Roma como sede da parada no ano do Grande Jubileu de 2000. "Na época, era evidente a oposição pública das lideranças eclesiásticas, tanto que o Cardeal Camillo Ruini criticou a decisão, e muitos outros tentaram impedi-la, obrigando o então prefeito, Francesco Rutelli, a retirar seu patrocínio", lembra o Padre Vitaliano della Sala, pároco de Mercogliano, na província de Avellino, que pagou o preço de seu desabafo público com o isolamento.

Do silêncio à visibilidade

Vinte e cinco anos e dois Jubileus depois, o clima mudou. A peregrinação, organizada pela Tenda di Gionata, contará com a participação de vários padres e freiras que se dedicaram nos últimos anos à pastoral do arco-íris.

Certamente, participarão alguns dos padres e religiosos que, durante o processo sinodal italiano de 2022, dirigiram uma carta aos líderes da Conferência Episcopal Italiana denunciando a dureza da Igreja: "Palavras duras dirigidas a nós, padres e religiosos homossexuais, simplesmente por sermos homossexuais".

Para as pessoas crentes e queer, estar em São Pedro como peregrinos significa, antes de tudo, reivindicar um espaço: "Eu, pessoalmente, inicialmente estava cético: parecia impossível empreender tal jornada dentro da Igreja Católica. Mas o encontro com tantos consagrados, padres e freiras, engajados com essas questões, me fez mudar de ideia", explica Innocenzo Pontillo, presidente da associação fundada no final da década de 1990 para dar voz às pessoas silenciadas na Igreja.

Com o pontificado de Francisco, grande parte da comunidade saiu do armário e deixou para trás o estigma e o medo: "Gostaria que todos nós, transgêneros, homossexuais, etc., pudéssemos viver nossa fé sem sermos julgados ou sentir vergonha por ela. Para mim, estar aqui significa principalmente viver minha fé livremente e poder demonstrar que é possível ser transgênero e, ao mesmo tempo, crente", explica Alessia Nobile, assistente social e ativista transgênero, hoje referência para as detentas trans na Puglia. Alessia, que se encontrou com o Papa Francisco diversas vezes, renasceu graças a pastores como o Padre Andrea Gallo e Angelo Cassano.

Órfãos de Francisco

O apoio da Igreja a grupos marginalizados, como a comunidade trans, é profundamente sentido na América do Sul, de onde vem Ana Flavia Chavez, apoiada nessa viagem pelo Cardeal Pedro Barreto: "Na Igreja, muitas vezes ouvi que muitos queriam se sentar longe de uma mulher trans. É certamente um problema político, visto que o Peru é um dos quatro países latino-americanos que não possui uma lei para a identidade de gênero de pessoas trans. Mas, por outro lado, temos uma pastoral transgênero muito mais desenvolvida do que na Itália."

Em doze anos de pontificado, o estilo de Francisco deixou espaço para novos gestos e palavras, que, no entanto, não encontraram eco na doutrina católica, que permaneceu praticamente inalterada. A Fiducia supplicans, a declaração do Dicastério para a Doutrina da Fé publicada em 2023 para regulamentar as bênçãos para as uniões entre pessoas do mesmo sexo, tem sido um terreno de embate com os bispos da África, para os quais a ideologia LGBTQ+ é puramente ocidental.

A peregrinação de hoje visa mostrar que, por trás da fachada de uma resistência cultural, escondem-se rostos que sofreram e lutaram por sua identidade: "A questão é que sempre fomos pessoas invisíveis e, quando a Igreja nos aceitava, nos dizia como nos comportar", explica Ana González, que veio de Burgos com sua companheira para participar da peregrinação.

A peregrinação foi precedida por uma tocante vigília de oração na Igreja de Jesus, sede dos jesuítas italianos, entre os fervorosos promotores do evento com a iniciativa "Igreja, casa para todos". Em última análise, isso basta para entender que esse evento é o último legado do pontificado de Francisco: "Às vezes me sinto órfão de Francisco, porque ele tinha uma força pastoral e um amor autêntico pelas pessoas. Sentirei falta de seus gestos, que falavam muito mais do que muitos documentos oficiais", lembra Pontillo.

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