18 Abril 2025
Exploração de petróleo no Peru gerou milhões para obras públicas, mas, em 2023, apenas metade dos recursos chegou aos municípios amazônicos.
A informação é publicada por ClimaInfo, 15-04-2025.
O porto de Mazán, no estado de Loreto, na Amazônia peruana, tem um cais mal construído. Suas rampas, corroídas, parecem que vão desabar. A margem do rio Napo, afluente do Amazonas, está tomada por detritos plásticos, onde crianças e jovens brincam descalços.
Não há sinais de investimento em infraestrutura urbana na cidade. Mais da metade de sua população, dedicada principalmente à agricultura e pesca, não consegue comprar nem uma cesta básica para uma família por mês. Na maioria das casas há eletricidade apenas por algumas horas, enquanto a água potável chega duas ou três vezes por semana. E 57% das moradias não têm banheiro.
As deficiências contrastam com os mais de R$ 22 milhões previstos em 2025 para Mazán, zona de passagem do petróleo extraído em Loreto. O valor representa 64% do orçamento municipal e deveria ser usado para promover o desenvolvimento local, mas os repasses não aliviam a pobreza.
A equipe do veículo peruano OjoPúblico esteve em Loreto em outubro de 2024. A reportagem, que mostra que o petróleo não levou desenvolvimento à região, integra o projeto “Até a última gota”, que destrincha os impactos da produção petrolífera na Amazônia. InfoAmazonia, que integra o projeto, e Colabora reproduziram a matéria.
A atividade petrolífera começou na Amazônia peruana há mais de 50 anos, em 1971. A estatal Petroperú descobriu as primeiras reservas na bacia do rio Corrientes, em Loreto. A partir daí, houve uma corrida pelo petróleo: a região chegou a ter 14 empresas, nacionais e estrangeiras, operando.
Há duas formas de arrecadar recursos sobre a exploração de recursos naturais no país. Uma é a “regalía”, pagamento direto feito pelas empresas ao Estado pelo direito de exploração, equivalente aos royalties no Brasil. Outra é o “canon”, transferência federal para os governos regionais e municipais a partir da arrecadação do imposto de renda das petroleiras.
Mazán recebe o canon petrolífero há cerca de 20 anos. Mas não há sinais de melhorias nos indicadores sociais do município. Tampouco houve avanços em outras cidades da região de Loreto. Onde antes era uma floresta, hoje existe um lixão improvisado que recebe tudo o que é descartado em Mazán.
A cidade peruana não é exceção, é regra. A indústria petrolífera promete mundos e fundos, mas enriquece poucos, enquanto a maior parte da população paga pelos impactos ambientais, sociais e climáticos da atividade. Na série “Verdades inconvenientes sobre a exploração de petróleo no Brasil”, Juliana Aguilera, do ClimaInfo, mostra situações similares em Macaé e Maricá, no Rio de Janeiro, e em cidades do Maranhão. André Borges e Ruy Baron apontam os mesmos problemas em duas cidades da Amazônia brasileira: Coari e Silves, apelidadas de “Dubai Amazônica”.
Voltando ao Peru, os governos regionais e locais das áreas onde há exploração de petróleo também devem investir 5% do que recebem em projetos para as Comunidades Tradicionais e Indígenas afetadas. Mas a implementação dessa norma foi um “fiasco”, afirma o economista Roger Grández Ríos, diretor do Instituto de Desenvolvimento Socioeconômico do Peru.
Enquanto isso, os danos ambientais se acumulam. Uma análise da Coordenadoria Nacional de Direitos Humanos revelou que, entre 1997 e maio de 2023, o governo peruano registrou 1.460 emergências por vazamentos de óleo. Desses casos, 831 – o equivalente a 57% – ocorreram em território amazônico.
A série “Até a última gota” já mostrou como a Amazônia se tornou a nova fronteira exploratória de petróleo nos últimos anos; a ação de petroleiras no Brasil para estender contratos à espera da licença do IBAMA para a Petrobras na foz do Amazonas; os imensos problemas socioambientais que a Exxon promove na Guiana com a exploração de combustíveis fósseis no país; e os impactos socioambientais da extração de petróleo em comunidades Indígenas da Colômbia.