07 Janeiro 2025
"Embora o Jubileu também poderá ser celebrado nas igrejas locais, seu coração estará em Roma, onde são esperados milhões - trinta? - de peregrinos. Não sabemos se e como a circulação se comportará, por mais que a prefeitura tenha feito o possível para tornar a caótica Urbe habitável e hospitaleira", escreve Luigi Sandri, jornalista italiano, em artigo publicado por Confronti, 06-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Quatro nos parecem ser os principais temas que, ad intra e ad extra, dominarão, em 2025, o debate, as possíveis escolhas ou os problemáticos adiamentos das reformas no mundo católico romano:
No início do século IV, em Alexandria do Egito, o presbítero Ario dizia que o Verbo (“O Verbo [Logos] se fez carne e habitou entre nós”, afirma o Evangelho de João) é semelhante, mas não igual ao Pai; de fato, continuava o teólogo, “houve um tempo em que o Verbo não existia”.
Os bispos ficaram perturbadíssimos; e os fiéis, uma parte a favor do pregador inquieto, outra contra: surgiram tensões que poderiam - assim temia Constantino - ter consequências políticas desagradáveis. Portanto, o imperador (ele, não Silvestre, o então papa de Roma) decidiu convocar um Concílio ecumênico - ou seja, representando a oikoumene, toda a terra habitada pelos romanos.
Constantino, embora fosse pagão, estava convencido de que o futuro pertenceria aos cristãos; portanto, ele se interessava pelos assuntos da Igreja e também se considerava “bispo externo” da Igreja. A grande assembleia - da qual participaram cerca de 300 bispos, quase todos orientais - foi realizada em Niceia (em turco, hoje, Iznik), a cerca de cem quilômetros de Bizâncio.
O soberano afirmou aos padres: “Digam-me qual é a verdadeira fé e eu a farei respeitar”. O Concílio considerou Ário “herege” e, portanto, o imperador o puniu enviando-o para o exílio em Ilirico; e, em um Credo, que em 381 pelo Concílio de Constantinopla I seria ainda mais enriquecido, proclamaria que o Verbo é ‘Deus de Deus, luz da luz, gerado, não feito, da mesma substância do Pai”.
Hoje, praticamente todas as Igrejas existentes, pelo menos as históricas, reconhecem o Símbolo da Fé iniciado em Niceia; e para o 17º centenário, muitas iniciativas são anunciadas, também dentro da Ortodoxia, ou apoiadas pelo Conselho Ecumênico das Igrejas.
Por sua vez, Francisco disse em 28 de novembro: “Durante este Ano Santo [o Jubileu], também teremos a oportunidade de celebrar o 1700º aniversário do primeiro grande Concílio ecumênico, o Concílio de Niceia. Eu planejo ir até lá. Esse Concílio constitui um marco na jornada da Igreja e também de toda a humanidade, porque a fé em Jesus, o Filho de Deus feito carne por nós e para nossa salvação, foi formulada e professada como luz que ilumina o significado da realidade e o destino de toda a história”.
Será que essas palavras exigentes serão meditadas pelos “cristãos de domingo” que embora super dispostos a participar de peregrinações, em sua maioria, não se aprofundam nas raízes de sua fé? E como serão recebidas por aqueles e aquelas que no mundo teológico se consideram “além das religiões”? Este é um planeta variegado, que, sobre a permanente vigência da definição de Niceia, não tem opiniões homogêneas. Dizer, como está sendo feito em alguns setores, que é inadmissível, ao falar da Trindade, usar hoje a palavra, não bíblica, de “pessoa”, tirada da cultura grega, para substituí-la por “energia”, ou “relação”, não leva - parece-nos - a lugar algum, porque cada uma delas é também palavra humana.
É verdade que aquele Concílio usou expressões que, hoje, para muitos, podem parecer obscuras; mas seria uma ilusão pensar em encontrar outras que sejam realmente compreensíveis; de fato, nunca haverá expressões adequadas para explicar o mistério da Trindade ou da Encarnação. Deus sempre permanecerá inefável, Outro, Além. Sabemos sobre Ele o que Jesus nos revelou. As Igrejas, nos séculos IV e V, se dilaceraram na explicação do mistério de Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem: latinos e bizantinos se opuseram a armênios, sírios e coptas, e aos “nestorianos”, considerando-os “hereges”; hoje, no entanto, tende-se a dizer que, embora usando palavras diferentes da Primeira e da Segunda Roma, aquelas Igrejas afirmavam basicamente a mesma verdade.
Aberto na noite de Natal de 2024, o Jubileu desejado por Francisco busca combinar dois aspectos muito diferentes, para não dizer incompatíveis: o devocional (a visita às basílicas romanas de São Pedro e São Paulo para “adquirir” as indulgências) e o substancial, que gostaria de atualizar o Jubileu, não como Bonifácio VIII queria em 1300, mas como originalmente previsto no capítulo 25 de Levítico: a libertação dos escravos, o descanso da terra e sua restituição aos antigos proprietários. Traduzindo para os dias de hoje: o Norte global perdoará os empréstimos concedidos aos países do Sul para que se recuperem das chagas ligadas às antigas injustiças e espoliações? As instituições católicas e os indivíduos farão sua parte para concretizar o ideal do Jubileu bíblico? Afinal, em sua mensagem de 12 de dezembro, dedicada ao Dia da Paz, de 1º de janeiro de 2025, Francisco, retomando uma ideia lançada pelo Papa Wojtyla por ocasião do Ano Santo de 2000, pede que pensemos desde já “em uma redução consistente, se não no perdão total, da dívida internacional, que pesa sobre o destino de muitas nações. Reconhecendo a dívida ecológica, os países mais ricos deveriam se sentir chamados a fazer todo o possível para perdoar as dívidas dos países que não estão em condições de pagar de volta o que devem”.
Embora o Jubileu também poderá ser celebrado nas igrejas locais, seu coração estará em Roma, onde são esperados milhões - trinta? - de peregrinos. Não sabemos se e como a circulação se comportará, por mais que a prefeitura tenha feito o possível para tornar a caótica Urbe habitável e hospitaleira. Daqui a um ano, veremos como tudo se desenrolará, em meio a devoções, comércio, especulação, aumentos de preços provocados pelo Jubileu, orações e debates. Uma coisa é certa: o Ano Santo começa enquanto as guerras em andamento continuam, inexoráveis.
A ONU, os políticos e a diplomacia parecem impotentes para extinguir os contínuos focos bélicos em curso (especialmente entre a Rússia e a Ucrânia, e entre o Hamas e Israel). Mas até mesmo as Igrejas, a começar pela Igreja de Roma, encontram-se em dificuldades: será que elas podem proferir palavras, segundo elas de verdade, sem inflamar ainda mais os ânimos? Tomemos como exemplo o juízo sobre a tragédia de Gaza.
Em 17 de novembro, o jornal La Stampa de Torino antecipou algumas das declarações contidas em A esperança nunca decepciona. Peregrinos rumo a um mundo melhor, uma longa entrevista com Bergoglio feita por um jornalista argentino, em vista do “Jubileu da Esperança”.
Que, em determinado momento, deixando em segundo plano as 45.000 vítimas - principalmente mulheres e crianças - dos bombardeios israelenses contra a Faixa, afirma: “O que está acontecendo em Gaza tem as características de um genocídio. Dever-se-ia investigar com atenção para determinar se se enquadra na definição técnica formulada por juristas e órgãos internacionais”. A resposta da embaixada israelense na Santa Sé foi imediata: ela lembra que “em 7 de outubro de 2023 houve um massacre genocida” organizado pelo Hamas contra o Estado judeu; reivindica “o direito de Israel à autodefesa”; enfatiza que “qualquer tentativa de chamar essa autodefesa por qualquer outro nome significa isolar o Estado judeu”. Também houve muitos comentários em Israel e no judaísmo italiano. Liliana Segre, no Corriere della Sera de 29 de novembro, escreveu: “Na dramática situação em Gaza, não ocorre nenhuma das duas características típicas dos principais genocídios geralmente reconhecidos como tal - o Medz Yegnern dos armênios, o Holocausto dos judeus, o extermínio dos tutsis em Ruanda... - enquanto os crimes de guerra e os crimes contra a humanidade, cometidos tanto pelo Hamas e pela Jihad quanto pelo exército israelense, são bastante evidentes”.
A opinião de Anna Foa, em várias entrevistas, é diferente: “De Francisco, dúvidas legítimas. O direito é um antídoto contra a violência”. Para Edith Bruck, ao contrário, “o pontífice foi superficial”. E para Ruth Dureghello, presidente da Comunidade Judaica de Roma: “O papa legitima a propaganda contra Israel; evocar o genocídio alimenta o antissemitismo”.
Do lado israelense, além disso, fontes do governo e parte da opinião pública ficaram muito irritadas com as palavras de Francisco. Mas para Ehud Olmert, ex-prefeito de Jerusalém e depois primeiro-ministro: “O papa não disse nada de errado. É o primeiro-ministro Netanyahu que quer uma guerra sem fim”. E, nos sites, agora foi reproposto o que Amos Goldberg, professor de História do Holocausto no Departamento de História da Universidade Hebraica de Jerusalém, já havia declarado em maio passado: “Sim, é genocídio. É difícil e doloroso admitir, mas não podemos mais evitar essa conclusão. A partir de agora, a história judaica será manchada com a marca de Caim pelo ‘mais horrível dos crimes’, que não poderá ser apagado. É assim que será considerada no julgamento da história pelas próximas gerações. Os alvos militares são quase alvos incidentais quando matam civis, e todo palestino em Gaza é um alvo a ser morto. Essa é a lógica do genocídio”.
E vamos para a outra frente quente. No quadrante da guerra russo-ucraniana, as dificuldades são semelhantes para todas as Igrejas e para o Vaticano: que, para não atrair a acusação de facciosismo, devem usar palavras com o conta-gotas, tanto mais que Kirill, o Patriarca ortodoxo russo, define como “guerra santa” aquela travada por Putin contra a Ucrânia, enquanto os greco-católicos ucranianos não param de denunciar a invasão russa de seu país.
Na Igreja romana ad intra, o problema da ordenação de diáconas será provavelmente o mais agudo, também em 2025, por causa das muitas consequências históricas e teológicas tanto do “sim” quanto do “não”. Há três meses, na segunda sessão do Sínodo dos Bispos, o número 60 do documento final declarava: “Esta Assembleia pede a plena implementação a todas as oportunidades já previstas pelo Direito atual com relação ao papel das mulheres... Não há motivos que impeçam as mulheres de assumir papéis de liderança na Igreja: o que vem do Espírito Santo não poderá ser impedido. A questão do acesso das mulheres ao ministério diaconal também permanece em aberto. O discernimento a esse respeito deve ser continuado”.
Como se chegou a esse texto? Não sabemos os detalhes do debate interno, porque ele foi ocultado dos jornalistas e, portanto, das pessoas. Resumindo: Francisco, temeroso de um quase cisma dos “conservadores” hostis às diáconas, mediou adiando tudo para o futuro, porque, diz ele, “a hipótese não está madura”. Mas quem apurou a opinião dos fiéis? De qualquer forma, até o próximo mês de junho, o grupo de estudo sobre o assunto - nas mãos do Dicastério para a Doutrina da Fé - também terá que levar suas conclusões ao pontífice, que se cruzarão com aquelas da comissão papal ad hoc, liderada pelo cardeal Giuseppe Petrocchi, arcebispo de L'Aquila. Mas qual será o valor de sua resposta? Ela terá que ser reavaliado por um Sínodo? Grande é a confusão sob a cúpula de São Pedro.
Enquanto isso, em 7 de dezembro, Bergoglio nomeou 21 novos cardeais “votantes”, de todos os continentes, elevando para 140 (16 norte-americanos, 21 latino-americanos, 60 europeus, 23 asiáticos, 16 africanos, 4 da Oceania) o plenário daqueles que, no caso de um conclave, entrarão na Capela Sistina. E, no dia “x”, uma questão absolutamente decisiva para a escolha do novo bispo da Urbe será exatamente o que ele pensa sobre a ordenação das diáconas.
Nunca antes, apesar de ausente e excluída em Roma, terá manifestado seu peso a outra metade da Igreja no talvez último conclave “machista” da história.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Os desafios 'ad intra' e 'ad extra' que dominarão o debate no novo ano. Artigo de Luigi Sandri - Instituto Humanitas Unisinos - IHU