18 Junho 2024
"Serão esses [os países do G7] os Grandes da Terra? São a eles que confiamos a tarefa de parar diante do precipício mais escuro e terrível? Uma Santa Aliança de medíocres sobreviventes do Antigo Regime?", escreve Domenico Quirico, jornalista italiano, em artigo publicado por La Stampa, 15-06-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os Grandes, os Sete Grandes da terra! Se sobrepormos a enfática definição às conotações invasivas dos protagonistas da Puglia entre olivais, trulli e castelos, sentimos de imediato, com uma sensação de embaraço, que a palavra se desfaz, como se algo mole e viscoso tivesse se infiltrando por dentro. Outras palavras, infelizmente, não apenas resistem, mas erguem-se esplendorosas e terríveis sem perder nem mesmo um milímetro da sua força de verdade, lápides e editos que tornam o nosso tempo tão duro, vítreo e terrível. E estas palavras são guerra, massacres, miséria e misérias, separações e ódio.
Contemplamo-los, atônitos, os Sete, alinhados por um instante na foto de recordação, como se abríssemos a porta de uma geladeira. Olhamos os rostos um por um. Depois fechamos a porta e esperamos tirar da consciência um filme de arquivo inofensivo e ultrapassado, no qual seria hora de colocar uma boa pitada de naftalina. Em vão.
Serão esses os Grandes da Terra? São a eles que confiamos a tarefa de parar diante do precipício mais escuro e terrível? Uma Santa Aliança de medíocres sobreviventes do Antigo Regime? Que esperanças podem se encontrar nos restos cinzentos, pernósticos, irritados e ameaçadores dos seus discursos, nos resumos ofegantes e secos de dois dias de “trabalhos”, em que se chafurda em tagarelice em benefício de política interna, sorrisos falsos e menus estelares, para esconder a digestão de nada? Esses ébrios do Livre Mercado, apóstolos da santidade da Concorrência, mas que, por uma questão de vantagem, já se tornaram carniceiros enfurecidos do protecionismo... Se esses são os Grandes, dá vontade de soltar aos berros o discurso revolucionário.
Vejamos o mais Grande de todos, o estadunidense Biden. "A rocha do mundo livre" como se dizia na Primeira Guerra Fria, também reutilizável para a Segunda e mais perigosa glaciação, é realmente este Brejnev capitalista? Hieróglifos reveladores providencialmente escondido por trás de óculos escuros, lutando com as foscas Erínias trumpianas, deambula frágil e perdido; um fantasma por quem não se pode deixar de sentir uma onda de instintiva e fraterna piedade. Você fica alarmado ao lembrar que atrás dele desfilam setecentas bases militares, porta-aviões e bombardeiros, dispositivos atômicos prontos para uso, armas bélicas de todos os tamanhos e tipos. Que a famosa maleta do Apocalipse viaja sempre ao seu incerto lado...
E existe o risco de uma guerra mundial porque um prepotente, Putin, quer ser readmitido justamente no Sinédrio desses Grandes fantasmas, não como colaborador útil, mas como protagonista que pode levantar a voz!
Spengler levou centenas de páginas para contar, talvez com um pouco de antecedência, a decadência do Ocidente. Se ele estivesse em Borgo Egnazia nestes dias, uma única frase teria sido suficiente para fixar o enésimo fim dos pusilânimes e dos canalhas do último império. Nós olhávamos, no Século XX, o corpo e a máscara de Leonid Brezhnev expostos como um objeto inerte na balaustrada da Praça Vermelha. Tinha-se a vontade de enfiar a mão na sobrecasaca para sentir se o coração batia regularmente. Compreendíamos que a União Soviética, “a guarnição da revolução mundial”, já era um cadáver à espera da constatação burocrática de morte.
Mas aquele era um sistema autoritário, defendia a si mesmo negando até a realidade, tentando iludir-se de que um mausoléu fosse vida e a agonia um resfriado. O caso de Biden, da democracia estadunidense que teve sucesso na magia de nos convencer de que é a eterna juventude do mundo, é a vitalidade científica social política, é diferente. Se os EUA pretendem ditar a linha, escolher os bons e os maus, têm o dever de permanecer fiel ao mito em letras maiúsculas. Não podem impor antropologicamente a realidade do seu progressivo e rápido enfraquecimento. As potências que percebem que estão envelhecendo, que têm adversários mais ferozes e determinados, são extremamente perigosas, porque são induzidas a cometer erros para tentar negar a realidade, a praticar blefes insensatos, arrastando nisso também outros. Quem sugere a esse homem desorientado, acorrentado, não sei se por ambição senil ou por escolha de outros, à árdua recitação do Poder, as decisões a tomar?
Quem assina em seu nome compromissos bélicos que durarão dez anos, eternizando escolhas que poderiam resultar erradas ou arriscadas?
E os outros? Se não estivessem registrados na foto da Puglia seriam para todos um x, um senhor ninguém, lojistas provincianos admitidos no Rotary por cortesia. Antigas potências rançosas afundadas na cripta dos séculos que tocam em massa a campainha da guerra obrigatória para não constatar a irremediável irrelevância. Um chanceler que recebeu menos votos que um partido de nostálgicos nazistas e um “monsieur le président” que só os providenciais mecanismos da monarquia inventados pelo General lhe permitem fingir que nada aconteceu face às derrotas eleitorais. Extremamente empenhados em tentar anular os sinais que chegam das urnas, infelizmente induzidas a maus humores extremista precisamente pelas suas mentiras e insuficiências. E depois há a Itália, realmente Grande, mas nas dívidas, e adendos do poder estadunidense, como o Canadá e o Japão.
O agora, o aqui, o aqui histórico, estes e não outros, os dias dados a nós que os vivemos na perspectiva de terríveis precipícios: isto é, dois dias repletos de "viradas históricas", que seriam uma guerra que continuará com o dinheiro dos outros depois de ter sido feita com os mortos dos outros (e a verdadeira preocupação era o dinheiro a ser gasto, não os cadáveres que nem sequer se contam); e as habituais mercantilizações de África que se tenta penosamente de enobrecer com as falsas cores do “desenvolvimento”, pelo menos tão abstrato quanto concreta e torpe é a mercantilização a nossa vantagem. Não temos, nós, por enquanto sombrias fronteiras, não temos, nós, por enquanto as afrontas atrozes das prisões. Mas será que podemos ficar satisfeitos com esse não existir, com essas provisórias ausências? E em Borgo Egnazia os milhões de humildes, de desconhecidos itinerários de sofrimento, de dor, de tormento e de agonia que pertencem à soma dos nossos pecados e culpas justamente de Grandes, dos quais formam o precipício mais sombrio e terrível, quem os representou? Essa é a pergunta.
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A liderança paralisada do Ocidente face ao avanço das guerras e crises. Artigo de Domenico Quirico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU