08 Abril 2024
“Existem regras em todas as guerras e isso também se aplica a Gaza” explica Juliette S. Touma ao La Stampa, diretora de Comunicações da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA) após o acidente que custou a vida a 7 agentes humanitários. “São regras severas que devem ser respeitadas” porque “o que aconteceu com a World Central Kitchen não deveria ter acontecido”, afirma ao telefone de Amã.
A entrevista é de Uski Audino, publicada por La Stampa, 06-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Após o ataque que causou a morte de 7 agentes humanitários, vocês se sentem na mira?
Desde o início da guerra, a UNRWA registou a morte de 177 colegas em Gaza, muitos dos quais foram mortos no exercício das suas funções. Gaza tornou-se provavelmente o lugar mais perigoso do mundo onde prestar ajuda humanitária neste momento. Como ONU tivemos o maior número de colaboradores mortos jamais registrado. Somente em março dois colegas morreram quando as forças israelenses atacaram um armazém da UNRWA, apesar de ser uma estrutura ‘fora de conflito’.
O que significa “fora de conflito”?
A UNRWA partilha as coordenadas das suas estruturas com as partes em conflito, incluindo o exército israelense. A razão pela qual fazemos isso é que, por lei, os locais das Nações Unidas, incluindo os hospitais, devem ser protegidos a todo custo. Em vez disso, em mais de trezentos episódios registramos ataques às nossas estruturas.
O quanto é frequente nos teatros de guerra que as sedes humanitárias sejam alvos? É uma situação normal?
Não é normal. Os agentes humanitários deveriam ser protegidos por todas as partes em conflito.
Quando partilhamos os movimentos dos nossos comboios com o exército israelense como UNRWA definimos isso um processo de ‘desconflito’. É um procedimento bastante detalhado de compartilhamento de informações que incluem os nomes e as nacionalidades das pessoas que estão no comboio, o número dos veículos que fazem parte, as estradas que percorrerá, as coordenadas GPS, um mapa e uma lista detalhada do conteúdo que se está transportando. Também ficamos em contato com o exército israelense durante todo o deslocamento. No entanto, os comboios da UNRWA por três vezes foram atacados de Tsahal, tanto na viagem de ida como de volta para o norte de Gaza.
A organização estadunidense atingida também compartilhou os dados. O que pode ter acontecido?
Não sei. Vocês têm que perguntar isso ao exército israelense.
Algumas organizações humanitárias anunciaram que suspenderão as suas atividades em Gaza. Que reação espera dos agentes?
Gaza precisa agora de mais agentes humanitários, não de menos. O que deveria acontecer é que o exército israelense respeite essas pessoas e se abstenha de atacá-las. Existem regras em todas as guerras e isso inclui também a guerra em Gaza.
As ajudas humanitárias poderiam diminuir?
Deveriam aumentar e não diminuir. Como agentes humanitários, estamos lutando contra a tempo, Gaza está se encaminhando para a carestia. Pedimos que as autoridades israelenses revoguem a decisão de proibir à UNRWA de ir para o Norte de Gaza. Se não formos, ainda mais crianças morrerão de desidratação e desnutrição e muitos adultos morrerão por falta de assistência médica e de alimentos naquela parte de Gaza.
Vocês vão ficar em Gaza?
Como UNRWA, não temos nenhum plano de desmobilização. É necessário que o exército israelense proteja os nossos comboios, respeite as regras da guerra, que são muito severas e exigem que os agentes humanitários, os seus comboios e as estruturas sejam sempre tutelados.
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“Todo conflito tem suas regras, mas esse não. Os colaboradores da WCK não deveriam ter morrido”. Entrevista com Juliette Touma - Instituto Humanitas Unisinos - IHU