13 Dezembro 2022
“O sucesso do atual pontificado será decidido pelos sucessores do atual papado. Espero somente que o atual pontificado não seja um acidente, mas o início de uma nova era" e que "consigamos mantê-lo por mais alguns anos". Falando da ação reformadora que o Papa Francisco iniciou nestes dez anos e que, no papel, está destinada a mudar a relação entre a Igreja e o Magistério, é o teólogo alemão Walter Kasper, um dos cardeais que mais contribuíram para a eleição de Bergoglio no conclave de 2013. A previsão de Kasper se baseia numa análise bastante abrangente.
A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 12-12-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em sua opinião, o impulso inovador que poderia modificar a doutrina em termos de homossexualidade, fim da vida, aborto, celibato sacerdotal e representatividade na Igreja certamente não será concluído por Francisco. “Um processo de transformação dessa envergadura não pode ser realizado da noite para o dia, mas requer tempo e um longo fôlego. Não pode ser feito em um único pontificado, serão precisos dois ou três pontificados”. Isso porque o percurso de reforma se apresenta acidentado e necessita de tempos longos para incidir numa duradoura mudança cultural.
Para Kasper, falar do conceito de sinodalidade “significa o fim do antigo clericalismo hierárquico”. A análise do teólogo alemão foi feita no Laterano num encontro organizado pela Ordem dos Jornalistas do Lácio dedicado ao papado de Francisco. “Francisco é um papa evangélico, não no sentido confessional, mas no sentido original do termo. A prioridade absoluta para ele não é a doutrina, mas o Evangelho, a mensagem viva de Deus Pai misericordioso, que nos redimiu por meio de seu Filho e está permanentemente presente na Igreja no Espírito Santo. Agora, no Praedicate evangelium, o dicastério da evangelização tem precedência sobre o dicastério da doutrina da fé. Não prega mais o Deus que ameaça, condena e castiga, mas o Deus que acolhe, aceita, perdoa e reconcilia a todos no amor. Trata-se de um novo tom, que é bom para a Igreja, mas não agrada a todos e às vezes é também confundido com relativismo”.
Kasper não esconde as dificuldades do pontificado e também dos erros cometidos até agora. A sua esperança é que possa durar mais alguns anos: “Cada papa, portanto, tem seus pontos fortes, mas também aspetos que deve deixar ao seu sucessor. Eu quis falar sobre os aspectos fortes do pontificado; deixo para os jornalistas falar sobre os déficits que também existem e se tornam evidentes à medida que o pontificado se prolonga. No entanto, espero que, se Deus quiser, possamos manter este papa por mais alguns anos”.
A situação complexa é dada por um conjunto de fatores, entre os quais a cisão que surgiu na Igreja entre reformadores e conservadores. “O Papa Francisco está em uma situação difícil. De um lado os conservadores fundamentalistas, de outro os progressistas ideológicos que, nesse meio tempo, se tornaram também críticos. Entre os dois, existe uma grande zona intermediária que é satisfeita e feliz, ou seja, muitas vezes indiferente. Os conservadores fundamentalistas têm criticado o pontificado desde o início. Eles nunca gostaram deste papa. "Ele não se comporta ou fala como um papa deveria." Mas a crítica ao estilo é apenas a forma externa. Vai fundo. Eles perguntam: ele ainda é realmente católico? Ao mesmo tempo, por eles o ser católico assume parcialmente formas identitárias, prende-se no aborto e contra as paradas gays e os homossexuais, como fez também o Patriarca Kirill”.
Do outro lado, na "esquerda", estão os críticos progressistas. “Dizem: este papa não quer reformas. De fato, ele faz muitas reformas, até demais para a direita, mas não quer todas as reformas liberais como no Caminho Sinodal Alemão. Ele não é um reformador liberal, mas um reformador radical que quer reformar a Igreja desde a raiz (radix), isto é, desde o Evangelho”.
A Igreja, segundo o cardeal Kasper, está enfrentando uma crise de identidade. “A mudança significa desordem e traz crise, e seria desonesto não falar abertamente: a Igreja está em uma crise profunda. Pode-se até falar de uma crise de identidade. O que ainda é válido no processo de transformação em que nos encontramos, o que deve permanecer válido e o que precisa urgentemente ser reformado?”
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“Esperamos manter Francisco por mais alguns anos, seus sucessores concluirão suas reformas”, fala o cardeal Kasper - Instituto Humanitas Unisinos - IHU