09 Mai 2022
Na manhã do dia 06 de maio, no Palácio Apostólico Vaticano, o Papa Francisco recebeu em audiência os participantes na sessão plenária do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos e dirigiu-lhes o discurso que reproduzimos a seguir. O texto foi publicado por Sala de Imprensa da Santa Sé, 06-05-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Senhores cardeais, caros Irmãos Bispos e Sacerdotes,
Caros Irmãos e Irmãs!
Saúdo a todos de coração e agradeço ao Cardeal Koch as palavras que me dirigiu em nome de vocês, membros, consultores e colaboradores do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.
Conclui-se hoje a Plenária do vosso Conselho termina, que finalmente foi possível mantê-la de forma presencial depois de ter sido adiada várias vezes devido à pandemia. Esta, com seu trágico impacto na vida social do mundo inteiro, também influenciou fortemente as atividades ecumênicas, impedindo nos últimos dois anos a realização dos contatos habituais e de novos projetos. Ao mesmo tempo, porém, a crise sanitária foi também uma oportunidade para fortalecer e renovar as relações entre os cristãos.
Um primeiro resultado ecumênico significativo da pandemia foi a renovada consciência de que todos pertencemos à única família cristã, uma consciência enraizada na experiência de compartilhar a mesma fragilidade e de poder confiar apenas na ajuda que vem de Deus.
Paradoxalmente, a pandemia, que nos obrigou a manter distância uns dos outros, nos fez entender o quão próximos realmente somos uns dos outros e o quanto somos responsáveis uns pelos outros. É fundamental continuar a cultivar esta consciência e fazer britar dela iniciativas que tornem explícito e aumentem este sentimento de fraternidade.
E sobre isso gostaria de enfatizar: hoje não é possível para um cristão, não é praticável seguir sozinho com a própria confissão. Ou vamos juntos, todas as confissões fraternas, ou não se caminha. Hoje a consciência do ecumenismo é tal que não se pode pensar em seguir o caminho da fé sem a companhia dos irmãos e das irmãs de outras Igrejas ou comunidades eclesiais. E isso é uma grande coisa. Sozinhos, nunca. Nós não podemos. De fato, é fácil esquecer essa verdade profunda. Quando isso acontece com as comunidades cristãs, nos expomos seriamente ao risco da presunção de autossuficiência e autorreferencialidade, que são graves obstáculos para o ecumenismo. E nós o vemos.
Em alguns países há certas retomadas egocêntricas - por assim dizer - de algumas comunidades cristãs que são um voltar para trás e não poder avançar. Hoje, ou se caminha todos juntos ou não se pode caminhar. Esta consciência é uma verdade e uma graça de Deus.
Mesmo antes do fim da emergência sanitária, o mundo inteiro se viu prestes a enfrentar um novo e trágico desafio, a guerra em curso na Ucrânia. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, nunca faltaram guerras regionais - muitas! Vamos pensar em Ruanda, por exemplo, há 30 anos, só para citar uma, mas vamos pensar no Mianmar, vamos pensar... Mas como estão distantes, nós não as vemos, enquanto esta é próxima e nos faz reagir - tanto que muitas vezes falei de uma Terceira Guerra Mundial em pedaços, espalhada por quase toda parte.
No entanto, esta guerra, cruel e sem sentido como qualquer guerra, tem uma dimensão maior e ameaça o mundo inteiro, e não pode deixar de interpelar a consciência de cada cristão e de cada Igreja. Devemos nos perguntar: o que fizeram as Igrejas e o que podem fazer para contribuir "para o desenvolvimento de uma comunidade mundial, capaz de realizar a fraternidade a partir de povos e nações que vivam a amizade social" (Enc. Fratelli tutti, 154)? Essa é uma pergunta a que precisamos pensar juntos.
No século passado, a consciência de que o escândalo da divisão dos cristãos teve um peso histórico na geração do mal que envenenou o mundo com lutos e injustiça, levou as comunidades crentes, sob a orientação do Espírito Santo, a desejar a unidade pela qual o Senhor orou e deu a sua vida.
Hoje, diante da barbárie da guerra, este anseio de unidade deve ser novamente alimentado. Ignorar as divisões entre os cristãos, por hábito ou resignação, significa tolerar aquela poluição dos corações que torna fértil o terreno para os conflitos.
A proclamação do evangelho da paz, aquele evangelho que desarma os corações antes mesmo que os exércitos, só será mais credível se anunciada pelos cristãos finalmente reconciliados em Jesus, Príncipe da paz; Cristãos animados por sua mensagem de amor e fraternidade universal, que ultrapassa as fronteiras da própria comunidade e da própria nação. Voltemos ao que eu disse: hoje, ou caminhamos juntos ou vamos ficar parados. Não se pode caminhar sozinhos. Mas não porque é moderno, não: porque o Espírito Santo despertou esse sentido de ecumenismo e de fraternidade.
Deste ponto de vista, a vossa reflexão sobre como celebrar ecumenicamente os 1700 anos do primeiro Concílio de Niceia, que acontecerá em 2025, representa uma contribuição preciosa.
Apesar dos acontecimentos conturbados da sua preparação e sobretudo do longo período de recepção que se seguiu, o primeiro Concílio Ecumênico foi um evento de reconciliação para a Igreja, que de forma sinodal reafirmou a sua unidade em torno da profissão da própria fé.
O estilo e as decisões do Concílio de Niceia devem iluminar o atual caminho ecumênico e fazer amadurecer novos passos concretos para o objetivo do pleno restabelecimento da unidade dos cristãos. Uma vez que o 1700º aniversário do primeiro Concílio de Niceia coincide com o ano jubilar, espero que a celebração do próximo jubileu tenha uma dimensão ecumênica relevante.
Visto que o primeiro Concílio Ecumênico foi um ato sinodal e também manifestou a sinodalidade em nível da Igreja universal como forma de vida e organização da comunidade cristã, quero ressaltar o convite que, juntamente com o Secretaria Geral do Sínodo, o vosso Conselho dirigiu às Conferências Episcopais, pedindo-lhes que procurem meios de ouvir, durante o atual processo sinodal da Igreja Católica, também as vozes dos irmãos e das irmãs de outras confissões sobre as questões que interpelam a fé e a diaconia no mundo de hoje . Se realmente queremos ouvir a voz do Espírito, não podemos deixar de ouvir o que ele disse e está dizendo a todos aqueles que nasceram de novo "da água e do Espírito" (Jo 3, 5).
Caminhar em frente, caminhar juntos. É verdade que o trabalho teológico é muito importante e devemos refletir, mas não podemos esperar para fazer o caminho da unidade até que os teólogos entrem em acordo. Um grande teólogo ortodoxo certa vez me disse que ele sabia quando os teólogos entrariam em acordo. Quando? No dia seguinte ao juízo final, ele me disse. Mas enquanto isso? Caminhar como irmãos, em oração juntos, nas obras de caridade, na busca da verdade. Como irmãos. E esta irmandade é para todos nós.
Caros amigos, encorajo-vos a continuar no vosso serviço exigente e importante, e acompanho-vos com a minha constante proximidade e gratidão. Peço ao Senhor que vos abençoe e, por favor, não se esqueçam de orar por mim. Obrigado.
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Ou vamos juntos ou não se caminha, constata o Papa Francisco falando sobre o ecumenismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU