25 Março 2025
"Duas capturas do horror para fotografar a violência dos confrontos na República Democrática do Congo e a culpável incapacidade da comunidade internacional de detê-la. 'Os contêineres refrigerados e os necrotérios estão cheios, estaremos ocupados por vários dias com enterros em massa'", declarou ao jornal francês Le Monde a responsável da Cruz Vermelha Internacional em Goma, capital da província do Norte Kivu.
A informação é de Enzo Nucci, publicado por Settimana News, 23-03-2025.
Entre os cadáveres, também estão os de centenas de mulheres estupradas e queimadas vivas na seção feminina de uma prisão durante uma fuga em massa. Impossível determinar as responsabilidades pelo massacre, pois aos peacekeepers da missão da ONU (MONUSCO) foi impedido realizar inspeções. 500 mil deslocados, 3 mil mortos, pelo menos 6 mil feridos entre a população civil, é o balanço parcial da ofensiva militar do Movimento 23 de Março (M23) que resultou na ocupação de Goma no dia 27 de janeiro.
Mais um capítulo de um conflito enraizado que, entre 1997 e 2003, causou mais de 5 milhões de mortos e que deixou de ser um confronto entre exércitos e grupos armados para se transformar em uma guerra atípica travada por uma infinidade de bandas armadas contra civis indefesos.
A narrativa dos interesses em jogo é tão intrincada quanto a savana, dada a multiplicidade de atores envolvidos, a competição interna nas próprias alianças, os equilíbrios geopolíticos da região, e as riquezas em disputa: é o termômetro dessa África complexa e multipolar com a qual o mundo precisa lidar, pois desviar o olhar dos acontecimentos em nome de uma conveniência de curto prazo pode, em breve, abrir a caixa de Pandora. O M23 surgiu em 2009 devido à falta de integração de uma milícia anterior no exército governamental congolês: é o mais recente de uma série de grupos apoiados por Ruanda que afirmam defender os interesses das comunidades tutsi que vivem no nordeste do Congo.
Após 10 anos de inatividade, em 2021, o M23 lançou uma ofensiva (apoiada pelo exército ruandês), culminando em janeiro com a conquista de Goma, cidade que havia sido ocupada brevemente em 2012. Um sucesso militar que teve repercussões em Kinshasa, capital da RDC, onde milhares de manifestantes (sustentados por representantes do governo e pelo partido de maioria do presidente Tshisekedi) expressaram solidariedade aos soldados do governo, atacaram várias embaixadas e ainda acusaram a União Europeia de financiar o exército de Kigali com 20 milhões de euros para sua ação determinante na província de Cabo Delgado, no nordeste de Moçambique, defendendo as empresas energéticas que operam lá (como ENI e Total) contra os ataques de terroristas islâmicos.
Segundo os relatórios da ONU, são 4 mil os militares do exército ruandês que, no leste do Congo, praticam uma limpeza étnica sistemática, utilizando o estupro em massa como arma de guerra, sem que o Conselho de Segurança ou a comunidade internacional adotem medidas concretas contra os soldados do presidente Paul Kagame, além de condenações genéricas e convites à retirada.
Ruanda é visto como um dos poucos parceiros confiáveis para a segurança do Ocidente, pois é o país que mais contribui e de forma eficiente para a constituição das forças de paz, uma reputação fortalecida pela figura de Kagame e pelos resultados obtidos na reconstrução do país após o genocídio de 1994. E por suas indiscutíveis capacidades diplomáticas que lhe garantem relações amigáveis com os Estados Unidos, Inglaterra e França, que são três dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Sem esquecer a União Europeia, que assinou com o presidente ruandês um protocolo de intenções (no valor de 900 milhões de euros) para promover 'cadeias de valores sustentáveis e resilientes em minerais críticos', como o tântalo. Um acordo que gerou acusações do Congo contra Ruanda pelo saque de seus recursos, começando pelo coltan, realizado no Norte Kivu com a cumplicidade do M23: não por acaso – destaca a ONU – houve um aumento nas exportações de coltan por Ruanda após a ocupação da zona de Rubaya (na RDC) em abril de 2024 pelo M23.
Todas as iniciativas de paz estão naufragando e o conflito corre o risco de se expandir para outras regiões. Contra o expansionismo de Kagame, estão os vizinhos Burundi e Uganda, que assinaram com o Congo acordos de cooperação econômica e militar.
Kagame, por sua vez, acusa a África do Sul de ter interesses minerários no Congo, explicando assim a intervenção militar de Pretória na missão da SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral). Enquanto isso, o M23 também despertou conflitos entre populações locais, unindo uma parte da oposição ao presidente congolês. Em suma, é preciso agir rápido.