14 Março 2024
Durante o comunismo, o padre dominicano polonês Pawel Guzynski foi ativista do movimento “Liberdade e Paz” e colaborador das estruturas clandestinas do Solidarnosc. Foi premiado com a Cruz da Liberdade e da Solidariedade. Hoje o religioso é um rosto conhecido na televisão e colunista de várias mídias em seu país e além: ele comenta e escreve sobre questões sociais e políticas, bem como espirituais. É acadêmico em Rotterdam.
A entrevista é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 13-03-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Padre Guzynski, pode descrever a situação ucraniana do ponto de vista polonês?
A guerra na Ucrânia faz parte da luta global pelo poder. É uma tentativa de mudar a ordem geopolítica internacional, que foi formada após a Segunda Guerra Mundial e depois modificada após a queda do Muro. Para a Polônia, que está localizada geográfica e politicamente entre o Leste e o Oeste, essas mudanças tiveram consequências muito negativas. Como escreveu Timothy Garton Ash, apenas A Revolução Polonesa: Solidarnosc é lembrada com benevolência.
Quais são as relações entre os povos polonês e ucraniano?
Depois de dois anos de guerra, os poloneses ainda querem ajudar os ucranianos. Fazemos isso nos âmbitos de apoio humanitário e militar. Muitas instituições, associações e amizades pessoais desempenham um papel importante. A ‘energia humanitária’ diminuiu desde o início da agressão russa, mas ainda é significativa. Estamos também cientes de que agimos no interesse da nossa própria segurança; e que os russos estão fazendo muito para dividir poloneses e ucranianos.
O Papa pediu à Ucrânia “a coragem da negociação, que nunca é uma rendição”: o que pensa disso?
O Pontífice é infalível em matéria de fé e moral. Mas sobre o tema da guerra na Ucrânia, Francisco é claramente condicionado pelo contexto cultural em que cresceu e atuou como Bispo sul-americano. Acho que pela primeira vez na minha vida sinto falta de João Paulo II. O Papa polonês jamais teria dito algo assim. Francisco parece não compreender plenamente quem é Putin e o que é a Rússia. Esse é o seu ponto fraco.
Por que você acha que Bergoglio se dirigiu apenas a um lado, a Ucrânia, e não também à Rússia?
O Papa Francisco absorveu suspeitas em relação aos Estados Unidos e aos colonizadores europeus na América do Sul quase do leite materno. Ele se recusa totalmente a ser o Papa da OTAN e dos Estados Ocidentais. Por essa razão, parece idealizar as aspirações da Rússia como sufocadas pelo Ocidente. E assim, as declarações do Papa parecem mais próximas da retórica do Kremlin.
Como reagiram na Polônia a essas últimas palavras do Papa?
Os poloneses recordam que o Papa Gregório XVI condenou a insurreição polonesa contra a Rússia em 1830. É por isso que as palavras do Papa Francisco não são compartilhadas. Tais palavras são inaceitáveis para nós e, além disso, muito prejudiciais para toda a Igreja.
Na sua opinião, a Ucrânia está disponível à negociação?
A Rússia não está respeitando nenhum acordo. Onde há espaço para a negociação? A Ucrânia deve defender-se da agressão russa, e os países que podem devem ajudá-la a fazê-lo, porque a alternativa é um conflito global.
Quem define as responsabilidades da Rússia e da Ucrânia?
A Ucrânia não provocou a Rússia de forma alguma. A Rússia é o agressor e a Ucrânia é a vítima das ambições imperialistas russas.
O que sabe sobre a possível presença de tropas da OTAN na Ucrânia?
A Ucrânia tem apoio militar da OTAN aqui na Polônia. Soldados da Ucrânia estão em treinamento nos centros da OTAN. E militares da OTAN já estão na Ucrânia como conselheiros.
Você teme a escalada militar e o conflito nuclear?
Quanto se tem pela frente a Rússia de Putin, todos os receios são racionais e completamente justificados.
Você acha que uma trégua é possível em tempos relativamente curtos?
Uma trégua só será alcançável se a Rússia for detida pela força. Portanto, todos nós na Europa, temos o dever de contribuir para isso. É hora de abandonar todas as ilusões e aprender com os erros que a Europa cometeu antes da Segunda Guerra Mundial.
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“Bergoglio idealiza a Rússia de Putin, é influenciado pelo antiamericanismo”. Entrevista com Pawel Guzynski - Instituto Humanitas Unisinos - IHU