29 Agosto 2023
“O Papa Francisco nunca incentivou ideias imperialistas”. É a resposta da nunciatura apostólica na Ucrânia à dura condenação de Kiev, que classificou as palavras de Bergoglio aos jovens russos como 'propaganda imperialista'. As declarações de Francisco suscitaram “grande decepção” também na Igreja Católica Ucraniana que imediatamente pediu à Santa Sé uma explicação sobre a situação, aguardando um encontro com o Papa que se realizará em breve no Vaticano e no qual será reafirmada a mesma posição crítica às suas palavras. A resposta veio através dos canais diplomáticos da Santa Sé: “A nunciatura apostólica na Ucrânia revelou que, após a ligação telemática do Papa Francisco com os jovens católicos da Federação Russa, ocorrida em 25-08-2023, na Ucrânia surgiram discussões nos meios de comunicação social e internacionais sobre algumas palavras pronunciadas pelo Romano Pontífice naquela ocasião”.
A reportagem é de Francesco Antonio Grana, publicada por Il Fatto Quotidiano, 29-08-2023.
“Em particular, segundo algumas interpretações, o Papa Francisco incentivou os jovens católicos russos a tomarem como exemplo algumas figuras históricas russas, conhecidas pelas suas ideias e ações imperialistas e expansionistas, levadas a cabo em detrimento dos povos vizinhos, incluindo o ucraniano. Esta representação pontifícia rejeita firmemente as interpretações acima mencionadas, uma vez que o Papa nunca encorajou ideias imperialistas. Pelo contrário, é um ferrenho opositor e crítico de qualquer forma de imperialismo ou colonialismo, em todos os povos e situações. As palavras do Pontífice Romano, pronunciadas em 25 de agosto, também devem ser interpretadas nesta mesma chave”.
Posição posteriormente reafirmada também pelo diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni: "Nas palavras de saudação dirigidas de improviso a alguns jovens católicos russos nos últimos dias, como resulta do contexto em que as pronunciou, o Papa pretendia encorajar os jovens a preservar e promover tudo o que há de positivo na grande herança cultural e espiritual russa, e certamente não exaltar a lógica imperialista e as personalidades governamentais, citadas para indicar alguns períodos históricos de referência".
Em videoconferência com os jovens russos reunidos em São Petersburgo por ocasião do X Encontro Nacional da Juventude Católica da Rússia, Bergoglio afirmou: “Não esqueçam o legado. Sois herdeiros da grande Rússia: a grande Rússia dos santos, dos reis, a grande Rússia de Pedro o Grande, de Catarina II, esse grande e culto império russo, com tanta cultura, tanta humanidade. Nunca desistam deste legado. Vocês são os herdeiros da grande Mãe Rússia, vão em frente. E obrigado. Obrigado pelo seu jeito de ser, pelo seu jeito de ser russo”. Palavras que foram retiradas da transcrição oficial do discurso do Papa publicada pelo Vaticano, mas que vazaram de qualquer maneira.
Nos palácios sagrados são reiteradas as declarações feitas recentemente por Francisco em total harmonia com o seu magistério sobre a paz: “Rezemos pelos nossos irmãos e irmãs ucranianos: eles sofrem tanto. A guerra é cruel! Tantas crianças desaparecidas, tantas pessoas mortas. Vamos orar, por favor! Não esqueçamos a maltratada Ucrânia”.
Mas também outro apelo recente de Bergoglio: “Por favor, não cedamos à lógica da oposição, não nos deixemos influenciar pela linguagem do ódio. Na conjuntura dramática que a Europa atravessa, com a continuação da guerra na Ucrânia, somos chamados a um salto de responsabilidade. A minha esperança é que haja espaço para vozes de paz, para aqueles que estão empenhados em pôr fim a este como tantos outros conflitos, para aqueles que não se rendem à lógica 'cainista' da guerra, mas continuam a acreditar, apesar tudo, no sentido da paz, à lógica do diálogo, à lógica da diplomacia”.
São palavras combinadas com os esforços diplomáticos e humanitários do Papa na difícil tentativa de findar o conflito. Bergoglio também revelou a sua vontade “de nomear um representante permanente para servir de ponte entre as autoridades russas e ucranianas. Para mim, no meio da dor da guerra, é um grande passo”.
Mas não é a única iniciativa em curso daquilo que Francisco definiu como uma ofensiva pela paz. “Além disso, para novembro”, anunciou o Papa, “antes da realização da reunião das Nações Unidas sobre o clima no Dubai, estamos organizando um encontro de paz com líderes religiosos em Abu Dhabi. O cardeal Pietro Parolin coordena esta iniciativa, que pretende realizar-se fora do Vaticano, num espaço neutro que convide a todos ao encontro”.
Bergoglio também refletiu sobre a missão de paz confiada ao cardeal D. Matteo Maria Zuppi, presidente da Conferência Episcopal Italiana e arcebispo de Bolonha: “Depois da visita do cardeal Zuppi a Washington, a próxima parada prevista é Pequim, porque ambos também têm a chave para baixar a tensão do conflito”. E acrescentou: “O cardeal Zuppi está trabalhando muito como diretor de diálogos. Já foi para Kiev, onde mantém a ideia de vitória sem optar pela mediação. Esteve também em Moscou, onde encontrou uma atitude que poderíamos definir como diplomática por parte da Rússia. Os progressos mais significativos realizados dizem respeito ao regresso das crianças ucranianas ao seu país. Estamos fazendo tudo ao nosso alcance para garantir que qualquer membro da família que busque o retorno de seus filhos possa fazê-lo”. Mas é evidente que a tensão ainda é muito elevada.
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“Propaganda imperialista? Francisco rejeita firmemente estas interpretações”. O Vaticano responde às acusações feitas contra o Papa por Kiev e pela Igreja Ucraniana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU