15 Agosto 2023
E mais: incêndios no Canadá, desmatamento e a playlist da quinzena.
A informação é publicada por Observatório do Clima (OC), 14-08-2023.
O PAC está de volta, 16 anos depois. A sigla continua a mesma, mas seu conteúdo… quanta diferença! O pacote de infraestrutura do governo Lula 2, que tornou-se símbolo do desenvolvimentismo predatório que levou a Belo Monte e afetou o combate ao desmatamento, reencarnou no governo Lula 3 com uma roupagem ESG. A cerimônia de lançamento, ontem no Rio, teve discursos apaixonados em defesa do combate à mudança do clima vindos do núcleo duro econômico do governo. Obras com polêmicas ambientais foram excluídas da lista ou enviadas para estudos. E o ministro da Fazenda apresentou um Plano de Transformação Ecológica com ares de “green deal”, que funcionará em coordenação com o Programa de Aceleração do Crescimento.
A prova do pudim, como dizem os ingleses, está no seu gosto; o governo brasileiro ainda tem uma raiz desenvolvimentista linha-dura, interessada em brita, asfalto e concreto, e 80% dos investimentos em energia ainda estão comprometidos com combustíveis fósseis. O Brasil operou nas negociações da Cúpula da Amazônia para não ter nenhuma restrição à exploração de hidrocarbonetos, e descobrimos, em Belém, que o ministro de Minas e Energia é um negacionista climático que diz ter “estudos” que contradizem o IPCC. Mas a “aliança estratégica” proposta por Fernando Haddad entre meio ambiente e desenvolvimento pode ser um sinal de que algo se mexeu no pensamento econômico brasileiro. “Unir o país contra o desmatamento e o aquecimento global é produzir mais empregos de qualidade no nosso país”, disse o ministro. A gente já sabia disso. Mas amém, ministro.
Perdi a conta da quantidade de crimes ambientais, violações de direitos, violação de consulta prévia, livre e informada, subsídios multibilionários e graves impactos socioambientais em geral para favorecer a mineração e o agronegócio dessa lista de obras. Mas tem COP! https://t.co/bq4IkQwxG1
— Maurício Angelo (@distopi) August 15, 2023
Boa leitura.
Encontro em Belém teve avanços, ausências, oportunidades perdidas e uma traição
A 4ª Cúpula da Amazônia acabou na última quarta-feira (9) em Belém e a pergunta de sempre permanece: o copo está mais cheio ou mais vazio?
Embora tenha sido inovadora ao trazer a sociedade civil em massa para três dias de debates e ao reconhecer a ciência no objetivo central de evitar o ponto de não-retorno da Amazônia, a cúpula foi vitimada pelo mesmo problema de outros eventos multilaterais: ela não consegue dar resposta satisfatória ao contexto de emergência climática em que vivemos.
Destacamos abaixo algumas mensagens-chave da reunião de Belém – as boas e as ruins.
O que foi bom:
O que foi ruim:
A opção por ignorar a discussão sobre eliminação dos combustíveis fósseis na Declaração de Belém não é uma surpresa. A falta de metas para uma transição energética eficiente reforça o caminho escolhido pelos países para o enfrentamento (ou não) da crise climática. Muitos países da América Latina seguem investindo na indústria de combustíveis fósseis. O Brasil, por exemplo, quer saltar de nono produtor de petróleo no mundo para a quarta posição. Já a Guiana tem a ambição de entrar no ranking por causa de grandes reservas petrolíferas descobertas recentemente. A Bolívia, que possui reservas de gás chegando ao fim, lançou novos projetos de exploração que incluem a busca por petróleo na Amazônia. Peru, Equador e Venezuela também têm seus planos ativos. A exceção é justamente a Colômbia, onde o presidente Gustavo Petro batalha com o Congresso para aprovar medidas contra a exploração de carvão, o fracking e caminhar para uma transição justa.
Dezesseis anos depois de criar um problemático Programa de Aceleração do Crescimento que nos legou tragédias socioambientais como Belo Monte, Lula voltou à carga – desta vez, aparentemente, com lições aprendidas. Nesta sexta-feira (11), o presidente reuniu autoridades no Teatro Municipal do Rio de Janeiro para anunciar o Novo PAC, com investimentos previstos de R$ 1,4 trilhão até 2026.
Se o PAC-1 tinha como “mãe” a nacional-desenvolvimentista Dilma Rousseff, a nova versão do programa parece ter Marina Silva como madrinha: todo trabalhado no ESG, o PAC 2023 excluiu algumas obras ambientalmente polêmicas, como a BR-319, e mandou outras para estudos, como a exploração de petróleo na Margem Equatorial e a Ferrogrão, ferrovia que cortaria áreas protegidas no sul do Pará. Lula e ministros falaram sobre a necessidade de usar os investimentos em infraestrutura para promover a transição energética e o combate ao aquecimento global. E sobre “evitar erros cometidos no passado”. O presidente chegou a citar como exemplo as centenas de bilhões de dólares investidos pelos EUA e pela União Europeia em seus “green deals”, como ficaram conhecidos os programas de investimento em economia verde.
Mas o ponto alto dos discursos foi o do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O paulista deu algumas pinceladas do Plano de Transformação Ecológica, que sua equipe vem construindo e que, segundo o ministro, “agrega ao PAC”. “Trata-se da criação de uma nova conduta e postura em relação ao meio ambiente. Um novo tipo de interação com a natureza e a vida de todo o planeta”, disse Haddad.
Estruturado em seis eixos, entre eles bioeconomia, finanças sustentáveis, adensamento tecnológico, economia circular e transição energética, o plano é a aposta de Haddad para um “novo ciclo de desenvolvimento” do país.
Se é amor ou cilada ainda está para ser visto, mas Haddad parece determinado a finalmente usar as vantagens comparativas ambientais do país para impulsionar o crescimento com base numa economia verde. “Unir o país contra o desmatamento e o aquecimento global é produzir mais empregos de qualidade no nosso país”, disse o ministro. Oremos.
Há dois meses, os incêndios florestais no Canadá ganharam o noticiário internacional. A fumaça resultante das queimadas em junho foi tão intensa que chegou a mudar a paisagem em Nova York. De lá pra cá, o fogo não arrefeceu, como mostrou Priscila Pacheco direto do Canadá nesta reportagem. O país segue enfrentando a pior temporada de incêndios por área queimada da sua história, agravada pelas condições climáticas. Até o momento, foram ao menos 13,4 milhões de hectares devastados pelo fogo. O recorde anterior era de 1995, quando 7,1 milhões de hectares foram queimados no ano inteiro. Outro recorde negativo foi registrado nas emissões de gases-estufa resultantes das queimadas: de janeiro a julho deste ano, foram 290 milhões de toneladas em emissões de carbono por causa dos incêndios florestais. É quase quatro vezes mais a média do que foi emitido entre 2003 a 2022. O Canadá solicitou apoio internacional para combater as queimadas, e o Brasil é um dos países que ajudam na força-tarefa, com uma equipe do Ibama.
Apresentados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) na semana passada, os dados finais de alertas de desmatamento para o mês de julho trouxeram boas notícias para a Amazônia e péssimas para o Cerrado. Na floresta, houve queda de 66% nos alertas no mês, na comparação com o mesmo mês em 2022. Foi a segunda menor área sob alertas em toda a série histórica, iniciada em 2015. Entre janeiro e julho, a queda nos alertas foi de 42,5%, na comparação com o mesmo período do ano anterior. Entre agosto de 2022 e julho de 2023, os alertas caíram 7,4%. Já no Cerrado, o cenário é oposto. O segundo maior bioma do país registrou alta de 26% nos alertas de desmatamento em julho, na comparação com julho de 2022. Entre agosto de 2022 e julho de 2023, a alta é de 16,5%.
“Itamaraty”, da banda Fruto Sensual. No embalo da Cúpula da Amazônia, este belo espécime do tecnobrega de Belém não poderia ter um título melhor.
“Amor que senti”, da peruana Rossy War com o rei da guitarrada paraense Félix Robatto. Atenção às referências amazônicas e ao refrão precioso em portunhol.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O PAC “ESG” e os recados da Cúpula da Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU