11 Agosto 2023
Apesar dos compromissos, a Declaração de Belém falha em refletir o nível de ambição esperado pela sociedade civil presente à Cúpula da Amazônia.
A reportagem é de Cínthia Leone, publicada por Instituto ClimaInfo e reproduzida por EcoDebate, 10-08-2023.
A sociedade civil dos países amazônicos imprimiu um novo nível de ambiência climática na região durante a Cúpula da Amazônia, encerrada na quarta-feira (9) em Belém (PA).
Cerca de 27 mil pessoas vieram ao encontro – ante uma expectativa de 10 mil –, tamanho comparável a uma COP. A intensa mobilização resultou na formação de grupos de incidência de “Belém a Belém”, pressionando por mais ambição nas COPs 28 e 29, durante a presidência brasileira do G20, em 2024, e culminando na COP30 em 2025, de volta a Belém. Antes disso, uma nova cúpula foi sugerida para 2025, na Colômbia.
A Cúpula Amazônica foi realizada no âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) que nunca havia tido um papel operacional de fato. A declaração final dá novas atribuições e metas à organização e estabelece entendimentos em áreas-chave, como finanças, monitoramento do uso da terra e segurança, sobretudo o combate ao crime organizado transfronteiriço e atrelado aos crimes ambientais. O documento também aborda o compromisso de reconhecer, demarcar e proteger os territórios dos Povos Originários e Tradicionais.
O texto, entretanto, falha em refletir o nível de ambição esperado pela sociedade civil presente à Cúpula.
A declaração não aborda os temas climáticos mais importantes e politicamente sensíveis, como o fim da exploração de combustíveis fósseis na Amazônia. O pedido dos movimentos sociais em Belém para que as nações amazônicas liderem o fim do uso de combustíveis fósseis, clamando por mais ação do Norte Global, dentro da estratégia necessária para evitar o ponto de colapso da Amazônia, também foi ignorado.
Isso teria colocado pressão nos países mais poluentes e ricos às portas do G20, Assembleia Geral da ONU e COP28, aumentando as chances de algum avanço nas negociações deste ano.
Al Jaber, presidente da COP28, esteve em Belém para uma reunião fechada e pouco transparente. As informações de observadores são de que sua visita focou em novos projetos de gás no Brasil. Durante a Cúpula, o ministro da Energia brasileiro Alexandre Silveira deu uma entrevista onde demonstrou negacionismo da ciência do clima.
A meta comum de desmatamento zero até 2030, grande aposta dos governos brasileiro e colombiano, também ficou de fora do texto. Como nenhum líder se opôs publicamente a este entendimento, há especulações sobre quem seriam os bloqueadores. A Bolívia, que está registrando taxas recordes de perda florestal, lidera a lista de suspeitos.
Uma estimativa de desmatamento em toda a Pan-Amazônia divulgada agora indica que a Floresta já perdeu 17% de sua cobertura original nos oito países. Cientistas estimam que se a floresta chegar a 20% de desmatamento, entrará em uma espiral de colapso potencialmente irreversível, convertendo-se em uma savana tropical seca e pobre em vida.
O texto pactuado tem 113 parágrafos e uma grande parte deles aborda aspectos de desenvolvimento e finanças, com ênfase na necessidade comum de impulsionar outras cadeias produtivas aliadas à floresta, o que está sendo chamado de bioeconomia.
Entre os anúncios paralelos à Cúpula no tema de finanças está a criação da Coalizão Verde pela Amazônia, liderada pelo BNDES e o BID e com adesão de 19 bancos públicos e privados da região amazônica.
O destaque do segundo dia da Cúpula foi a diplomacia entre os amazônicos e as duas principais regiões de floresta tropical do mundo, localizadas na bacia do Congo e na Indonésia. A ideia de Lula de unir as vozes dos grandes países florestais nas negociações de clima é tão boa quanto complexa, e se os países amazônicos mostraram ter posições conflitantes entre si, a diversidade de entendimento em relação aos africanos e asiáticos foi naturalmente maior.
Nenhum pacto foi firmado, mas uma declaração conjunta clamou outros países em desenvolvimento e ricos em biodiversidade a se engajarem nos diálogos para negociação conjunta na COP28 e além.
Um encontro específico das três grandes bacias florestais será realizado em outubro, em Brazzaville, no Congo. Antes disso, em setembro, os africanos farão uma cúpula no Quênia onde devem alinhar entendimentos sobre temas financeiros, climáticos e de biodiversidade.
“Nós vamos à COP28 dizer precisamente ao mundo rico que se quiserem preservar efetivamente o que existe de floresta é preciso colocar dinheiro, não apenas nas copas das florestas, mas na vida do povo que nela habita e que quer viver decentemente”, disse Lula em uma breve declaração à imprensa.
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Resultados da Cúpula da Amazônia decepcionam - Instituto Humanitas Unisinos - IHU