22 Janeiro 2008
Depois de comemorar o primeiro aniversário no dia 21-01-2008, “o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) sinaliza que a política fiscal, ao longo do segundo mandato de Lula, deverá ser mais flexível”, avalia o economista Fernando Ferrari Filho da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Entretanto, o programa só auxiliará no crescimento econômico se o Branco Central adotar políticas menos ortodoxas, “for menos conservador, em termos monetários e cambiais”. A retomada do crescimento, explica o especialista, requer “redução das taxas de juros, câmbio competitivo, política fiscal expansionista e reforma tributária”.
Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, o economista disse que o assentamento da recessão econômica nos Estados Unidos, uma possível crise energética no Brasil e o fim da CPMF podem comprometer os investimentos do PAC no próximo ano, deixando o sonho do crescimento econômico sustentável ainda “mais longe”.
Para garantir o desenvolvimento brasileiro, o câmbio deve ser competitivo e, para isso, acrescenta: “administração da taxa de câmbio e controle de capitais, na entrada, são fundamentais para evitar a apreciação do real frente às principais moedas de conversibilidade internacional”.
Fernando Ferrari Filho é graduado em Economia, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), mestre em Economia, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), doutor em Economia, pela Universidade de São Paulo (USP), e pós-doutor pela University of Tennessee System (1996). Atualmente, é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Ele publicou, nos Cadernos IHU Idéias n.º 37 o artigo As concepções teórico-analíticas e as proposições de política econômica de Keynes. O texto está disponível nesta página para download.
Eis a entrevista.
IHU On-Line - Qual é a sua avaliação sobre o PAC, um ano após a sua criação? Ele é um marketing político do governo ou um programa que, efetivamente, auxilia no crescimento?
Fernando Ferrari Filho - O PAC sinaliza que a política fiscal, ao longo do segundo mandato de Lula, deverá ser mais flexível. Além de políticas públicas de cunho social e de investimentos em infra-estrutura, o PAC induz a realização de investimentos do setor privado. A questão central é a seguinte: será que uma política fiscal mais flexível é compatível com o conservadorismo do Banco Central (BC), isto é, política monetária restritiva e câmbio valorizado? Em suma, o PAC auxiliará no crescimento se o Banco Central deixar.
IHU On-Line - Quais são os aspectos negativos e positivos do programa? Para que, de fato, ele serviu durante esse período?
Fernando Ferrari Filho - O aspecto positivo é a flexibilização da política fiscal. Em outras palavras, política fiscal expansionista dinamiza a demanda agregada e tem efeito multiplicador sobre os gastos privados, sejam de consumo, sejam de investimento. O aspecto negativo é a morosidade/burocracia de sua implementação, isto é, problemas de licitação acabam obstaculizando a liberação de recursos do PAC.
IHU On-Line - O PAC pode ser considerado a esperança brasileira para a retomada do desenvolvimento? Ele se assemelha de alguma maneira, ao Plano de Metas de Juscelino?
Fernando Ferrari Filho - A política fiscal mais expansionista, ou seja, o PAC, será eficiente se, e somente se, o Banco Central for menos conservador, em termos monetários e cambiais. Retomada do crescimento econômico, com sustentabilidade, passam por um conjunto de medidas, tais como redução da taxa de juros, câmbio competitivo, política fiscal expansionista e reforma tributária, entre outras.
IHU On-Line - Lula diz que o PAC é o começo de uma revolução do setor de saneamento básico no Brasil. O senhor concorda com essa colocação?
Fernando Ferrari Filho - O presidente Lula já expressou tantas idéias e pontos de vista equivocados, tais como a de que o "espetáculo do crescimento" havia iniciado em 2003 (crescimento médio do PIB, entre 2003 e 2007, supondo que no ano passado o PIB tenha crescido 5,2%, da ordem de 3,2% ao ano é espetacular?), que, com certeza, essa asserção é apenas outra.
IHU On-Line - O fato de o governo gastar vários bilhões com infra-estrutura garantirá as condições para o crescimento sustentável posterior?
Fernando Ferrari Filho - Não necessariamente. Mais uma vez, o governo tem que combinar com o Banco Central. Caso contrário, o crescimento econômico continuará sendo pífio e volátil, à la stop-and-go. Se supusermos, ainda, um cenário internacional desfavorável, devido às conseqüências da crise do mercado imobiliário norte-americano e à perspectiva de crise energética no país, o crescimento econômico sustentável fica mais longe.
IHU On-Line - Com o fim da CPMF, o programa deve sofrer alterações?
Fernando Ferrari Filho - A não prorrogação da CPMF pode criar obstáculos adicionais para o cumprimento das metas do PAC. Entretanto, as medidas anunciadas no início do ano, elevação das alíquotas da CSLL e do IOF, podem compensar a perda da receita da CPMF. Como, todavia, está havendo uma revisão de gastos, para que o superávit primário seja mantido, talvez os recursos para o PAC sejam comprometidos.
IHU On-Line - A recessão econômica que vem se estendendo pelos EUA, pode afetar a economia brasileira e atingir de alguma maneira os objetivos do PAC?
Fernando Ferrari Filho - Não tenho dúvidas quanto ao impacto da crise norte-americana sobre a economia brasileira. Os Estados Unidos são responsáveis por cerca de 17,0% das exportações brasileiras. Um cenário internacional desfavorável implica redução do saldo comercial, menos crescimento etc. Ademais, com cenário internacional desfavorável, o Banco Central será mais conservador.
IHU On-Line - O senhor disse que, enquanto o Brasil persistir com as altas taxas de juros, é pouco provável que tenhamos um cenário monetário-cambial propício para assegurar o crescimento econômico sustentável do país. Tendo isso em vista, qual o papel do PAC nesse cenário?
Fernando Ferrari Filho - O PAC é um instrumento eficiente se houver condições monetário-cambial-tributárias que criem um ambiente institucional favorável ao investimento privado.
IHU On-Line - Durante o mandato, Lula reiterou varias vezes que "em time que está ganhando não se muda". Entretanto, no ano passado, vários críticos do governo como Marcio Pochmann, João Sicsu e Coutinho passaram a integrar "um novo time". Como o senhor avalia o ingresso desses desenvolvimentistas no segundo mandato de Lula?
Fernando Ferrari Filho - Sem dúvidas, o Minsitério da Fazenda e alguns setores vinculados ao Ministério do Planejamento são mais desenvolvimentistas. Todavia, é importante ressaltar que, enquanto o Banco Central for conservador, é pouco provável que tenhamos juros e câmbio indutores de crescimento.
IHU On-Line - Avaliando a política econômica, o senhor disse que os regimes monetário, fiscal e cambial não têm alcançado os objetivos esperados. Sendo assim, quais as melhorar urgentes que devem ser realizadas nesse campo?
Fernando Ferrari Filho - O regime de metas de inflação tem que contemplar o controle de preços e a dinâmica produtiva. Em outras palavras, redução de juros é imprescindível. A inflação do ano passado, IPCA de 4,46%, nos mostrou que ela é predominantemente de custos. Juros elevados não têm efeito transmissor sobre inflação de custos. O câmbio tem que ser competitivo. Para tanto, administração da taxa de câmbio e controle de capitais, na entrada, são fundamentais para evitar a apreciação do real frente às principais moedas de conversibilidade internacional. E política fiscal flexível, contra-cíclica. Eis, em meu ponto de vista, a receita para crescermos sustentavelmente.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Programa de aceleração do crescimento. Um ano depois. Entrevista especial com Fernando Ferrari Filho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU