13 Novembro 2025
Outubro bateu um recorde na Cisjordânia. Obviamente um recorde negativo: o maior número de ataques de colonos israelenses contra cidadãos palestinos nos territórios ocupados. “Nossos filhos, meus filhos, vivem segregados. Humilhados diariamente. Essa é a nossa vida. E ninguém tem voz para deter Israel”. Sabrina Mukarker é uma fotógrafa palestina de religião cristã. Sua exposição “Defina Criança” está acontecendo em Roma, no Spazio Culturale Start. Suas fotos testemunham a existência impossível das crianças na Cisjordânia. De Masafer Yatta a Belém. Fotos de alguma forma distópicas, de violência e inocência.
A entrevista é de Letizia Tortello, publicada por La Stampa, 12-11-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Você é uma fotógrafa de renome internacional. Tem visto para viajar e sair da Cisjordânia. Seus filhos estão presos lá. Como é a vida na Cisjordânia?
Quero esclarecer que nasci em Belém e vivo aqui a vida toda. Agora sou casada, mãe de duas crianças lindas e as crio no mesmo lugar onde cresci. Há alguns meses, percebi que toda a minha história se desenrolou em apenas 19 quilômetros quadrados. E essa ideia me deixou louca. Como uma pessoa pode crescer, ir à escola, depois à universidade, se formar, casar, ter filhos e dar-lhes um futuro em 19 quilômetros quadrados? Você tem a sensação de ser livre, mas, ao mesmo tempo, está preso em uma enorme prisão.
Como é a vida cercada por postos de controle?
O número de portões em torno de Belém é absurdo. Um deles fica bem em frente à nossa casa. É por isso que nunca deixo meus filhos brincarem na rua. É algo normal na Palestina: as crianças da vizinhança se encontram depois da escola para jogar futebol. As minhas não. Somos constantemente atacados por colonos e soldados das IDF, porque Israel está tentando roubar cada vez mais terras. É muito difícil, mental e emocionalmente.
As IDF intensificaram o controle após 7 de outubro?
Muito. Incessantemente. Enquanto isso, a cidade, que vivia do turismo, esvaziou-se. Não há segurança. Também estamos pagando o preço de um genocídio, mas de uma perspectiva diferente. O povo de Gaza sofreu de forma impensável, ninguém como eles. Mas nós também não podemos negar nossa dor.
O que acontece nos postos de controle quando você quer sair com seus filhos?
Se você sair de Belém, nunca sabe quando vai conseguir voltar. Se vai levar duas horas ou oito. Não podemos usar as estradas israelenses. Se vamos para Ramallah, não temos certeza de conseguir chegar lá. Se eu quiser ir a Jericó, para passar um dia relaxante de verão com meus filhos — é um lugar lindo para nadar — e for sábado ou domingo à noite e no dia seguinte tiver aula, não tenho certeza se vou conseguir voltar. Às 19h, eles fecham as barreiras. Mas eles dificultam ainda mais quando você sai do trabalho; eles sabem os horários. Se você não chegar a tempo, tem que dirigir uma hora para chegar em casa. Então, durante todo o verão, não fomos a lugar nenhum. Meus filhos não saem de Belém há dois anos.
Quantos anos têm seus filhos?
O mais velho tem 11 anos, o mais novo tem 7. Eles sempre viveram em um lugar onde o estresse é quase insuportável. Até que você explode.
Como reagem diante do exército?
Israel não tem limites. Não há linhas vermelhas, nenhum respeito pelas leis humanas. Matar é legal para eles. Nossas vidas não têm importância. O que nos assusta é que a guerra em Gaza logo possa chegar a Belém. As crianças têm pesadelos com o exército. O mais velho tem mais medo; sua, fica nervoso quando vê um soldado. Eles me perguntam: 'Por que você nos trouxe ao mundo aqui?' Tentamos protegê-los ao máximo do confronto direto.
Como ensinar as crianças a não crescerem no ódio e na vingança?
Eles estão no meio de gás lacrimogêneo. E você precisa encontrar respostas que satisfaçam suas perguntas, mas de uma forma que suas cabeças possam entender. Quando Israel dá uma arma a um jovem de 16, 17 ou 18 anos e diz: 'Aquele é o inimigo chegando, sua família e a existência de Israel dependem dele, atira', ninguém o impedirá. Depois de 7 de outubro, essa brutalidade aumentou cem vezes. Então: quem alimenta a resistência? Meus filhos falam três idiomas, estudam na escola internacional. Talvez se mudem para o exterior. Mas que futuro pode ter quem sequer pode ir a Amã? Quem não pode, se torna um terrorista? É isso que você está dizendo?
Se você continua a me oprimir dia após dia e espera que eu seja pacífico e um bom vizinho, jamais conseguirá obter isso. Se você não tem permissão para viajar, não pode estudar, não consegue encontrar um bom emprego porque não existem. Não há como um jovem construir um futuro sólido. Em algum momento, você chega ao limite e explode. E é aí que nasce a resistência. Netanyahu está disposto a tudo para se manter no governo. Ele não se importa nem com os israelenses.
Com o massacre de 7 de outubro, o Hamas condenou vocês a sofrer o mesmo destino de Gaza?
Todos os palestinos imaginavam que a situação explodiria. Ninguém imaginava nada de semelhante. Condeno a ocupação israelense acima de tudo. Agora eles estão apenas esperando que um de nós tome alguma atitude contra eles. Não apoio a ideologia do Hamas. Não apoio nenhuma ideologia. Nós, palestinos, tentamos de tudo, de Oslo em diante. Israel não quer a igualdade, nem mesmo os partidos de esquerda: eles não querem fazer sacrifícios, apoiam o apartheid. Apenas poucos israelenses têm uma opinião diferente, e eu respeito a sua coragem. Nós, palestinos, estamos completamente sozinhos nessa luta. A Autoridade Palestina de Abbas mostrou ser apenas parte da ocupação israelense.
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