04 Outubro 2025
Greta Thunberg surgiu na cena pública no final de 2018, quando, com apenas 15 anos, iniciou um protesto diário, sentando-se em frente ao Parlamento sueco para exigir medidas climáticas.
Durante anos, foi o rosto visível da luta contra a crise climática. Hoje, em 2025, aos 22 anos, Greta mantém seu discurso ambientalista, mas há meses também abraça outras causas sociais. Em janeiro deste ano, a ativista climática visitou os campos de refugiados saarauís, em Tindouf (Argélia), para demonstrar seu apoio e denunciar a situação do povo saarauí.
Agora, pela terceira vez, tenta chegar à costa de Gaza a bordo da Flotilha Global Sumud. Greta atende ao Público no barco Alma, que ocupa lugar central na expedição humanitária que busca romper o bloqueio israelense à Faixa de Gaza. Menos de 300 milhas náuticas os separam de seu objetivo.
A entrevista é de Néstor Prieto Amador, publicada por Público, 30-09-2025. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Como você está encarando estas últimas horas de travessia?
A cada milha que nos aproximamos de Gaza, estamos mais motivados e decididos a continuar e completar nossa missão de romper o cerco, abrir um corredor humanitário popular e entregar mais ajuda. As ameaças infundadas de Israel não nos deterão.
Em Barcelona, você advertia que, com esta iniciativa, entrávamos em um “território desconhecido” devido ao tamanho da missão atual. O que distingue esta Flotilha Global Sumud (GSF) de iniciativas anteriores?
Trata-se da maior iniciativa humanitária de solidariedade à Palestina na história. Nunca antes tantos barcos partiram com a intenção de romper o cerco israelense a Gaza por mar. Por isso, esta missão não tem precedentes e demonstra a magnitude a dimensão da solidariedade à Palestina. Dezenas de milhares de pessoas se inscreveram para participar desta missão e demonstramos claramente que estamos ao lado da Palestina. A maré está mudando: mais pessoas do que nunca estão dispostas a apoiar a Palestina e agir quando nossos governos não agem.
O próprio Governo israelense levantou a possibilidade de aplicar um protocolo antiterrorista contra nós que viajamos nesta flotilha. Você acha que isto acabará acontecendo ou a pressão internacional forçará uma resposta mais moderada – como uma deportação rápida – para evitar o custo político da detenção de 500 pessoas de 45 nacionalidades?
O que podemos e devemos fazer nestas últimas horas é intensificar a pressão política e midiática para maximizar as chances de alcançar o objetivo da missão: romper o bloqueio e abrir um corredor humanitário para o povo de Gaza. É claro, essas ameaças não irão nos dissuadir; sabemos que o direito internacional está do nosso lado. O direito internacional humanitário e o direito marítimo nos amparam.
Se Israel violar o direito internacional e, mais uma vez, impedir a entrada de ajuda humanitária em Gaza, isso constituirá uma violação da Convenção de Genebra. Portanto, não há razão para nos deterem ou atacarem, porque não somos uma ameaça. Não portamos armas, não temos nada a ver com o Hamas, como dizem... Somos uma missão humanitária pacífica, cujo objetivo é romper de maneira pacífica o cerco ilegal a Gaza.
A organização afirmou que mesmo que pessoas sejam detidas e os barcos interceptados, futuras flotilhas não pararão. Acredita que a pressão internacional será suficiente para sustentar esse movimento e forçar uma mudança real na situação em Gaza?
Fomos muito claros que não pararemos até atingirmos um objetivo, que é libertar a Palestina e alcançar justiça para os palestinos. Esta é a 38ª tentativa de romper o bloqueio marítimo e, quanto a mim, a terceira tentativa de chegar a Gaza. A primeira foi com o barco Consciense [em maio deste ano], quando o barco foi bombardeado algumas horas antes do nosso embarque. Na segunda tentativa, fomos detidos ilegalmente e sequestrados em águas internacionais, transferidos para Israel contra a nossa vontade e, depois, deportados. Desde então, deixamos bem claro que voltaríamos, porque, claro, precisamos continuar tentando e cumprir nossa promessa aos palestinos.
Ainda muito jovem, você ganhou fama de ativista climática. Qual foi o processo que a levou a se envolver na luta pela Palestina e a se juntar a esta flotilha?
O processo que me levou ao envolvimento com a causa palestina foi, simplesmente, a humanidade básica e a convicção de que não pode haver justiça climática sem justiça social. Não posso dizer que me importo com os direitos humanos e o bem-estar das pessoas e do planeta sem, ao mesmo tempo, defender uma Palestina livre. Esta flotilha faz parte desse compromisso e, além disso, ao comprovar que nossos governos não estão cumprindo sua obrigação legal de prevenir um genocídio, lamentavelmente, a responsabilidade recai sobre os cidadãos. Se eu posso usar meu nome e minha plataforma para aumentar a visibilidade e a segurança e para ressaltar a causa palestina, é claro que agirei desse modo.
Este mês de viagem duplicou os prazos iniciais e foi marcado por significativas dificuldades logísticas e organizativas. Como você está vivendo esta experiência internamente?
É claro, esses atrasos e desafios ocorreram pela busca de garantir a máxima segurança dos participantes. Além disso, demonstra ainda mais que isto não deveria recair sobre os cidadãos e a sociedade civil. Estamos assumindo responsabilidades que deveriam corresponder aos governos. Esta missão não deveria existir; a obrigação deveria estar nas mãos daqueles que realmente a têm.
Você mantém contato com pessoas de dentro de Gaza. O que elas transmitem a você, nesses dias tão intensos?
As pessoas em Gaza foram muito claras: cabe a elas decidir a quem receber em suas águas territoriais, e estão nos esperando. Israel não tem jurisdição legal sobre as águas territoriais palestinas; não está isento do direito internacional, nem da obrigação de respeitá-lo e de garantir os direitos humanos, embora sua propaganda política, que chega a ser genocida, possa dar outra impressão. Por isso, esperamos chegar em breve a Gaza e nos encontrar com a população.
A bordo da flotilha, diz-se que a Palestina é um espelho da humanidade, um teste decisivo para ver se o mundo ainda pode ser regido por regras e um mínimo de respeito aos direitos humanos. Você concorda com esta visão?
Concordo plenamente porque, no fundo, tudo se resume a uma questão essencial: se reconhecemos os palestinos como pessoas dignas de respeito e de direitos. O racismo de alguns ficou totalmente exposto neste contexto, e há aqueles que estão dispostos a chegar ao extremo para justificar os crimes de guerra, as atrocidades e os crimes contra a humanidade cometidos por Israel. Soma-se a isto a falta de vontade de nossos governos em deter este genocídio, o que é absolutamente inaceitável.
Qual é a sua mensagem para a comunidade internacional, neste momento crucial?
Minha mensagem é que, quando aqueles no poder, que deveriam nos representar, não assumem a responsabilidade, lamentavelmente, recai sobre nós agir e exercer a pressão necessária. Convido todos a se juntarem a este levante global pela Palestina e pela justiça. Todas as pessoas são bem-vindas e todas são necessárias.
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