09 Julho 2025
Há 21 meses, o enclave palestino está sob ataques israelenses e os mortos aumentam diariamente. O número oficial de vitimas tem sido amplamente questionado. De acordo com algumas investigações independentes, ele estaria muito abaixo da realidade.
A reportagem é de Anne Bernas, publicada por RFI, 08-07-2025.
Quantos palestinos morreram na Faixa de Gaza desde o início desta guerra? Quantos combatentes do Hamas estão entre eles? Quantas pessoas morreram indiretamente? As questões sobre o número de vítimas são muitas.
Desde 8 de outubro de 2023, o Ministério da Saúde de Gaza publica quase diariamente boletins. Em 6 de julho de 2025, 21 meses após o ataque terrorista de 7 de outubro, pelo menos 57.418 palestinos haviam sido mortos, a maioria civis.
Não são incluídas nesta contagem as pessoas desaparecidas cujos corpos não foram encontrados. O balanço se baseia em informações de hospitais públicos e privados — um número cada vez menor, visto que quase todos foram destruídos — e em dados online onde as mortes são relatadas por parentes das vítimas.
Quando um corpo não é identificável ou não é informado por parentes, a vítima é registrada com um número de identificação. Todos esses dados são transmitidos ao "registro central de mártires" do ministério, onde são verificados por uma equipe. O número de mortos é então corroborado por equipes do Ministério da Saúde Palestino em Ramallah, que faz parte da Autoridade Palestina.
Israel, por sua vez, minimiza esta contagem, que é utilizada por toda a mídia internacional, Estados, ONGs e organismos internacionais. A ONU sempre considerou esses números confiáveis, inclusive durante as guerras anteriores na Faixa de Gaza, entre 2009 e 2021. "Os números de mortos [dos conflitos mais recentes] comunicados pelas autoridades de saúde locais e os das Nações Unidas provaram ser quase idênticos", observa a secretaria-geral da organização sediada em Nova York.
No final de junho, as autoridades de saúde do Território Palestino publicaram um documento de 1.227 páginas identificando as vítimas da tragédia. Em 24 de junho de 2025, 31% dos mortos nesta lista eram menores.
Um novo estudo, conduzido pelo economista e pesquisador de renome mundial especializado em conflitos armados Michael Spagat, do Holloway College, Universidade de Londres, com a assistência do cientista político palestino Khalil Shikaki, do Centro Palestino de Pesquisa Política e Sondagens, estima que quase 100 mil palestinos morreram — direta ou indiretamente — entre 7 de outubro de 2023 e 5 de janeiro de 2025, ou aproximadamente 4% da população, que era de 2,3 milhões antes do início da guerra. "Nossas descobertas sugerem que a mortalidade relacionada à violência excedeu em muito os números oficiais", afirma o relatório.
Este estudo, realizado por meio de entrevistas diretas, abrangeu 2 mil domicílios no território e 10 mil pessoas. Estima-se que pelo menos 75.200 pessoas morreram violentamente, um número bem acima das 46 mil mortes registradas pelas autoridades locais no mesmo período.
Entre os mortos, 56% eram menores de 18 anos ou mulheres. Os dados também revelam que a proporção de mulheres e crianças mortas por morte violenta em Gaza é mais que o dobro da observado em quase todos os outros conflitos recentes, incluindo Kosovo (20%), Síria (20%) e Sudão (23%).
"O fato de outro estudo publicado recentemente pela revista The Lancet, usando um método completamente diferente, apresentar resultados semelhantes aos nossos, prova que nossas estimativas provavelmente estão próximas da realidade", enfatizou Michael Spagat, em entrevista ao jornal libanês L'Orient le Jour.
A revista médica britânica estimou em janeiro passado que o número de mortos em Gaza durante os primeiros nove meses da guerra foi aproximadamente 41% maior do que o registrado pelo Ministério da Saúde do Hamas. Entre as vítimas registradas até o final de junho de 2024, há um ano, 59% eram mulheres, crianças e pessoas com mais de 65 anos.
Para este estudo, os pesquisadores utilizaram um método estatístico chamado "captura-recaptura", que já foi utilizado para estimar o número de mortes em outros conflitos ao redor do mundo — em Kosovo e Guatemala, por exemplo — e se baseia em três listas: uma fornecida pelo Ministério da Saúde, que inclui corpos identificados em hospitais ou necrotérios; uma de uma pesquisa online lançada pelo Ministério da Saúde; e uma compilada a partir de obituários publicados em redes sociais como X, Instagram, Facebook e WhatsApp, quando a identidade do falecido podia ser verificada.
O relatório da Lancet abrange apenas mortes por lesões traumáticas e não inclui mortes indiretas, como aquelas causadas pela falta de cuidados ou alimentação, nem os milhares de desaparecidos que se acredita estarem soterrados sob os escombros.
Esses dados, no entanto, estão presentes no relatório do Holloway College, da Universidade de Londres. Ele inclui, portanto, o alto número de pessoas que morreram devido aos efeitos indiretos do massacre: fome, frio, doenças, etc.
O número de mortes no enclave palestino sitiado é sem precedentes em comparação com quase qualquer outro conflito desde a Segunda Guerra Mundial, tanto em termos da proporção de combatentes mortos em relação aos não combatentes quanto em termos da taxa de mortalidade em relação ao tamanho da população.
Um alto funcionário israelense disse ao jornal britânico The Guardian em janeiro passado que estava fazendo todo o possível para evitar mortes de civis. "Nenhum exército no mundo jamais tomou medidas em tamanha escala", afirmou, explicando que os civis sempre foram avisados com antecedência sobre sua evacuação e que zonas de segurança haviam sido estabelecidas.
No entanto, de acordo com muitos especialistas militares e humanitários, os bombardeios israelenses foram tão poderosos que o número de civis mortos e feridos é certamente superior aos números oficiais. Um ataque deste tipo é realizado para matar pelo menos uma pessoa e, no Território Palestino, mais de 100 mil foram realizados entre 7 de outubro de 2023 e março de 2025. Além disso, de acordo com especialistas militares, uma morte resulta automaticamente em pelo menos três feridos.
Como os combatentes do Hamas eram estimados em menos de 30 mil antes de 7 de outubro, "isso significa que a ofensiva de Netanyahu causou cerca de 90% dos danos colaterais", analisou Guillaume Ancel, ex-oficial e cronista de guerra. "Isso constitui um crime de guerra em larga escala devido à falha deliberada em proteger a população civil dos alvos pretendidos", afirma. Segundo as autoridades israelenses, em um relatório não detalhado de janeiro passado, aproximadamente 20 mil dos mortos eram combatentes.
Além disso, os estudos mais recentes contabilizaram as mortes até janeiro de 2025 e, portanto, não levam em consideração os últimos seis meses de bombardeios e ataques israelenses contra palestinos. Desde o final de maio, a maioria dos palestinos mortos buscavam comida em um dos quatro centros da Fundação Humanitária de Gaza, o equivalente de várias centenas em um mês.
Além disso, até o momento, mais de 130 mil palestinos ficaram feridos, a fome se espalhou e a falta de medicamentos e a destruição sistemática de hospitais aumentaram. Dada a deterioração sem precedentes nas condições de sobrevivência, as mortes, tanto diretas quanto indiretas, devem aumentar drasticamente.
Segundo o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, 12 mil pessoas continuam desaparecidas, a maioria soterrada sob os escombros. Dada a falta de clareza nos números, os mortos no território palestino sitiado não serão conhecidos até que Israel permita o acesso às instituições competentes.