21 Julho 2025
"O pior da fome é o quão humilhante ela é. Aqui estamos, morrendo lentamente, enquanto o mundo assiste e deixa tudo isso acontecer."
O artigo é de Kholoud Jarada, médica clínica geral de 24 anos de idade e habitante da Cidade de Gaza, publicado por La Repubblica, 21-07-2025.
Depoimento da Faixa: "Neste momento, é o único sentimento que temos. Pessoas estão desmaiando nas ruas, e os hospitais estão lotados de feridos, não apenas feridos, mas também de subnutridos."
Os últimos dias foram os piores dos 652 que vivemos desde o início do genocídio e do deslocamento forçado. Deixando de lado as explosões aterrorizantes que continuam a destruir o que resta de Gaza ou as ordens de evacuação humilhantes, só posso falar da fome: a fome se tornou a arma mais letal usada contra nós.
Em 653 dias de Holocausto Palestino, vi Anas al-Sharif cobrindo o assassinato do pai em bombardeio israelense na casa da família. Vi a filha dele nascer. Vi ele anunciando o "cessar-fogo" em janeiro.
— Marcos Feres 🇵🇸 (@marcosvmf_) July 20, 2025
As pessoas dizem ao fundo do vídeo: "Continue, Anas, você é nossa voz" https://t.co/9veD8A9biE
Durante meses, tentamos resistir, mas agora estamos desnutridos e fracos e, à medida que a situação piora, não conseguimos mais suportar dias sem comida. Durante semanas, ninguém em Gaza se sentiu nem um pouco satisfeito. Quando se anda pela rua, é impossível não ver o cansaço e a exaustão de todos. Os efeitos da fome são visíveis em nossos rostos magros e corpos debilitados. Continuo olhando para as pessoas ao meu redor — no trabalho, no hospital, na rua, em casa — e, sem nem perguntar, sei que a fome as está devorando. Sinto isso dentro de mim e em todos ao meu redor. Neste momento, é a única sensação que percebemos.
Pessoas desmaiam nas ruas, e os hospitais estão lotados de feridos, incluindo desnutridos. Muitos morreram de hipoglicemia quando uma colher de chá de açúcar ou um gole de suco poderiam tê-los salvado. E não há nada que possamos fazer. Os médicos que tratam esses pacientes também estão morrendo de fome. Até os jornalistas que cobrem essa fome estão morrendo de fome.
Vídeo registra ataque a escola usada como abrigo em Gaza; crianças passavam por perto ==> https://t.co/HgRF3FzOAt #g1
— g1 (@g1) July 20, 2025
Até agora, a desnutrição matou 76 crianças e outras 600.000 correm risco iminente de morte pelo mesmo motivo. Muitas delas já estão hospitalizadas, mas os hospitais não têm os meios mais básicos para salvá-las. Seus pais e médicos são deixados para vê-las morrer. Você consegue imaginar tamanho estado de desamparo e angústia por parte de mães e pais que já abriram mão de suas porções de comida para tentar, em vão, salvá-las? Muitas crianças agora se sentem culpadas até mesmo por dizerem um simples "Estou com fome": elas sabem que até mesmo dizer isso fará seus pais sofrerem.
Os mercados agora estão vazios; não se consegue nem encontrar produtos a preços exorbitantes. Ter dinheiro não significa nada, porque não há nada para comprar. Isso não é pobreza ou falta de recursos: é fome forçada e deliberada. É uma arma de guerra.
Hashtag #GazaIsStarving is trending across social media as Israel continues to kill starving Palestinians seeking food across the besieged enclave and children die of malnutrition https://t.co/XoKJJkFeR3 pic.twitter.com/UsxsivC98I
— Al Jazeera English (@AJEnglish) July 20, 2025
Centenas de caminhões carregados com ajuda humanitária e alimentos estão presos na fronteira. Bastaria uma decisão para deixá-los passar. Os poucos que ocasionalmente conseguem entrar não são suficientes. E até agora, pelo menos 995 pessoas morreram e 6.000 ficaram feridas enquanto buscavam ajuda.
Todas as manhãs, mesmo na minha família, inicia-se uma discussão interminável sobre como sobreviver ao dia. Não comemos carne, frango, ovos, nozes ou laticínios desde fevereiro. Meu irmão vagueia pelas ruas procurando algo para comprar. Quando ele encontra comida sem gosto e inadequada, sinto-me privilegiada; a cada mordida, a culpa me atormenta, sabendo que muitos não têm dinheiro nem para beber um gole de água.
O pior da fome é o quão humilhante ela é. Aqui estamos, morrendo lentamente, enquanto o mundo assiste e deixa tudo isso acontecer.