Diversidade etária e economia prateada. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

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04 Junho 2025

A diversidade etária é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento econômico, a inovação e a sustentabilidade

O artigo é de José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia, em artigo publicado por EcoDebate, 04-06-2025.

Eis o artigo.

Os 30 anos dourados – transcorridos entre 1950 e 1980 – registraram as maiores taxas de crescimento da população, da economia e da renda per capita da história, tanto no mundo quanto no Brasil. A partir de 1980, porém, esse ritmo de expansão demoeconômica começou a desacelerar globalmente, com um impacto ainda mais significativo no cenário nacional.

Após quase cinco séculos de contínuo crescimento populacional e alta predominância de jovens, a principal transformação demográfica do século XXI será a alteração na estrutura etária. Pela primeira vez na história, a maioria dos países e regiões já possuem mais idosos (60 anos ou mais) do que crianças de 0 a 4 anos e, em breve, o número de idosos superará o de crianças e jovens de 0 a 14 anos. Até 2100, estima-se que 30% da população mundial terá 60 anos ou mais, podendo essa proporção alcançar 40% no Brasil.

Sob uma perspectiva pessimista, o envelhecimento populacional pode representar desafios significativos, levando a um fenômeno conhecido como “inverno demográfico” ou “armadilha fiscal geriátrica”. Nesse cenário, o crescimento econômico torna-se inviável, resultando em estagnação ou até retrocesso do progresso social.

Por outro lado, em uma perspectiva mais otimista, o envelhecimento populacional pode ser encarado como uma oportunidade para o desenvolvimento econômico e social, impulsionado por transformações intergeracionais e pela valorização das faixas etárias localizadas na parte superior da pirâmide populacional.

A população brasileira de 0-59 anos era de 51,3 milhões de pessoas em 1950 e chegou ao pico de 179 milhões em 2020, um crescimento de 3,5 vezes em 70 anos. Mas já está diminuindo. A Divisão de População da ONU estima que o grupo 0-59 anos ficará em 98 milhões de pessoas em 2100, ou seja, reduzindo quase pela metade nos 80 anos entre 2020 e 2100.

Em contraste, a população de 60 anos e mais era de 29,7 milhões de idosos em 2020 e deve passar para 65 milhões em 2100, um crescimento de 2,2 vezes entre 2020 e 2100. Portanto, já está havendo redução da parte da pirâmide abaixo de 60 anos e aumento da parte superior. Sem dúvida, as gerações prateadas terão um peso cada vez maior no Brasil nas décadas vindouras.

O processo de mudança da estrutura etária da população brasileira pode ser visto na figura abaixo, com quatro gráficos com dados da Divisão de População da ONU. O gráfico de 1985 mostra que a população brasileira de 1985 era de 135 milhões de habitantes, com uma idade mediana de 20 anos (metade da população tinha menos de 20 anos e a outra metade tinha mais de 20 anos).

Nota-se que o número de pessoas em cada idade era sempre maior quanto mais próximo da base. Em 1985, o número de crianças de 0 a 1 ano de idade era de quase 4 milhões de pessoas, o número de pessoas com 50 anos era de 975 mil pessoas e o número de pessoas centenárias (100 anos ou mais) era de somente 1 mil pessoas.

Em 2025, a população brasileira está estimada em 213 milhões de habitantes, com uma idade mediana de 35 anos. O número de crianças de 0 a 1 ano de idade caiu para 2,5 milhões de pessoas, o número de pessoas com 50 anos passou para 2,8 milhões de pessoas e o número de centenários está estimado em 9 mil pessoas.

Gráfico de habitantes por idade simples no Brasil (Fonte: UN/ESA).

Para 2050, a população brasileira deve ser de 217 milhões de habitantes, com uma idade mediana de 44 anos. O número de crianças de 0 a 1 ano de idade deve cair para 2 milhões de pessoas, o número de pessoas com 50 anos deve subir para 3,1 milhões de pessoas e o número de centenários pode alcançar 73 mil pessoas.

No final do século, a população brasileira deve ser de 163 milhões de habitantes, com uma idade mediana de 51 anos. O número de crianças de 0 a 1 ano de idade deve cair para somente 1,3 milhão de pessoas, o número de pessoas com 50 anos deve ficar em 1,9 milhão de pessoas e o número de centenários pode alcançar 619 mil pessoas.

Por conseguinte, o Brasil vive uma nova dinâmica demográfica: a população brasileira abaixo de 60 anos já está encolhendo, a população total vai começar a decrescer a partir da década de 2040, enquanto a proporção de idosos é a faixa que mais cresce e continuará crescendo ao longo do atual século. Neste quadro, as gerações prateadas vão ter uma importância cada vez maior para a economia brasileira.

Neste cenário, os idosos não devem ser vistos como um problema que obstaculiza o futuro, mas sim como parte da solução para uma nova realidade econômica inserida em uma diferente configuração da estrutura etária. Ao integrar essa população ao mercado de trabalho, ao 3º setor e ao consumo sênior, é possível transformar o envelhecimento populacional em uma oportunidade, gerando benefícios para a sociedade, as empresas e os próprios idosos.

No entanto, isso requer políticas públicas eficazes, mudanças de mentalidade, investimento em capacitação e a superação das barreiras culturais do etarismo. A maior longevidade viabiliza o convívio de diferentes gerações.

A diversidade etária é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento econômico, a inovação e a sustentabilidade, especialmente em um contexto de envelhecimento populacional.

A economia da longevidade com maior convivência intergeracional fortalece a economia por meio da complementariedade de habilidades e experiências, inovação e criatividade e resiliência e adaptação a mudanças demográficas nas famílias e na sociedade, da seguinte forma:

  • Jovens, adultos e idosos trabalhando juntos potencializam os benefícios individuais e coletivos. A colaboração da juventude (com habilidades tecnológicas e criatividade) e dos idosos (com experiência e conhecimento acumulado) cria um ambiente de trabalho mais dinâmico e produtivo.

  • A mentoria e o aprendizado intergeracional trazem ganhos inegáveis, pois os profissionais mais velhos podem atuar como mentores, transmitindo conhecimentos tácitos e práticos para os mais jovens, enquanto estes podem ajudar os idosos a se adaptarem às novas tecnologias e tendências.

  • A diversidade de perspectivas impulsionam equipes com membros de diferentes idades, trazendo visões variadas sobre problemas e soluções, o que pode levar a inovações mais robustas e adaptadas a um público diversificado.

  • A presença de idosos nos mercados de trabalho e de consumo ajuda as empresas a entenderem melhor as necessidades da população mais velha, impulsionando a criação de produtos e serviços específicos para esse grupo (como tecnologias assistivas, turismo adaptado, cuidados de saúde personalizados, etc.).

  • A experiência dos idosos, combinada com a energia e a inovação dos mais jovens, pode aumentar a produtividade geral das empresas e da economia, garantindo a sustentabilidade do sistema de produção de bens e serviços.

  • A diversidade etária promove a inclusão dos idosos na sociedade, combatendo estereótipos negativos e o preconceito relacionado à idade. Empresas que adotam políticas de diversidade etária tendem a ser mais inclusivas e atraentes para talentos de todas as idades, melhorando sua reputação e competitividade.

  • A presença de idosos no mercado de consumo estimula a inovação em áreas como moradia adaptada, mobilidade urbana e cuidados de longa duração. Startups e grandes empresas estão desenvolvendo dispositivos e aplicativos que facilitam a vida dos idosos, como sensores de monitoramento de saúde e plataformas de conectividade.

A diversidade etária é essencial para o sucesso da economia da longevidade (ou economia prateada), pois promove a complementaridade de habilidades, impulsiona a inovação, fortalece a sustentabilidade econômica e combate o etarismo. Integrar jovens, adultos e idosos no mercado de trabalho e na sociedade transforma o envelhecimento populacional em uma oportunidade de desenvolvimento humano, beneficiando todos os grupos etários e o bem-estar geral do país.

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