29 Abril 2025
Nos olhos as imagens das centenas de milhares de pessoas que atravessam Roma. Na mente, a expectativa pela escolha do sucessor que, em poucos dias, fechará os cardeais eleitores na Capela Sistina. Mas, antes disso, Andrea Riccardi, fundador da Comunidade de Santo Egídio, reflete sobre o que as imagens de Roma estão dizendo: “Estou impressionado com o luto muito grande, nesses termos talvez inesperado, que está acompanhando a despedida do Papa Francisco”.
A entrevista é de Alberto Infelise, publicada por La Stampa, 26-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não se esperava uma reação popular tão maciça?
Muitos davam uma imagem desbotada e cansada de Francisco. Mas o que estamos vendo nos fala da popularidade de Francisco e de um povo que sentiu sua figura. E isso levanta a questão de seu legado, da busca por um sucessor que saiba falar com o povo. Francisco evidentemente tocou as pessoas com sua grande energia, suas ações, sua simpatia e sua capacidade de compaixão, que o levaram a habitar o coração das pessoas e a superar as barreiras ideológicas.
Esse legado será um tema que contará no próximo Conclave?
Não sei se será um tema dentro do Conclave. É um Conclave novo, de cardeais que não se conhecem, representando uma Igreja grande, diversa e também contraditória, especialmente de conflitualidade entre países. É a Igreja da complexio oppositorum, uma Igreja global na qual vive a complexidade das oposições, das diversidades, o que não significa a Igreja dos conflitos. Mas certamente há um tema que diz respeito à afirmação da Igreja nacional em uma época em que o tema dos nacionalismos existe.
Até que ponto os alinhamentos regionais contarão?
Há obviamente diferenças de áreas geopolíticas, mas nenhuma delas pode eleger o papa sozinha. As mesmas áreas geográficas se dividem internamente. Foi o próprio Francisco que nomeou cardeais norte-americanos mais próximos de si, já que outros dessa área pareciam estar distantes dele. Mas não se pode falar de cardeais propriamente bergoglianos como antigamente se falava de montinianos. Será necessário buscar um núcleo de coesão entre as interpretações do legado de Francisco e as pressões das diferentes áreas culturais e geográficas.
Esse parece ser um dos Conclaves mais abertos dos últimos quarenta e sete anos. Um dos papáveis também é jesuíta. Dois papas jesuítas, um após o outro, seriam possíveis?
Tudo é possível, até mesmo dois jesuítas se sucedendo. No momento, não há candidatos hegemônicos. Em geral, não se tende a insistir na mesma área geográfica. Depois de um polonês, tivemos um alemão e depois um argentino. O verdadeiro problema é encontrar o homem que represente a síntese, ou pelo menos um ponto de síntese. Em minha modesta opinião, um homem sozinho precisará ser ajudado, e talvez seja necessário pensar que essa ajuda seja fortalecida.
O senhor acha que um fortalecimento do Sínodo também poderia fortalecer o papa?
Essa é uma das grandes questões: como dar continuidade ao processo sinodal na Igreja. E essa é uma das áreas em que se manifestam as diferenças entre os possíveis candidatos. Não apenas se o continuar, mas como continuar. O sínodo certamente não deve limitar o poder do papa, mas talvez seja necessário introduzir uma sinodalidade permanente, uma espécie de pequeno conselho do papa. E, além disso, o papa não é apenas o papa da Cúria, mas é um evangelizador.
Francisco foi um evangelizador?
Francisco foi um grande evangelizador. Os católicos se sentiram encorajados com seu papado e até mesmo o mundo muçulmano foi tocado por sua mensagem. Em Jacarta, vi muçulmanos rezando na grande mesquita por sua saúde. Ele foi um grande missionário e um grande evangelizador. João Paulo II disse: 'Não sou apenas o sucessor de Pedro, sou também o sucessor de Paulo’. A Igreja deve comunicar o Evangelho na Europa e no resto do mundo.
O senhor acredita que existe uma figura assim entre os cardeais que entrarão no Conclave?
Um cardeal me disse há muitos anos que quando um papa escolhe um novo cardeal, ele o escolhe pensando que um dia ele poderia ser seu sucessor. Acredito que neste Conclave haverá vários cardeais dignos de serem sucessores de Francisco.
Há, como sempre, a questão da idade do escolhido. Um papa mais jovem tem potencialmente mais anos de reinado pela frente, um papa mais idoso menos.
Quando se falava do jovem cardeal Siri como possível sucessor de Pio XII, se falava sobre a possibilidade de ter um padre eterno e não apenas um santo padre. Além das brincadeiras, existe um problema de energias. Um papa mais jovem é um papa mais enérgico, mas este é um mundo que consome tudo. Acredito que a idade não será o único fator de discriminação. Ratzinger foi escolhido também porque todos tinham ficado chocados com o fim de um papa eterno e escolheram alguém que era muito parecido. Na sucessão de Bento, uma atitude anti-italiana e anticurial também desempenhou um papel importante.
O senhor ainda acredita que existe um preconceito anti-italiano?
Não acredito que exista mais um preconceito anti-italiano, mas também nenhuma abertura especial. O verdadeiro ponto crucial é encontrar um papa que saiba como fazer de Roma um centro manso e acolhedor, que saiba como ser um evangelizador no mundo. Um papa que tenha uma grande força de fé. Porque sem esta última, o jogo é por demais pesado.
Muitos estão apostando na lotopapa: considera isso possível ou que faz sentido neste momento?
Eu realmente acho que não, até porque muitas vezes a lotopapa só tem a função de queimar nomes.
Acredita que o novo papa estará em continuidade com Francisco ou será, de alguma forma, uma ruptura em relação a ele?
Penso em um eleito de continuidade que, no entanto, introduzirá modificações, acréscimos que são de seu caráter. Afinal de contas, na Igreja Católica não existe algo como a ruptura. Podem coexistir impulsos de espírito revolucionário e, ao mesmo tempo, de continuidade.
Que papa foi Bergoglio?
Bergoglio era fiel à tradição, mas tinha grandes aberturas em certos temas. E o fundamental para ele foi a grande abertura pastoral da misericórdia.
Foi isso que o tornou tão amado?
Exatamente. É por isso que estamos assistindo nessas horas a um luto maior do que se esperava. A mensagem e a humanidade desse Papa foram mais longe do que pensávamos.