09 Abril 2025
"As igrejas não atenderam a esse apelo na época. Elas podem - e devem - fazê-lo hoje, diante das guerras em andamento e de outras que, com intolerável leviandade, são propostas e ameaçadas todos os dias."
O artigo é de Paolo Naso, sociólogo italiano da Comissão de Estudos da Federação das Igrejas Evangélicas na Itália e professor da Universidade de Roma “La Sapienza”, publicado por “Riforma” de 09-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Oitenta anos atrás, na madrugada de 9 de abril de 1945, no campo de concentração de Flossenbürg foi executada a sentença de morte do teólogo protestante Dietrich Bonhoeffer.
O plano de Hitler para o Terceiro Reich já havia desmoronado e faltavam apenas poucas semanas para a queda definitiva do nazismo e o suicídio do Führer, mas com uma última e brutal reviravolta ele ordenou a execução de Bonhoeffer.
Filho da alta burguesia, esse teólogo protestante havia escolhido o caminho do pastorado com convicção, mesmo que, em pouco tempo, isso tenha se expressado principalmente na forma de pesquisa e reflexão teológica.
Em uma Alemanha que estava virando para o nazismo, logo Bonhoeffer manifestou sua aversão ao Führer ao denunciar, já em 1933, a imoralidade das leis antijudaicas e o perigo representado pela ascensão de um líder capaz de seduzir as massas com a linguagem fácil do populismo.
Com o passar dos anos, sua oposição ao nazismo tornou-se militante e o aproximou dos círculos da resistência, para a qual realizou missões de inteligência. Muito conhecida é a frase atribuída a ele por um companheiro de prisão, a quem Bonhoeffer explicava por que, diante da tragédia e do perigo, o cristão não podia ficar parado e inativo: “Quando um louco joga seu carro na calçada, não posso, como pastor, me contentar em enterrar os mortos e consolar as famílias. Devo, se estiver naquele lugar, pular e deter o motorista ao volante”.
Tendo acabado na mira das autoridades, Bonhoeffer poderia ter ido para os Estados Unidos e desenvolver tranquilamente uma carreira brilhante em uma faculdade de teologia protestante. Em vez disso, ele optou por retornar à sua Alemanha natal em 1939. Era ali que a coerência cristã estava sendo posta a dura prova: os sínodos e os líderes da Igreja Luterana haviam essencialmente se adequado ao regime, e somente o pequeno grupo da Igreja Confessante, inspirado pelo teólogo Karl Barth, havia defendido a independência da igreja em relação ao regime e afirmado que os cristãos deveriam proclamar sua fidelidade única e absoluta somente a Deus e não às autoridades terrenas.
Morto antes de completar 40 anos, Bonhoeffer deixou para trás uma bagagem substancial de escritos, alguns dos quais são hoje clássicos da teologia cristã. O texto mais conhecido, mesmo de um público não especializado, é provavelmente Resistência e Submissão, uma coletânea de textos datados entre 1943 e 1945.
Apesar de serem escritos da prisão, o leitor que busca nessas páginas as palavras de um manifesto ou viés político fica desapontado. A crítica teológica ao nazismo e à sua ideologia ressoa nesses textos, mas a essência é uma reflexão sobre o cristianismo e sua crise. Em tempos tão mudados e difíceis, a fé cristã não pode se reduzir a uma religião convencional e consumista, à ideia de um “Deus tapa-buracos” que responde a perguntas humanas que não encontram resposta. Deus não deve ser buscado apenas diante da morte, nos limites de nossa vida, mas em seu âmago, diante das perguntas que mais nos questionam e desafiam. Nessas páginas, Bonhoeffer polemiza com a ideia de uma graça divina “de baixo custo”, graça sem seguimento, graça sem cruz, graça sem Jesus Cristo vivo e encarnado. A graça de Deus envolve o cristão, convida-o a abandonar as redes com as quais está pescando para se colocar no caminho do seguimento cristão.
Essas são as palavras de um crente que sente o peso da história que está atravessando e, justamente por crer na ação de Deus, sabe que deve fazer sua parte e assumir suas responsabilidades como crente “adulto”. Uma fé que não é um refúgio tranquilizador, mas, ao contrário, nos expõe aos desafios do mundo. Em tempos dramáticos, como no início da década de 1940, esse apelo à responsabilidade da consciência diante do mal levou Bonhoeffer à forca. E não deve nos surpreender que sua lição moral e teológica tenha inspirado o pensamento e a ação de figuras como Martin Luther King ou Desmond Tutu, e também tenha despertado grande interesse no âmbito católico.
Há também uma grande quantidade de publicações sobre esse gigante da teologia cristã do século passado e, entre os muitos títulos, recomendamos Bonhoeffer. Um perfil, do teólogo protestante Fulvio Ferrario, que chegou às livrarias pela editora Claudiana. Alguns, porém, vão além e chegam ao ponto de beatificar esse crente luterano, que permaneceu coerente até o fim com sua fé e tradição. É um paradoxo inaceitável. O protestante Bonhoeffer não deve ser santificado e colocado nos altares do ecumenismo, mas sim compreendido e estudado. Continua sendo um pensador complexo, marcado pelo maior dos dramas do século XX, que não pode ser inscrito nas listas dos teóricos do pacifismo ou da resistência armada, mas que continua a questionar todo crente que se confronta com as escolhas dramáticas da história.
Apesar do epílogo e do contexto dramático de sua morte, Bonhoeffer também nos dirige uma mensagem de esperança. Em 1933, em uma Europa das ditaduras que se encaminhava para a guerra, ele lançou um apelo que ressoa mais atual do que nunca. Ele propôs um “grande concílio ecumênico da santa igreja de Cristo” que, diante de guerras passadas e iminentes, pronunciasse uma palavra de paz e, em nome de Cristo, promovesse o desarmamento.
As igrejas não atenderam a esse apelo na época. Elas podem - e devem - fazê-lo hoje, diante das guerras em andamento e de outras que, com intolerável leviandade, são propostas e ameaçadas todos os dias.