19 Setembro 2024
"Sobre o futuro e a paz paira o pesadelo do jihadismo, que Nucci viu de perto em Nairóbi, primeiro na Somália e depois no Sahel. Em todos os conflitos analisados e nas áreas examinadas no livro, destaca-se a ameaça dos grupos islâmicos, que na África tem crescido constantemente nos últimos dez anos, com a triplicação da violência", escreve Paolo Lambruschi, jornalista italiano, em artigo publicado por Avvenire, 17-09-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
“África contesa” explica as mudanças que estão ocorrendo naquela área do mundo e que estão destinadas a influenciar o futuro da Europa, desde a questão migratória até o suprimento de matérias-primas. Um ensaio do jornalista Enzo Nucci relata conflitos esquecidos que muitas vezes reacendidos por países que querem fazer valer seus interesses. Com o pesadelo jihadista sempre presente.
Compreender a África e prever cenários futuros no continente, em um tempo de mudanças repentinas e sangrentas, são as chaves para o futuro europeu e ocidental. Mas a opinião pública italiana é hoje uma das mais desinformadas sobre as terras mais próximas de nós e que estão passando por mudanças históricas que influenciarão nosso futuro. Para cobrir essa lacuna de informações, Enzo Nucci publicou Africa contesa. La risposta del continente all'assalto delle superpotenze (África disputada. A resposta do continente ao assalto das superpotências, em tradução livre, Infinito Edizioni, pág. 102, 14,00 euros), uma contribuição que oferece o essencial para descortinar a geopolítica africana que, no mundo global, é cada vez mais interessante para ao nosso cotidiano, a começar pelas matérias-primas e pela questão migratória.
Livro Africa contesa. La risposta del continente all'assalto delle superpotenze de Enzo Nucci
Poucos têm a visão clara sobre a África de Nucci, que foi historiador e correspondente apaixonado da RAI em Nairóbi de 2006 a 2022, cobrindo todo o Sahel e as áreas subsaarianas até a África do Sul. Em seu livro, publicado neste ano de eleições cada vez mais decisivas (estadunidenses e não só), ele conta com rara competência a evolução da geopolítica em áreas no centro de conflitos esquecidos e cruentos, muitas vezes instigados pelos interesses de antigas e novas potências regionais e globais.
A África, 60-70 anos após os movimentos que decretaram o fim do colonialismo, recomeçou a se mover e está em uma encruzilhada, e provavelmente o caminho que muitos países estão escolhendo no momento parece estar levando-os para longe da Europa e do Ocidente. Ansiosos para se desligarem do jugo das antigas potências coloniais, como a França, e dos valores que muitas vezes lhes foram impostos, estabeleceram, a começar pelo Chifre, nos últimos 20 anos, relações comerciais e econômicas cada vez mais estreitas com a China - provavelmente mais vantajosas para Pequim, que partiu dali para o assalto dos recursos naturais estratégicos para o desenvolvimento de novas tecnologias e, graças também à retirada gradual dos EUA, especialmente durante a presidência de Trump, acabaram na esfera de influência das ricas potências árabes, da Turquia neo-otomana e, ultimamente, também da Índia. E, é claro, da Rússia, que manteve relações importantes com os países da antiga esfera de influência soviética e que, começando na República Centro-Africana, enviou os mercenários da Africa Corps, antiga Wagner Corporation, avançando no Sahel para substituir os militares franceses no apoio às novas juntas golpistas na luta contra os terroristas jihadistas. Moscou está oferecendo segurança em troca de recursos naturais e consenso para sua concepção de ordem mundial após a guerra na Ucrânia.
A África descrita por Nucci com um estilo seco e rigoroso está longe dos nossos estereótipos, se tomou ciente de suas próprias riquezas e, neste mundo em chamas, tenta recortar para si um novo papel no tabuleiro “que conta” para redefinir posições e alianças. A presença da África do Sul, que tem a economia mais desenvolvida do continente, nos Brics, ao lado da Rússia e do Brasil, e a denúncia de Pretória contra Israel no Tribunal Internacional de Justiça por genocídio, em decorrência da guerra em Gaza, são posições que expressam o pensamento do Sul global, de acordo com Nucci. Ele também explica como a mudança climática - para a qual a África contribuiu com 4% - e o desemprego de um bilhão de pessoas que entrarão no mercado de trabalho na próxima década são os principais problemas que afligem a população de um continente onde o desenvolvimento deve ser garantido enfrentando a lacuna energética juntamente com a lacuna digital, uma vez que, enfatiza o ex-correspondente da RAI, 600 milhões de africanos não dispõem de energia elétrica.
Sobre o futuro e a paz paira o pesadelo do jihadismo, que Nucci viu de perto em Nairóbi, primeiro na Somália e depois no Sahel. Em todos os conflitos analisados e nas áreas examinadas no livro, destaca-se a ameaça dos grupos islâmicos, que na África tem crescido constantemente nos últimos dez anos, com a triplicação da violência. O número de vítimas também triplicou, mas em apenas três anos. Hoje, no Sahel e na Somália ocorrem 80% das violências jihadistas, que também se estenderam para o norte de Moçambique.
“Africa contesa” nos aproxima não apenas das chamadas guerras esquecidas pelas mídias italianas, mas também das dinâmicas que estão gerando movimentos e mudanças na sociedade africana, abrindo novos e imprevisíveis horizontes.
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O assalto dos poderosos à África. Artigo de Paolo Lambruschi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU