25 Abril 2024
"Barrar os refugiados em países terceiros inseguros, quer os governos gostem ou não, é uma clara violação dos direitos humanos", escreve Paolo Lambruschi, jornalista italiano, em artigo publicado por Avvenire, 24-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Daqui há três meses o governo conservador britânico de Rishi Sunak iniciará as deportações para Ruanda dos requerentes de asilo que chegam ilegalmente ao Reino Unido após 2022. Os cargueiros estão prontos para trabalhar durante todo o verão para “transferir” 2.220 pessoas para o coração da África. A notícia, que chegou depois de mais um naufrágio no Canal da Mancha na costa francesa que custou a vida a cinco pessoas, revela a versão 2024 do famoso plano Ruanda, apresentado diversas vezes no Parlamento e rejeitado no último novembro pelo Supremo Tribunal por violações ao direito internacional. Porque os refugiados serão expulsos para os Grandes Lagos praticamente antes de os seus pedidos de asilo serem examinados. De fato, eles terão apenas uma semana de aviso antes da deportação e cinco dias para apresentar um eventual recurso, prazos demasiados restritos. Além disso, o princípio inspirador do governo Sunak é negar o direito de permanecer em solo britânico para os imigrantes ilegais. O governo conservador inventou assim a nova fronteira da externalização: do controle das fronteiras passou ao exame dos direitos, transferindo sob pagamento a avaliação dos pedidos de asilo para um país no coração da África definido como seguro por lei e certamente não famoso pela democracia e pelo respeito pelos direitos humanos.
Normas que já alarmaram o número um do ACNUR, Filippo Grandi, e o alto comissário da ONU para os direitos humanos Voelker Turk, que pediram a Londres para combater o fluxo irregulares de refugiados e migrantes com base na cooperação internacional e no respeito pelo direito humanitário internacional. Aliás, normas muitas vezes promovidas por Londres ou que a viram na linha de frente para aprová-las num tempo já distante. Sunak, com a nova lei, reservou-se a faculdade de ignorar as injunções do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e anunciou publicamente que os tribunais internacionais não o impedirão. Uma iniciativa de propaganda em perspectiva das eleições do final do ano para levantar as pesquisas em queda livre para os conservadores às custas de alguns poucos milhares de desesperados que atravessaram o Mediterrâneo e as fronteiras secundárias da UE para chegar a um país que, graças ao seu passado imperial e colonial, possui numerosas comunidades de refugiados.
A pergunta é se a terrível "receita" inglesa, as deportações de potenciais requerentes de asilo irregulares, não corre o risco de corroer também a UE, que já com o novo pacto sobre as migrações e o acolhimento baixou a bandeira da solidariedade em favor da construção de novos muros.
Não é improvável. O ministro do Interior inglês, James Cleverly, chegou à Itália para se encontrar com a guarda costeira e “acelerar o trabalho conjunto destinado a conter a imigração ilegal do Norte de África". Não por acaso a escolha recaiu sobre Roma, que mais do que todas as capitais mediterrâneas europeias já não se empenha mais na redistribuição entre os 27, mas no bloqueio das chegadas, reforçando o acordo com os líbios e tunisinos e dificultando as operações das ONGs no mar.
Porque quando os fluxos se intensificarem com a chegada do verão, com base nas novas normas europeias, Roma corre o risco de receber o dinheiro dos seus parceiros para manter os migrantes desembarcados.
Se, em vez disso, os fluxos provenientes da África ocidental e da Líbia oriental estiverem nas mãos do Africa Corp (ex. Grupo Wagner) russo e forem direcionados principalmente para as Ilhas Canárias e para a Grécia, existe o risco de ter de aceitar os migrantes que desembarcaram nos outros países, a menos de também ter que fazer o pagamento.
O outro projeto bastante apreciado na UE e que interessa a Londres é a polêmica abertura de dois centros para migrantes na Albânia para conter 3 mil migrantes e que custará um bilhões de euros. Soma que poderia ser melhor empregada no acolhimento e na integração. A esperança é que ninguém em Roma queira copiar o plano Ruanda, inútil e caro porque a partir dos Grandes Lagos com os traficantes seria possível sair facilmente em direção ao norte. Barrar os refugiados em países terceiros inseguros, quer os governos gostem ou não, é uma clara violação dos direitos humanos. Em vez disso, seria mais racional governar os fluxos, começando pelo fortalecimento dos corredores humanitários, em vez de perder tempo e grandes somas de dinheiro público tentando em vão pará-los, dada a agora crônica falta de mão de obra e de jovens que aflige o Reino Unido e a UE.
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A inaceitável deportação. Plano Ruanda: perigoso precedente. Artigo de Paolo Lambruschi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU