13 Agosto 2024
"Essa é a vocação da Igreja, ser já e tornar-se cada vez mais, por obra do Espírito da graça e em nossa liberdade, um só corpo. O atual processo sinodal aponta nessa direção. Mas não é suficiente um bom bispo ou um bom pároco 'sinodal' para fazer a sinodalidade. É necessária uma assembleia inteira", escreve Tommaso Bertolasi, professor adjunto no Istituto Universitario Sophia University, que também é doutor em Filosofia pela Universidad de Salvador e mestre em Filosofia e Ética pela Universidade de Perugia, em artigo publicado por Settimana News, 11-08-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
A primeira sessão da assembleia sinodal sobre a sinodalidade devolveu aos participantes dos trabalhos, em primeiro lugar, e a toda a Igreja, em seguida, uma pergunta: como ser Igreja sinodal missionária? Sobre esse “como” está em jogo grande parte, talvez todo o futuro da Igreja.
A tentação de interpretar o "como" de uma forma procedural, técnica, é latente nesta época em que a ideologia da tecnologia domina tudo. Como se bastasse colocar em prática um procedimento, uma metodologia, talvez repleta de post-its e orientada por bons consultores, para captar os sinais dos tempos e empreender aquela virada total de que há uma necessidade espasmódica.
É urgente uma reflexão mais ampla. Em uma palavra, é necessária uma cultura sinodal. O outro nome para aquele “como” é, de fato, cultura. Uma palavra que diz muitas coisas, até mesmo coisas muito diferentes entre si, mas animadas por uma vibração comum, por um ritmo que mantém unidas diferentes pautas, diferentes instrumentos. Uma cultura sinodal é urgente
Em um pequeno e valioso volume publicado postumamente e intitulado Partire dall’unità (Partir da unidade, em tradução livre, Città Nuova, Roma 1998), o bispo de Aachen, Klaus Hemmerle, se propôs "mostrar a alternativa de um modo de pensar cristão que se baseia em um modo de pensar trinitário" (p. 27). Analisando bem, todo exercício de pensamento que queira ser chamado de cristão deve ser trinitário não apenas em sua forma, mas também em seu exercício. Esse é o ritmo que deve marcar o processo sinodal e, ainda mais, o modo sinodal de ser uma Igreja missionária.
Considerando tudo, isso não é uma peculiaridade teológica ou uma especulação acadêmica para especialistas, porque depois a vida prática, como sabemos, na hora do acerto das contas, faz com que uns ganhem e o outros percam. Não! No quadro de um contexto global cada vez mais polarizado e gerador de divisão, ou se tenta superar a dialética de vencedores e vencidos, de conservadores e progressistas, ou quem vai arcar com os custos é a própria sobrevivência de uma cultura que possa ser chamada de autenticamente cristã. Saltar de cabeça para um lado ou para o outro muitas vezes serve para sancionar a irrelevância, crescente, pelo menos no Ocidente, de um pensamento cristão. O processo sinodal reconhece essa situação global tanto no relatório de síntese da primeira sessão quanto no instrumentum laboris em preparação para a segunda sessão, recentemente publicado.
Portanto, trata-se hoje de "repensar o pensamento". Com essas palavras de Edgar Morin, é lançado o desafio que a fragmentação de todo tipo que vivemos em nível global impõe. O "novo pensamento", um pensamento antiquíssimo de fato, que deve nascer é um pensamento de unidade plural, de acordo com uma bela expressão de Juan Carlos Scannone.
Dito isso, de quem é a tarefa de servir de regaço para o surgimento de tal cultura?
Em outras palavras, quem é o sujeito dessa cultura? O sujeito de um estilo de pensamento trinitário deve ser um sujeito "trinitarizado", ou seja, um sujeito de sujeitos distintos que se tornaram um pelo amor. O que está em jogo aqui é sério porque é preciso levar a sério a identidade da Igreja. Não a identidade que seria bom que a Igreja tivesse um dia, mas a realidade que é e que é chamada a viver, ou seja, a de ser o corpo de Cristo de que Paulo fala. Ora, é sempre o apóstolo que explica que não há como se tornar corpo por iniciativa própria, mas, deixando que, por iniciativa própria, o Espírito tome a iniciativa e faça de todos um só corpo com muitos membros.
É exatamente esse corpo o sujeito de uma cultura sinodal. Mas como esse corpo é de Cristo, esse novo sujeito eclesial, por graça e liberdade, é um sujeito cristificado ao qual é doado, já e ainda não, o nous Christou, o pensamento de Cristo.
Essa é a vocação da Igreja, ser já e tornar-se cada vez mais, por obra do Espírito da graça e em nossa liberdade, um só corpo. O atual processo sinodal aponta nessa direção. Mas não é suficiente um bom bispo ou um bom pároco "sinodal" para fazer a sinodalidade. É necessária uma assembleia inteira.
O sínodo é aquele caminhar ao seguimento de Jesus no amor recíproco para que nos tornemos "todos um" pelo Ressuscitado que acompanha sua Igreja e que pode doar a esse "nós", que é a Igreja, o seu pensamento. E o pensamento de Cristo é a forma trinitária de pensar e viver. Mas isso é feito em conjunto como Igreja. Todos e todas nós.
Mas como fazer isso? Qual é a nossa parte? Aprendendo a habitar aquele lugar onde o pensamento e a vida se tornam um só, assim, escreve Hemmerle: “com a minha vida, também o meu pensamento é imerso no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. É aqui que a vida e o pensamento se tornam um só" (Partire dall’unità, p. 35).
O caminho é o do amor que se desdobra no ponto cego de onde flui a luz: o grito de Jesus na hora nona. Com o grito de abandono, Deus está lá onde ninguém o procura. Na cruz, Deus entra no nada assumindo-o completamente, tornando-se ele próprio nada por amor. A consequência é que não há mais nada, não há mais ninguém que seja estranho a Deus. Deus está lá onde não está. E isso é o máximo do amor: o amor absolutamente gratuito que ama o não-amor, que ama onde não há amor, que ama porque não há amor. Viver e pensar nessa radicalidade significa ter um pensamento crucificado, por ser todo aberto, todo acolhedor, um pensamento hospitaleiro, que sabe ser abrigo para o outro, para a sua ideia, a sua cultura, o seu ponto de vista, que realmente ama o outro como ele é. Trata-se de ser abrigo para a irmã, para o irmão e, com eles, para Cristo que vive neles. Além disso, cada um é chamado por sua vez a doar seu pensamento, sua ideia, sua competência, sua cultura. A própria vida.
Esse é precisamente o método sinodal que foi chamado de "conversação" no Espírito. Conversação, justamente. De com-versari, ou seja, morar juntos, estar juntos. A conversação no Espírito, portanto, não é um procedimento, uma metodologia com regras, implementada durante a primeira sessão da assembleia sinodal. É muito mais do que isso: é um método. Ou seja, um caminho, um estilo de vida e de pensamento que exige total aceitação e total doação de si, que busca não um acordo diplomático entre as partes, mas aquele pensamento que surge da comunhão de vida e de pensamento exercidos na presença do Ressuscitado. Depois, as metodologias, diferentes conforme a necessidade, as circunstâncias e os objetivos, ajudam. Aliás, são necessárias. Mas sempre secundárias.
A morada da "conversação" é o amor mútuo, é o Espírito Santo. A dinâmica de doação e acolhimento do pensamento e da vida em Cristo acontece, portanto, no lugar da própria vida do Filho, naquele Terceiro do Pai e do Filho que ritma a relação trinitária abrindo-a a todos.
Se, portanto, o pensamento se abre à reciprocidade, pode-se experimentar um "nós" que "não dissolve o eu e o tu, mas os constitui" (p. 45) porque os insere em uma existência trinitária. Trata-se de "ampliar nosso interior" (EG 272), de viver uma "mística do nós" (VG, proêmio). O amor mútuo, como já foi dito, é a "práxis do céu" (R. Pesch), é a experiência do Reino, o lugar onde se é chamado a viver o pensamento em uma cultura autenticamente cristã.
O método sinodal de conversação no Espírito, de morar no Espírito, encontra seu lugar, portanto, no seio do Pai, na comunhão, que é Pessoa, do Pai e do Filho. O Nós eclesial é, assim, substanciado pelo e inserido no Nós trinitário que é o Espírito. Em uma palavra, o lugar de uma cultura sinodal é o amor, outro nome do Espírito.
Para concluir, gostaríamos de fazer ressoar as palavras com as quais Hemmerle conclui seu ensaio, citado aqui várias vezes: Se habitamos um no outro, estamos Nele e Ele está em nós. E assim somos um só no Deus trinitário. Portanto, permaneçamos nessa pericorese mútua, pensemos uns nos outros e nos apoiemos mutuamente. Dessa forma, nossa jornada se torna uma jornada coletiva com todos. A Igreja se torna um caminho, uma via coletiva (Weggemeinschaft) na qual nos abrimos um para o outro de tal forma que cada um de nós, em sua própria cotidianidade, possa gerar e desenvolver uma semente dessa maravilhosa comunhão da vida trinitária[1].
[1] K. Hemmerle, Partire dall'unità, Città Nuova, Roma 1998, p. 160.
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Por uma cultura sinodal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU