23 Abril 2024
Seminários vazios e igrejas desertas dissipam as últimas dúvidas sobre a secularização em curso. Os números apenas atestam a transição de uma sociedade religiosa para outra em que a fé perdeu progressivamente sua centralidade. Só no ano passado os candidatos ao sacerdócio no mundo, segundo o Anuário Estatístico da Igreja, caíram para menos de 110 mil. Quanto à missa, para se restringir à Itália, envolve não mais que 18,8% da população (dados do Istat). O que fazer? Se os cardeais conservadores apontam o dedo ao Papa, culpado de ter banalizado a Igreja, outros, como o cardeal Raphael Sako, patriarca dos caldeus, pressionam Francisco a continuar no caminho das reformas, incluindo as dos padres casados e do diaconato feminino. Medos e chantagens permitindo, como os que (em parte) estão por detrás da decisão da Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos de omitir da assembleia sinodal de outubro o espinhoso tema do celibato (não, no entanto, da ordenação de homens casados).
A entrevista é de Giovanni Panettiere, publicada por Qn, 22-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Cardeal Raphael Sako, o que o leva a promover também para a Igreja de Rito Latino a ordenação de maridos e pais de família?
O declínio das vocações é cada vez mais evidente e no futuro a situação vai piorar ainda mais. No mundo, penso por exemplo na América do Sul, temos comunidades onde não é possível celebrar missa todos os domingos. Isso não é bom, a Eucaristia é o centro e o ápice da nossa fé. Devemos então encontrar soluções: a ordenação de homens casados move-se na direção certa.
Na Igreja Caldeia, de rito siríaco oriental, que o senhor preside, já existem sacerdotes casados. Como são vistos pela população?
Temos cerca de vinte sacerdotes com famílias. São apreciados e preparados, têm licenciatura ou doutorado em Teologia, são homens capazes de se sintonizar com as urgências dos fiéis, pois vivem na sua experiência as dificuldades de quem tem esposa e filhos.
Como conseguem conciliar as tarefas pastorais com aquelas domésticas?
Como todo homem que trabalha. E, o que não é pouca coisa, tendo uma família, sofrem menos com a solidão que cada vez mais acompanha a vida dos padres.
Qual é a relação deles com os padres celibatários?
Há harmonia, a vocação ao sacerdócio é única, o celibato não está ligado à essência de ser padre. Pelo menos até ao primeiro milênio depois de Cristo, em toda a Igreja, havia padres casados e celibatários. Na verdade, no início os primeiros eram em maior número.
O senhor falou com o Papa sobre sua proposta de ordenar homens casados?
Não, não diretamente, mas me manifestei em duas ocasiões no Sínodo sobre Sinodalidade de outubro passado.
Outros cardeais têm a sua mesma sensibilidade?
Ninguém disse nada nesse sentido, pelo menos no Sínodo. Espero que na última sessão deste ano alguém se manifeste.
Uma das razões contra os padres casados são os riscos resultantes da gestão hereditária?
Não, o problema se resolve antes disso. Os padres não podem ter nada em seu nome, compram e colocam em nome da Igreja.
O Papa permitiu a bênção não litúrgica de casais homossexuais: por que não autoriza o clero casado, está sendo chantageado pelos tradicionalistas que ameaçam um cisma?
Temo que exista um pouco disso tudo. Na realidade, porém, não haveria nenhuma ruptura. A questão não é doutrinária. É mais prioritária e menos problemática do que a bênção dos casais homossexuais que, pelo menos até o esclarecimento sobre a natureza não-litúrgica da própria bênção, colocou em dificuldades nós, prelados que vivemos em países muçulmanos. Há muitos homens e mulheres casados nas faculdades teológicas. Por que não os ordenar?
Está pensando no diaconato feminino?
Sim, aqui também não seria uma novidade. Não é como o caso do sacerdócio.
Seria um retorno ao passado e não uma revolução...
Até os séculos V e VI, a Igreja ordenou diáconas.
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“Para combater o declínio das vocações, precisamos abrir aos sacerdotes casados e ao diaconato feminino”. Entrevista com Cardeal Raphael Sako - Instituto Humanitas Unisinos - IHU