22 Fevereiro 2024
Após o mais recente veto dos Estados Unidos ao cessar-fogo em Gaza, continuam as discussões sobre a ocupação israelense perante a Corte Internacional de Justiça, enquanto os atores humanitários denunciam os ataques israelenses contra seu pessoal.
A reportagem é publicada por El Salto, 21-02-2024.
Ontem à tarde, 20 de fevereiro, foi dramático para a população palestina, que sofre um extermínio contínuo na Faixa de Gaza desde 7 de outubro, enquanto as forças de segurança israelenses cercam as cidades da Cisjordânia. Dramático, mas dolorosamente previsível. O governo dos Estados Unidos vetou pela terceira vez uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas pedindo um cessar-fogo.
Apesar dos esforços, desta vez da Argélia, para conter o massacre, Israel poderá continuar sua ofensiva em Gaza (que já tirou a vida de 29.195 palestinos), na Cisjordânia (com pelo menos 400 mortos) e no Líbano (140), com armamento vendido e facilitado pelos Estados Unidos. Apenas uma semana antes, na terça-feira passada, o Senado dos Estados Unidos aprovou um pacote de 14 bilhões de dólares em ajuda militar para seu principal parceiro no Oriente Médio, enquanto o país preparava o envio de armas e munições. A ajuda militar milionária deverá ser aprovada no Congresso, onde a administração Biden já estaria pressionando.
No mesmo dia em que a representante dos Estados Unidos na ONU levantou a mão impedindo uma resolução que parasse o extermínio, o presidente Joe Biden se encontrava com um financiador da AIPAC, um importante lobby sionista. Seu interlocutor, Haim Saban, que recebe até 250.000 dólares de cada um de seus doadores e desempenha um papel fundamental no apoio financeiro ao partido democrata, declarou em 2015: "Não estou sugerindo que devamos submeter os muçulmanos a algum tipo de sala de tortura para que admitam se são ou não terroristas, estou dizendo que deveríamos submetê-los a um escrutínio maior".
A reunião despertou a insatisfação da comunidade muçulmana dos Estados Unidos, muito crítica com a administração Biden, que teme o abandono do voto da cidadania árabe e muçulmana. Ontem à tarde, a CAIR — a maior organização muçulmana pró-direitos humanos nos EUA — classificou o veto dos Estados Unidos como "vergonhoso" e instou Joe Biden a parar de agir como "o advogado de Netanyahu" e começar a "agir como o presidente dos Estados Unidos".
Por sua vez, após qualificar o veto israelense como "muito lamentável", o representante palestino nas Nações Unidas, Riyad Mansour, afirmou que continuariam batendo "à porta do Conselho de Segurança, da Assembleia Geral e de todos os componentes das Nações Unidas", cientes de que o cessar-fogo contava com o respaldo de 13 dos 15 países que compõem o primeiro. "Chame como quiser, humanitário, descreva como desejar, mas precisamos de um cessar-fogo imediato, como exigido tanto pelo secretário-geral da ONU quanto por quase todas as agências humanitárias da ONU e um número massivo de estados na Assembleia Geral".
Enquanto isso, a ofensiva constante contra Gaza está impedindo a chegada da ajuda tão necessária. Ontem, o Programa Mundial de Alimentos (PMA) anunciou que estava interrompendo novamente suas atividades no norte da Faixa de Gaza por não poder realizá-las em condições de segurança. Em comunicado, seu presidente declarou que os ataques israelenses aos comboios humanitários, a prática de disparar contra a polícia gazatí encarregada de escoltá-los e a ruptura da ordem cívica em uma população atravessada pela fome impediam a agência de continuar seu trabalho.
Do governo de Gaza, criticou-se a decisão desta agência da ONU, apontando que "significa uma sentença de morte para três quartos de um milhão de pessoas, piorando exponencialmente a situação humanitária". As autoridades locais instaram todas as agências da ONU a voltarem a Gaza e se absterem de "fugir de suas responsabilidades".
O Programa Mundial de Alimentos não é o único ator humanitário com dificuldades para realizar seu trabalho na Faixa. A Meia Lua Vermelha denunciou ontem que doze de seus membros continuam detidos, sete deles após serem capturados pelo exército sionista no hospital Al Amal. A organização teme pelo destino de seus trabalhadores em um contexto de tortura, tratamento degradante e desaparecimento dos palestinos detidos pelo exército ocupante. Por sua vez, Médicos Sem Fronteiras denunciou ontem que perdeu contato com dois de seus médicos após a invasão israelense do hospital Nasser na semana passada. A organização também pede a evacuação dos 130 pacientes que permanecem no que resta do maior hospital de Khan Younis, para que possam ser tratados em outros centros de saúde.
A UNRWA, por sua vez, alertou mais uma vez que a falta de financiamento impedirá que continue seu trabalho em Gaza e no restante dos territórios em que está presente. Seu comissário-geral, Philippe Lazzarini, afirmou que Israel não enviou à agência nenhuma prova das acusações feitas há semanas contra uma dúzia de seus trabalhadores, acusações que levaram numerosos países a bloquearem seus fundos para a agência, embora vários relatórios da imprensa tenham mostrado que Israel não tinha provas que as respaldassem. "As Nações Unidas nunca receberam, nunca, nenhum relatório escrito das autoridades israelenses, apesar de nossos repetidos apelos à cooperação", explicou Lazzarini em uma entrevista ontem.
As bombas patrocinadas pela ajuda americana também chegam ao sul do Líbano, gerando alarme com a possibilidade de uma escalada do conflito. Os ataques israelenses na última semana adentraram o território, atingindo na segunda-feira, 19 de fevereiro, a cidade de Ghaziyeh, a cerca de 60 quilômetros da linha azul, a zona que separa os dois países. Alguns analistas temem que Israel esteja se preparando para uma guerra aberta contra o país vizinho nos próximos meses.
Do Líbano, consideram que Israel quer esvaziar uma ampla área da população libanesa com a justificativa de impedir a presença do Hezbollah. Para isso, aponta para a infraestrutura civil da parte norte do país e destrói os campos dos quais vive a população que habita uma zona eminentemente agrícola. A Human Rights Watch fala de possíveis crimes de guerra por parte do exército sionista em seus ataques contra a população civil. Já a Anistia Internacional denunciou o uso de bombas de fósforo branco na região, que além de causar danos graves às pessoas, prejudica a longo prazo as culturas. Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), mais de 87.000 civis tiveram que deixar suas casas.
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Israel poderá continuar devastando Gaza e atacando o Líbano com o aval e assistência militar dos Estados Unidos. - Instituto Humanitas Unisinos - IHU