28 Junho 2023
"O fato inequívoco é que Jesus Cristo escolheu todas e todos, aliás, mais ainda, escolheu todas as nações", escreve Daniela Di Carlo, pastora valdense da Igreja de Milão, em artigo publicado por Riforma, semanário das Igrejas Evangélicas Batistas Metodistas e Valdenses, 28-06-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
“A história única cria estereótipos. E o problema dos estereótipos não é serem falsos, mas serem incompletos. Eles transformam uma história em uma história única … A consequência de uma história única é esta: rouba às pessoas a sua dignidade” (Chimamanda Ngozi Adichie, Il pericolo di un’unica storia, Einaudi 2020). Se Jesus tivesse a intenção de escrever uma história única do nascimento do cristianismo, que pessoas teria tornado protagonistas? Os judeus convertidos ou aquelas que eram estritamente relacionadas com as doze tribos de Israel? Teria preferido os judeus que se aliaram ao poder Romano ou os pagãos que não se haviam se convertido, mas o tinham reconhecido como mestre?
Teria continuado a tornar discípulas todas as mulheres que, como Maria, haviam se sentado aos seus pés enquanto ensinava ou teria escolhido Simão, Pedro e Judas como símbolos de um cristianismo quem convivia com o pecado? O fato inequívoco é que Jesus Cristo escolheu todas e todos, aliás, mais ainda, escolheu todas as nações. Já a história que Ele escreveu é uma história plural feita de encontros com pessoas todas diferentes umas das outras. Então, como é que os cristianismos e as sociedades desenvolveram uma história única composta de normas que decidem quem está dentro e quem está fora da história?
Isso foi o que aconteceu nos últimos dias em Pavia, onde 33 certidões de nascimento foram canceladas porque os pais dos meninos e das meninas eram casais do mesmo sexo.
Sim, porque a história única funciona exatamente assim: você deve única e exclusivamente nascer em um núcleo familiar composto por uma mãe e um pai e assumir apenas o sobrenome do patriarca para que a sua dinastia possa continuar. E quem está fora dessa norma não conta. Não importa se por seis anos você carregou os sobrenomes das duas mães e dos dois pais e todo mundo conhece você assim. Você é pequeno ou pequena e você não pode sofrer se um dos sobrenomes cair junto com todos os direitos e deveres daquela pessoa. Não importa se quem você chama de mamãe ou papai, dentro ou fora de casa, de repente desaparece legalmente, com possíveis consequências realmente nefastas na concretude da vida, porque cada menina e cada menino deve por força se encaixar na história única heteronormativa.
O que aconteceu em Pádua é extremamente grave porque desconsiderou a possibilidade de que se possa ser família de formas plurais já que a realidade é plural. O amor não basta e nem a vontade de criar juntos uma nova vida para ser família. Claro que dizem que no fundo você não precisa reclamar porque existe a possibilidade da adoção de enteado, que é um procedimento adotivo, contudo bastante complicado. O progenitor não reconhecido deve requerer ao Tribunal de Menores o reconhecimento de um fato já existente, ou seja, tornar-se pai ou mãe.
Depois é preciso o consentimento do progenitor reconhecido, depois as visitas das forças de segurança, depois daquelas dos assistentes sociais, depois as entrevistas com professores e pediatras e, finalmente, aguardar por dois ou mais anos e pagar entre dois e cinco mil euros. Em suma, todas as variações da história única devem ser desencentivadas a ponto de querer decidir o que é crime e o que não é em outros países dado que, por exemplo, se quer tornar crime universal, punido com pena de prisão de três meses a dois anos e com multa de 600.000 a um milhão de euros, a gestação por outrem realizada fora das fronteiras italianas.
Em suma, permanece a questão central de que é preciso reconhecer a realidade variegada como ela se apresenta a nós. Nós cristãos tivemos um modelo exemplar, o Jesus de todos os povos, que tornamos o Jesus de uma história única aquela que, coincidentemente, corresponde ao patriarcado.
Mas atenção, Jesus é diferente de nós e não se deixa enredar pelos nossos desejos de controle.
Querendo ou não, Jesus continua sendo aquele que ama e reconhece todas e todos, porque nunca lhe agradou a história única!
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Jesus Cristo escolheu todos e todas. Artigo de Daniela Di Carlo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU