06 Março 2023
Os bispos da Alemanha se reúnem em assembleia plenária. Irão discutir um plano criticado pelo Vaticano para criar um “conselho sinodal” baseado na governança compartilhada entre clérigos e leigos.
A reportagem é de Héloïse de Neuville, publicada por La Croix International, 28-02-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
É uma das questões mais candentes entre a Santa Sé e a Igreja Católica na Alemanha. Após três anos de trabalho, que chegarão ao fim em 12 de março, os membros do Caminho Sinodal alemão (der Synodaler Weg) decidiram criar um “conselho sinodal”.
Esse órgão de “consulta e tomada de decisão”, que deverá surgir o mais tardar em março de 2026, equivale a uma pequena revolução democrática na Igreja. Composto por bispos, padres, diáconos, leigos e leigas, esse futuro conselho sinodal terá a tarefa de tomar decisões sobre questões futuras para a Igreja e sua gestão financeira.
Embora o Vaticano tema o risco de um “enfraquecimento” do ministério do bispo, único chefe de uma diocese, muitos católicos alemães acolhem essa proposta de forma de governo como um modo de enfrentar melhor os desafios levantados pela crise dos abusos sexuais clericais no país.
“Os bispos alemães decidiram renunciar a seu status de monarcas absolutos em suas dioceses”, disse Jérôme Vignon, observador francês do Caminho Sinodal.
“Esse conselho sinodal certamente é a decisão mais importante que o Synodaler Weg votou”, observou o professor de teologia Thomas Söding, vice-presidente do Comitê Central dos Católicos Alemães.
A premissa? Söding disse que o objetivo é estabelecer órgãos de tomada de decisão compartilhados entre clero e laicato, e, assim, “estabelecer a sinodalidade” como um método permanente de governo na Igreja. O objetivo? “Combater o clericalismo que leva ao abuso de poder”, que os católicos alemães veem como um dos males na raiz da crise dos abusos na Igreja.
Em termos concretos, esse conselho sinodal funcionará em dois níveis – diocesano e nacional. No nível diocesano, cada bispo presidirá um conselho sinodal composto por padres, diáconos e leigos. Esse grupo fará recomendações, especialmente sobre a gestão financeira da diocese, uma questão crucial na Alemanha.
O sistema de financiamento das organizações religiosas é muito particular no país. Existe um imposto religioso deduzido na fonte de renda dos fiéis e pago às instituições de fé – católicas, protestantes ou judaicas – às quais eles estejam administrativamente vinculados. Em 2019, a Igreja Católica alemã, uma das mais ricas do mundo, recebeu mais de 6,76 bilhões de euros por meio desse imposto.
No nível nacional, o conselho sinodal será um órgão complementar à Conferência dos Bispos da Alemanha (DBK). A conferência poderá conferir ao conselho um mandato para tratar de certas questões vistas como de “interesse comum”, como por exemplo a catequese nas escolas públicas.
Mas o Vaticano tem uma visão extremamente negativa desse novo órgão de governo. As principais autoridades da Cúria Romana enviaram à DBK uma severa diretriz, depois de receberem uma reclamação de cinco bispos alemães que manifestaram suas preocupações sobre o plano.
Em uma carta datada de 16 de janeiro, três cardeais vaticanos – Pietro Parolin (secretário de Estado), Marc Ouellet (Dicastério para os Bispos) e Luis Ladaria (Doutrina da Fé) – disseram à DBK que tal comitê sinodal não pode de forma alguma tomar decisões que “limitem a autoridade da Conferência Episcopal” ou “vinculem os bispos”.
Os bispos alemães discutiriam o alcance da advertência do Vaticano nessa semana (27 de fevereiro a 2 de março) na assembleia plenária da DBK, em Dresden.
“Não se pode negar que Roma fez críticas sérias a nós”, reconheceu Matthias Kopp, diretor de comunicações da DBK. “O trabalho dos bispos agora é reunir todos os seus argumentos teológicos e retomar essas discussões com Roma sobre o conselho sinodal o mais rápido possível”, explicou.
Embora as decisões do conselho sinodal não sejam juridicamente vinculantes para os bispos, os cinco prelados que escreveram a Roma temem que se tornem inevitáveis com o passar do tempo. Eles estão alarmados com a forte pressão moral e midiática que pode ser exercida sobre eles caso se recusem a implementar as recomendações do conselho em suas dioceses.
“Em sua própria diocese, o bispo tem um status muito claro, definido pelo direito canônico”, admitiu Söding. “Mas, se o bispo governar com sabedoria, ele não vai querer ignorar seu conselho sinodal, certo?”, opinou o teólogo. No entanto, ele destacou que, na maioria das vezes, são os próprios bispos que desejam esse governo compartilhado com o laicato, para “finalmente” se tornarem “pastores de seu tempo”.
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Como os católicos alemães buscam transformar a governança da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU