21 Outubro 2020
O novo secretário do Sínodo lamentou a “enorme energia” que a Igreja despende “tentando converter a sociedade secular”, e insiste que “é mais importante convertermos nós mesmos”.
A reportagem é de Cameron Doody, publicada por Novena News, 18-10-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Dom Mario Grech, bispo emérito de Gozo, em Malta, foi confirmado, em 16 de setembro, pelo papa Francisco como o novo secretário do Vaticano para o Sínodo dos Bispos. Ele concedeu entrevista à revista jesuíta La Civiltà Cattolica, em 14 de outubro, sobre os desafios que esperam a Igreja depois da crise da covid-19.
“Se nós tomarmos isso é uma oportunidade, isso se torna um momento de renovação”, Grech, 63 anos, insistiu que a pós-pandemia deveria se tornar em um momento para os católicos jogarem foram a “ignorância religiosa”, “pobreza de espírito” e um foco excessivo na Eucaristia física.
Durante o lockdown do coronavírus e para além, “deve se insistir na liberdade de culto ou culto para liberdade, mas pouco tem se falado sobre a liberdade na forma em que fazemos o culto”, observou Grech.
Ele destacou que “na situação em que, por prevenção, não temos celebração de sacramentos, nós não criamos outras formas de experienciar Deus”.
Isso está em conexão com a crítica do prelado maltês ao movimento irrefletido de simplesmente transferir as missas das celebrações presenciais para a televisão e a internet, mudança que facilitou “um certo clericalismo” e um enfoque avassalador nos padres à custa de outras formas de culto lideradas por leigos e famílias.
Durante o lockdown, também, “testemunhamos um grau de exibicionismo e pietismo que tem mais a ver com magia do que com uma expressão de fé madura”, Grech lamentou, aludindo à suposição irrefletida de alguns católicos de que as celebrações eucarísticas não seriam afetadas em seu significado sendo realizadas virtualmente.
Com relação a isso, também, Grech lamentou que “muitas” iniciativas pastorais fora do culto durante o confinamento e além “tenham se centrado apenas na figura do presbítero”.
“A Igreja, neste sentido, parece muito clerical, e o ministério é controlado por clérigos. Mesmo os leigos são frequentemente condicionados por um padrão de forte clericalismo”, lamentou o novo secretário sinodal.
Grech resumiu as mudanças que a pandemia trouxe para a Igreja pela explicação que nesse período de dificuldade da crise da covid-19 “nós descobrimos uma nova eclesiologia, talvez até mesmo uma nova teologia e um novo ministério”.
“Isso, portanto, indica que é hora de fazer as escolhas necessárias para construir este novo modelo de ministério”, explicou.
“Será suicídio se, depois da pandemia, voltarmos aos mesmos modelos pastorais que temos praticado até agora. Gastamos uma enorme energia tentando converter a sociedade secular, mas é mais importante nos convertermos para alcançar a conversão pastoral da qual o papa Francisco frequentemente fala”, insistiu Grech.
Apontando o caminho para oportunidades para uma espiritualidade renovada pós-covid, Grech disse que achou “curioso” que durante as restrições às missas presenciais “muitas pessoas... reclamaram de não poderem receber a comunhão e celebrar funerais na igreja, mas não tantos… preocupados em como se reconciliar com Deus e com o próximo, como ouvir e celebrar a Palavra de Deus e como viver uma vida de serviço ”.
“A Eucaristia não é a única possibilidade que o cristão tem que experimentar o mistério e encontrar o Senhor Jesus”, observou Grech, acrescentando que “é preocupante que alguém se sinta perdido fora do contexto eucarístico ou do culto, pois isso mostra um desconhecimento com outras formas de lidar com o mistério”.
Além disso, o prelado maltês admitiu que um excesso de confiança na missa “não só indica que há certo analfabetismo espiritual, mas como prova a inadequação da prática pastoral atual”.
“É muito provável que no passado recente a nossa atividade pastoral tenha procurado conduzir aos sacramentos e não conduzir – através dos sacramentos – à vida cristã”, reconheceu Grech.
O novo secretário sinodal continuou: “A melhor forma de experienciar o amor cristão é o ministério do serviço. Muitas pessoas se sentem atraídas pela Igreja não porque participaram das aulas de catecismo, mas porque participaram de uma significativa experiência de serviço. E este caminho de evangelização é fundamental na atual era de mudanças”.
Concluiu exortando que “esta pandemia deve conduzir-nos a uma nova compreensão da sociedade contemporânea e permitir-nos discernir uma nova visão da Igreja”.
“Precisamente por causa do nosso egoísmo e individualismo, temos uma memória seletiva. Não apenas apagamos de nossa memória as adversidades que causamos, mas também somos capazes de esquecer nossos vizinhos. Por exemplo, nesta pandemia, as considerações econômicas e financeiras muitas vezes têm precedência sobre o bem comum”, Grech lamentou sobre as consequências sociais mais amplas da pandemia.
“Em nossos países ocidentais, embora tenhamos orgulho de viver em um regime democrático, na prática tudo é dirigido por quem detém o poder político ou econômico. Em vez disso, precisamos redescobrir a fraternidade”, insistiu o prelado.
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Novo secretário do Sínodo dos Bispos lamenta a “enorme energia” despendida pela Igreja “para converter a sociedade secular”: “É mais importante convertermos nós mesmos” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU