10 Novembro 2020
"O livro é apresentado na capa como uma investigação 'sobre a parábola de um papado nascido sob o signo da transparência e do reformismo radical e hoje imerso em um feitiço purgatorial em que convivem popularidade e venenos, promessas de palingênese e escândalos, comitês de negócios e gestos de solidariedade'. O título é coerente com tal apresentação e manda uma mensagem diferente da opinião mais geral, não só católica, de quem ainda está com Bergoglio", escreve Vittorio Bellavite, coordenador do Nós Somos Igreja Itália, em artigo publicado por Fine Settimana, 07-11-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Massimo Franco, um importante e conhecido colunista do “Corriere della Sera”, escreveu um livro sobre o Papa Francisco. Foi distribuído no dia 24 de setembro em conjunto com o jornal (editora Solferino, € 14,50). O título é "O enigma Bergoglio, a parábola de um papado" (em tradução livre). É uma operação editorial e cultural de primeira importância também pelo momento particular em que se realiza. Franco sempre escreveu sobre os assuntos do Vaticano e suas fontes confidenciais são muito extensas, assim como conhece bem a estrutura da Igreja. Está longe da busca de fatos condenáveis (escândalos) como Nuzzi e sua perspectiva não é aquela histórica de Melloni. O livro é interessante pela riqueza de informações e geralmente trata dos eventos mais conhecidos que há algum tempo preocupam o Papa e o Vaticano.
Existem também alguns que são desconhecidos ou completamente subestimados pela mídia. É preciso dizer também que o interesse particular pelo livro diz respeito, sobretudo, aos especialistas que acompanham de perto esses fatos. Franco intervém como jornalista, às vezes como cronista, mas em seu discurso, sempre circunstanciado, revela opiniões que às vezes são marcadas, diretamente ou com referência às opiniões de outras pessoas ou a declarações recebidas de fontes confiáveis, mas que muitas vezes conservam o anonimato (como não se pode falar mal de Garibaldi, assim não se pode criticar Francisco em público !!); Santa Marta se tornou com o tempo "uma corte pontifícia paralela"; depois o livro conta, com episódios e pessoas, como a personalidade de Francisco em privado parece diferente daquela pública, ora imprevisível ou evasiva, ora enigmática, induzida a escolhas a partir de contatos pessoais, amizades ou impressões que se revelaram fracas em alguns casos.
Os mecanismos de tomada de decisão não são muito claros; nomeações, demissões e substituições se sucedem sem que fique muito clara a lógica ou os fatos que as determinam. Alguns falam de uma solidão institucional e até de um Francisco que se tornou ou corre o risco de se tornar uma espécie de papa-rei. Daí o título do livro "L'enigma Bergoglio". Dito isso, os vários capítulos tratam dos problemas, um por um. Sobre as relações com os bispos italianos, a fotografia é bastante explícita quanto a uma certa desconfiança de que o Papa Francisco estaria rodeado. Seu discurso por uma Igreja em saída na Conferência da Igreja Italiana em Florença não foi recebido e as grandes dioceses estão sem cardeal. A hipótese de um Sínodo italiano vista de bom grado pelo Papa está parada. Ruini, que continua sendo entrevistado pelo “Corriere” em página inteira pela segunda vez no dia 6 de outubro e que credencia a direita política que se proclama cristã, é certamente o ponto de referência para uma parte da Igreja italiana anti-bergogliana.
L’enigma Bergoglio. La parabola di un papato
Os casos do cardeal Pell e dos investimentos em Londres são descritos em detalhes (mas o livro é publicado um pouco antes dos últimos eventos). Espaço é dado ao problema dos "dois papas", que talvez esteja superestimado; certamente na Itália Bento XVI não tem o papel que tem no exterior, onde as estruturas de poder clerical do conservadorismo jogam a carta da contraposição dos papas. O livro continua sobre o caso Viganò, o caso Zanchetta, a episódio chileno do acobertamento dos abusos sexuais, a crise do C9 paralisado e incapaz de reformar a Cúria (que é fortemente contestada). Os dois capítulos talvez mais interessantes são aqueles sobre a posição internacional do Vaticano entre o Ocidente e a América Latina e sobre as relações com a China.
O início do pontificado coincidiu com uma fase ainda positiva na gestão do poder no Brasil, Bolívia, Venezuela, Equador.... Foi o momento dos encontros dos movimentos populares promovidos pelo Papa. Depois com Trump e Bolsonaro tudo se tornou mais difícil, também porque o apoio dos bispos não é homogêneo, nos EUA é muito problemático. Com a China, o cenário é melhor porque o acordo de setembro de 2018 será renovado e o ataque do secretário de Estado norte-americano só o fortalece e foi, claramente, um movimento pré-eleitoral. O livro termina falando sobre um possível cisma, parece-me acentuando sua possibilidade. Essa hipótese talvez sirva mais para levantar o peso da contraposição, em parte oculta e em parte evidente, que agora se encontra entre quem está com Bergoglio e quem está contra.
O livro é apresentado na capa como uma investigação "sobre a parábola de um papado nascido sob o signo da transparência e do reformismo radical e hoje imerso em um feitiço purgatorial em que convivem popularidade e venenos, promessas de palingênese e escândalos, comitês de negócios e gestos de solidariedade”. O título é coerente com tal apresentação e manda uma mensagem diferente da opinião mais geral, não só católica, de quem ainda está com Bergoglio. Mas como expressar uma opinião geral no final da leitura? Se o texto de Massimo Franco pretende, ou quer ser percebido, como uma reflexão global sobre o pontificado, o juízo é decididamente crítico. Olha em grande medida, certamente com eficácia e com riqueza de informações, para a gestão central da Igreja e para uma fase recente. Ignora completamente os "processos" (como Bergoglio os chama) que ele iniciou ou tentou iniciar e que qualificam seu pontificado. E ignora alguns discriminantes básicos dos quais não voltaremos atrás. Vou fazer uma lista: o retorno ao Concílio, a descontinuidade com os dois pontificados anteriores, o fim da pressa em condenar posições críticas na Igreja, o lançamento da questão ambiental com a Laudato Si, a indicação de uma Igreja "hospital de campanha", "em saída" e que recomece pelas periferias, as reflexões sobre a Igreja pobre e dos pobres, a abertura para situações de sofrimento (homossexuais, divorciados recasados), as palavras sempre duras sobre a questão da paz e da guerra e sobre o rearmamento nuclear, a tentativa de realizar eventos sinodais na estrutura da Igreja. Esses processos, essa linha, encontram-se agora num momento de maior dificuldade, mas a encíclica "Fratelli Tutti" indica que o percurso continua com tenacidade e com espírito evangélico.
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Um livro sobre o Papa Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU