05 Agosto 2020
"Em tempos de enfrentamento da pandemia desencadeada pela Covid-19 reflexões de qualidade são fundamentais. Isso porque os significados desse grande impacto são muitos, como são muitos os desafios que se colocaram desde a proliferação do vírus e que acompanharam os tempos pós-pandemia", escreve Eliseu Wisniewski presbítero da Congregação da Missão Província do Sul (padres vicentinos), mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e professor na Faculdade Vicentina (FAVI), Curitiba, PR.
O comentário de Wisniewski é sobre o livro "A pandemia do coronavírus. Onde estivemos? Para onde vamos?" , organizado por João Décio Passos (Paulinas, 2020).
"A pandemia do coronavírus:
Onde estivemos? Para onde vamos?".
Organizado por João Décio Passos.
(Paulinas, 2020)
No livro: "A pandemia do coronavírus. Onde estivemos? Para onde vamos?" organizado por Dr. João Décio Passos (Paulinas, 2020), um time de especialistas nas mais diversas áreas analisam diferentes aspectos da pandemia, na perspectiva dos impactos para a vida e a convivência humana planetária e local. Os autores “observam e analisam o fenômeno do ponto de vista das ciências humanas e, por conseguinte, desvelam os significados econômicos, sociais, políticos, psicológicos, éticos, religiosos e teológicos do que foi vivenciado por todos os habitantes do planeta e, de modo específico, pelos brasileiros nos últimos tempos” (p. 20).
A obra vem prefaciada por Dom João Justino de Medeiros Silva (p. 7-13). Para ele a crise gerada pela pandemia que chegou de modo inesperado vem carregada de ensinamentos. Trata-se de um “momento de desafios e oportunidades” (p. 8). Por isso, “a tarefa de pensar o que está em curso e seus efeitos torna-se uma convocação para quem se permite indagar, refletir e comunicar, a partir de diferentes pontos de vista, o que atinge a todos” (p. 7). Seu enfrentamento deverá ser feito sem desesperos, desânimos e desencorajamentos. Na perspectiva da fé somos chamados a viver este tempo de “modo pascal” (p. 12-13), crendo que “a vida é sempre mais forte que a morte; que o amor sobrevive à morte” (p. 13).
O economista Dr. Ladislau Dowbor é o autor do primeiro capítulo: Além da pandemia: uma convergência de crises (p. 25-47). Defende que a “crise causada pela Covid-19 é a pá de cal sobre um sistema planetário disfuncional” (p. 25). Isso porque “convergem neste momento quatro crises: a crise ambiental, a crise da desigualdade, o caos financeiro e a pandemia” (p. 25). A pandemia “veio paralisar um sistema que já estava travado, e as alternativas já vinham sendo discutidas no quadro da Economia de Francisco, preconizada pelo Papa” (p. 44). Para além do coronavírus, o autor, apresenta pontos essenciais de reorientação da forma como governamos as nossas sociedades. Tais pontos que no presente momento assumem caráter de urgência resultam das discussões preparatórias para a Economia de Francisco: 1) democracia econômica, 2) democracia participativa, 3) taxação dos fluxos financeiros, 4) renda básica universal, 5) políticas sociais de acesso universal, público e gratuito, 6) desenvolvimento local integrado, 7) sistemas financeiros como serviço público, 8) economia do conhecimento, 9) democratização dos meios de comunicação, 10) pedagogia da economia (cf. p. 44-47).
O trabalho sob o impacto da Covid-19 é o assunto do segundo capítulo (p. 49-61). A reflexão feita pelo economista Dr. Marcio Pochmann busca destacar as principais implicações do neoliberalismo no trabalho brasileiro (p. 52-58) e as possibilidades de sua superação a partir da contaminação da nação pela Covid-19 (p. 58-61). Chamando a atenção para o predomínio da “improvisação do curtoprazismo”, destaca que: “atualmente, o despreparo governamental para tratar da pandemia do coronavírus parece inegável. A ausência de coordenação nacional, as fragilidades internas na organização de ações e a dependência tecnológica e produtiva do exterior revelam como curtoprazismo da governança neoliberal destoou do todo para salvar fundamentalmente os interesses específicos de ricos e poderosos” (p. 50).
Vera Lucia Ferreira Mendes e Luiz Augusto de Paula Souza, ambos doutores em Psicologia Clínica abordam a questão das políticas públicas no terceiro capítulo. Eis o título: Políticas públicas em situações sociais críticas: considerações a partir da pandemia do coronavírus (p. 63-73). Entendem que falar em políticas públicas supõe alguma definição de Estado Moderno na função que lhe cabe (cf. p. 63). Ancorados por Pierre Bourdieu definem o Estado Moderno pela tensão da mão direita e mão esquerda (cf. p. 63). A mão direita é aquela que “controla e concentra a força física, a vigilância da classe trabalhadora, a fiscalização das atividades sociais e econômicas, e a garantia da ação desenvolta no mercado” (p. 63). Por sua vez a mão esquerda “é a distribuição de riqueza, das políticas, dos direitos civis” (p. 63). Mostram que no Brasil a mão direita do Estado sempre predominou amplamente sobre a mão esquerda, com exceção de alguns poucos períodos. Chamando atenção para o atual cenário político que passa por uma “forte reação do capitalismo neoliberal, associada a uma inflexão conservadora de proporções inéditas; o que delineia, em nosso país, a partir de 2015-2016, um período regressivo em termos de políticas públicas e de condições de vida e trabalho da maioria da população” (p. 65). Associado ao impacto sanitário, econômico e politico da pandemia da Covid-19, esse contexto “faz ver, sem filtros, o tamanho da confusão em que o Brasil se encontra (...) em um momento de extrema fragilidade política e institucional” (p. 67). Destacam que “os modos de enfrentar tal feixe de mal-estar contemporâneo fará toda diferença na criação de alternativas ao atual estado de coisas (...) no Estado e nas políticas públicas (...) na direção de evitar destruições em curso das condições de vida das populações, sobretudo dos mais pobres” (p. 67), proporcionado por um “duplo e simultâneo movimento de mudança, micro e macropolítico, nas políticas públicas brasileiras significaria, ao menos, a radicalização dos direitos sociais em termos de distribuição de renda, geração de empregos, seguridade social, educação, ciência e tecnologia, segurança pública, meio ambiente e direitos humanos (...) uma pauta importante na luta por um mundo não cafetinado” (p. 69).
As desigualdades urbanas são abordadas no quarto capítulo: Desigualdades sociespaciais e pandemia: impactos metropolitanos da Covid -19 (p. 75-92). Lucia Maria Machado Bógus doutora em Sociologia e Luís Felipe Aires Magalhães doutor em Ciências Sociais - objetivam “analisar alguns impactos das desigualdades urbanas presentes em Regiões Metropolitanas brasileiras, com destaque para a Região Metropolitana de São Paulo, sobre as condições de expansão e enfrentamento da pandemia do coronavírus, que alteraram as formas de convívio social e o funcionamento de nossa sociedade, marcada por profundas desigualdades socioespaciais e por nichos de extrema pobreza” (p. 75). À luz das cinco dimensões que constituem o Índice de Bem-Estar Urbano (mobilidade urbana, condições ambientais urbanas, condições habitacionais urbanas, presença de serviços coletivos urbanos, infraestrutura urbana), os autores apontam como a expansão de diferentes municípios que compõe a área metropolitana de São Paulo produziu, a um só tempo, processos de segregação socioespacial e formas de sociabilidade marcadas por conflitos na disputa pelo espaço nas cidades: formação de núcleos de favelas e loteamentos irregulares, com habitações precárias, sem saneamento e muito congestionadas, em condições adversas ao isolamento social e a outras medidas que hoje enfrentamos. Além disso, os baixos níveis de escolaridade dificultam a compreensão de real gravidade da doença por uma parcela da população, exposta cotidianamente a riscos dos mais variados tipos e que adota, muitas vezes, uma atitude de incredulidade e conformismo, entregando à própria sorte a possibilidade de escapar à contaminação, ante a insuficiência ou mesmo ausência de serviços de saúde (cf. 76).
Dr. João Décio Passos é o autor do quinto capítulo: Do micro para o macro: estruturas em mutações a olho nu (p. 95-111). No entender do ator as verdades consolidadas se encontram em mutação, por isso, nestas páginas são apresentadas “sete mudanças em curso, sabendo evidentemente, do limite tipológico do conjunto de cada uma delas e da contingência histórica que carregam” (p. 97). Para o autor “o certo é que a pandemia mata não somente corpos vivos, mas também as mentalidades vivas. Algumas verdades certas, afirmadas teoricamente, mas antes de tudo vivenciadas como consenso implícito, vão sendo corroídas nesse curto intervalo histórico” (p. 98). Passos descreve brevemente as sete quedas dessas verdades cridas como estáveis: 1) que havíamos chegado ao fim da história (p. 98-99), 2) que o sistema moderno é seguro e estável (p. 99-101), 3) que o progresso é linear e não pode parar (p. 101-102), 4) que o mercado é autossuficiente e deve rejeitar intervenções do Estado (p. 102-104), 5) que o Estado de bem-estar social é um equívoco a ser superado (p. 104-106), 6) que as soberanias locais garantem a segurança e a estabilidade econômica (p. 106-108), 7) que o consumo é o único meio de viver e de alcançar a felicidade (p. 108-111).
As novas formas de presença em tempos de pandemia são tratadas no sexto capítulo por Dra. Alzirinha Souza (p. 113-129). Partindo de um dado antropológico - o desejo de mudança, a autora chama a atenção para uma alteração/ mudança de hábitos: “fomos atropelados pela nova forma de vida que o vírus impôs” (p. 113). Fomos tocados “por algo que não esperávamos e que não estávamos preparados para absorver” (p. 114). Destaca que quando pensamos em atropelos da humanidade, não pensamos só em situações de pandemia que aconteceram coincidentemente a cada cem anos mais, em fatos da história que determinaram verdadeiras mudanças de época: Revolução Industrial, Francesa, Russa, Cubana, I e II Guerra Mundiais, do Vietnã, etc (cf. p. 114-121). Assim, no século XXI, quando “acreditávamos que o desenvolvimento das ciências poderia evitar ou no mínimo diminuir os efeitos de uma grande crise, que estamos vivendo a experiência de um atropelo real e se perspectivas de solução em curto prazo” (p. 121). A pandemia atinge a todos (cf. p. 121-122); as crises do século XXI são crises tecnológicas e midiáticas- sendo a primeira vez que temos uma crise num mundo integrado pela internet e pelas informações (cf. p. 122), revelando em nosso país o nível de desigualdades (cf. p. 122-123), a vida concreta foi sendo deslocada para as mídias sociais, que ressignificaram substancialmente os conceitos de amizade, de comunidade, de presença, inclusive religiosa (cf. p. 123), ressignificamos também a compreensão de corporeidade (cf. p. 124). Em síntese, a autora diz que a vida passou a ser movida no mundo virtual, uma vez que a “nova situação de pandemia nos lançou definitivamente nas redes sociais, não apenas para vermos e sermos vistos, mas para vivermos de outra forma. Em tempos de isolamento social, não só os relacionamentos pessoais permaneceram nas redes. Entraram nelas, definitivamente, todas as atividades presenciais básicas do nosso dia a dia, desde as compras básicas e o trabalho até o serviço religioso e a prestação de serviços em geral” (p. 125). Nas páginas finais deste capítulo a autora traz algumas provocações – destaca que o que é emergencial não poderá tornar-se definitivo, ou seja, o mundo virtual não supre a necessidade ontológica de afeto e socialização (cf. p. 125).
Dra. Magali do Nascimento Cunha é a autora do sétimo capítulo: Entre a informação e a “infodemia”: a Covid-19 e as mídias (p. 131-149). A proposta deste capítulo é “tratar do lugar das mídias na crise global do coronavírus sob três vieses: 1) a disseminação de informação pelas mídias noticiosas: sobre o quadro local e global da Covid-19 e suas projeções, suas orientações de autoridades e as medidas de prevenção de novos casos, sobre as formas de superação das consequências agudas na economia e na vida cotidiana das populações e sobre a denúncia das posturas e decisões equivocadas de agentes públicos; 2) o paradoxo do papel das mídias digitais: a positiva facilitação da vida diante do forçado isolamento social e, ao mesmo tempo, a negativa explosão de desinformação, em especial com a disseminação de fake news; 3) como a Covid-19 está transformando a própria dinâmica das mídias e seu futuro” (p. 134). O percurso percorrido nestas páginas leva a autora a esta conclusão: “as mídias noticiosas têm exercido papel importante na disseminação de informação útil para a população no tocante à prevenção e ao enfrentamento da pandemia. É considerado também que as mídias sociais têm cumprido funções significativas na superação das limitações impostas pelo isolamento social. No entanto, a ampla disseminação nociva de desinformação por essas mesmas mídias tem sido um elemento marcante nesse processo, causador do que é classificado pela OMS como “infodemia”, que deve ser intensamente combatida” (p. 149).
As interpretações religiosas para o novo vírus de autoria de Dr. Fábio L. Stern é assunto do oitavo capítulo (p. 151-167). O autor apresenta “algumas etiologias religiosas que ganharam maior destaque durante a crise da pandemia da covid-19” (p. 152). Este capítulo está estruturado em duas partes. Primeiramente focaliza “as explicações que viralizaram nos meios cristãos de viés pentecostal” (p. 152). Em seguida o olhar está direcionado para os “espiritualistas, grupo que vem crescendo no Brasil e que pode englobar pessoas de religiões muito diversas, como o espiritismo, a umbanda e o candomblé, além dos esotéricos e pessoas que possuem uma espiritualidade, mas não se consideram religiosas” (p. 152). Essas leituras sobrenaturais maniqueístas, ceticistas em relação às ciências assim se posicionaram: punição divina contra a suposta heresia do especial de Natal de 2019 do Porta dos Fundos (p. 153-154), punição divina contra os homossexuais (p. 155-157), vírus criado pelo diabo para derrubar a sociedade (p. 158-160). Por sua vez a teoria novaerista “acredita que o vírus veio para restaurar a sociedade, visando à chegada da nova era planetária” (p. 160-163). Nos discursos da Nova Era o vírus “é uma resposta imunológica da Terra” (p. 163-165). Concluindo o autor diz que os dois cenários apresentados – pentecostais e esotéricos- demonstram que “o discurso religioso, quando alienado da ciência, gera um campo muito propício ao aumento da epidemia” (p. 166). Ao “escolher ignorar a história e a ciência, jogam seus fiéis nos braços gelados da morte, aumentando seus riscos de forma cruel e irresponsável” (p. 167).
O nono capítulo de autoria de Dr. Luiz Augusto de Paula Souza lança perspectivas para o futuro. O presente capítulo intitulado: Cura ou qual mundo queremos (re)construir? (p. 171-183) a partir da palavra “cura” busca recuperar outros sentidos desta palavra, pois entende ser “útil para pensar a tormenta precipitada pela Covid-19, como também pensar futuros que já se tornam potencialmente presentes; alguns aparentemente mais prováveis, outros com alguma chance de vingar” (p. 171). Para o autor a construção de possíveis respostas para as perguntas: “mas o que o presente delineia sob a tormenta sanitária, econômica e social do coronavírus? E como esse desenho, por agora apenas esboçado, dá noticias do futuro, daquilo que está deixando de ser o que é para se tornar outra coisa?” (p. 171) tem a ajuda de alguns significados das acepções da palavra cura (cf. p. 172-174). Afirma que a “cura começa numa ontologia do presente” (p. 174-175), tendo-se em conta que as “vísceras do capitalismo, mais uma vez estão expostas” (p. 175-183).
Dr. Jorge Broide aborda no décimo capítulo a questão do Desamparo e pandemia (p. 185-196). Para o autor “estamos diante de uma situação em que tudo que é sólido desmancha no ar” (p. 187) uma vez que “a pandemia, tal como uma guerra, rompe de fora abrupta a estabilidade de nossa vida e nos coloca diante do desamparo que surge de todos os lados” (p. 187). Dai surge uma tarefa: assumir o desamparo transformando “a experiência de desamparo em saber” (p. 189). Sua negação traz como consequência a perda: “negar o desamparo e a experiência da perda desses mundos é também perder-se com eles” (p. 189). Salienta que “as massas se organizam segundo modelo (p. 190). Em “um momento histórico como esse que estamos vivendo traz distintos porta-vozes emergentes (...) quando mais um líder divide e confunde, maior a inibição metal e, em nosso caso a morte (...) a desamarração do laço social, o sujeito fica entregue à própria sorte e á própria lei (p. 190). Trata-se de uma atitude que “nega o desamparo para desconectar-se do medo diante do novo e das dificuldades que passaremos como nação, por meio da onipotência” (p. 191). Destacam-se outros “desamparos” surgidos em meio a pandemia: a divisão e diferença de classes no Brasil (p. 191), a situação dos presídios/população carcerária (p. 191-192), a situação da população de rua (p. 192), a queda brutal de renda, a reinvenção do trabalho e a exclusão social (p. 192-193), as relações amorosas (p. 192), a situação das indústrias e pequenas empresas (p. 193). Num mundo em movimento, concluí o autor, se fez necessário “construir tecidos de sustentação da vida significa criar dispositivos de uma verdadeira escuta do sujeito”. (p. 194). Estes dispositivos não são solitários, mas devem ser interdisciplinares e intersetoriais (cf. p. 194). Torna-se necessário, ainda, a ousadia do Estado (p. 194) a cooperação entre a iniciativa privada, o Estado, o movimento social, o terceiro setor e a universidade, apoio aos trabalhadores, valorização dos que trabalham nas áreas sociais, espaços de palavra para a elaboração das situações dramáticas, dispositivos de atendimento, metodologias de escuta, entre outras ações (cf. p. 194-195).
Dra. Maria Clara Bingemer reflete a partir da teologia como podemos falar de Deus em meio à pandemia (p. 197-211). Neste capítulo, estruturado em três momentos, busca-se refletir sobre o sentido da vida e as questões instigantes e agudas que a ameaça e a realidade da morte lhe trazem incessantemente (cf. 198-202). O papel da ciência é o segundo ponto apresentado: “tem-se constituído como a referência da verdade em meio a caos do medo e das informações desencontradas, causados pela situação de vulnerabilidade que a pandemia provoca” (cf. p. 202-205). O terceiro momento busca analisar/examinar como o “discurso da teologia pode ser ajudado perla literatura nas perguntas essenciais que desafiam o falar sobre Deus” (cf. p. 205-210). Nas páginas finais a autora mostra como “algumas teologias recentes nos ajudam a ressituar o falar de Deus sem cair nem na passividade nem no dolorismo que tanto caracterizou a espiritualidade cristã” (cf. p. 207-210). As conclusões deste capítulo apontam para um olhar prospectivo: “nesses tempos tão sombrios aparecem pontos luminosos que alimentam a esperança e permitem encontrar o olhar amoroso de Des, já que a santidade também tem lugar, anônima ou explicitamente, em novos e inesperados rostos” (cf. p. 210-211).
Entendendo que o tempo da pandemia são momentos propícios para a reflexão, Dr. Fernando Altemeyer Junior, fecha as reflexões abordando o silêncio de Deus no grito das vítimas (p. 213-229). O autor entende esse tempo de pandemia como um tempo paradoxal. Diante disso, como ponto de partida, coloca-nos diante de um questionamento: “seria essa a vingança de Gaia? Homens calados e criaturas em festa? Seria o retorno da vida escondida em tempos de antropocentrismo necrófilo?” (p. 213). Lançando luz nestas inquietações discorre sobre a teologia processual e do Deus escondido (p. 217-222), como uma “maneira de ler Deus e sua presença na criação e na revelação como alguém que participa da dor das criaturas” (p. 218). Torna-se fundamental neste tempo “decifrar o enigma de Jó e Blaise Pascal” (cf. p. 222-227) e unir-se ao Deus misericordioso (cf. p. 227-229), uma vez que “Deus nunca está em silêncio e inativo. Como fonte de misericórdia e verdade, ele produz vida onde parece reinar morte” (p. 227). Sugere que é preciso “manter em nossas vidas certa coincidência dos contrários” (p. 228), conjugando: sabedoria e inteligência, morte e vida, interioridade e exterioridade.
No posfácio somos colocados diante de considerações transitórias (p. 231-235). Serenidade e lucidez são essenciais... Estamos num tempo de travessia: “não sabemos a dimensão do percurso e, menos ainda, o que nos aguarda do outro lado” (p. 233). “A memória dolorosa da grande pandemia marcará nossa geração e ecoará com seus dramas e desafios para cada indivíduo e para o conjunto da população mundial” (p. 231).
Aí está a proposta deste livro pioneiro no Brasil. Um pontapé inicial... Estruturado em três partes: 1) Onde estávamos? A conjuntura da pandemia (4 capítulos), 2) Onde estamos? Impactos imediatos e leituras (4 capítulos) , 3) Para onde vamos? Interrogações e significados (4 capítulos), “os autores trabalharam em tempo recorde para que as reflexões chegassem ao público o quanto antes e pudessem cumprir seu objetivo de ajudar a compreender os impactos, os desafios e os significados da pandemia com seus efeitos em pleno curso. Cada contribuição compõe uma parte importante do todo, somando perspectivas e metodologias próprias de cada disciplina convidada para a roda de conversa” (p. 21).
O leitor tem em mãos um grande roteiro que lhe permitirá explorar, ampliar e aprofundar a compreensão das consequências da pandemia, indo além do que rola no boca a boca. Excelentes reflexões, fundamentadas cientificamente, trabalhadas com seriedade, objetividade e consequentes com o momento que enfrentamos. Longe de “caírem em predições de futurólogos, das leituras deterministas e das sugestões de intervenções mágicas” (p. 21) cada um dos capítulos que compõe está obra ajuda a pensar de forma crítica “o que está em curso e seus efeitos torna-se uma convocação para quem se permite indagar, refletir e comunicar, a partir de diferentes pontos de vista, o que atinge a todos” (p.7).
Que o leitor tome conhecimento destas reflexões altamente necessárias e oportunas num tempo que nos desafia a repensar de forma responsável o futuro da humanidade.
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